Clóvis ou bate-bola
Carnaval no Rio. A cidade bombou. Ruas, bares, restaurantes, hotéis, praias, tudo cheio, ferveção geral. Alegria, alegria. Deu até pra esquecer que existe a guerra do tráfico (na quinta-feira antes do Carnaval, traficantes atiraram a esmo, do Morro Santo Amaro, em prédios, lojas, carros no Catete — graças a Deus, ninguém se feriu. Fato grave, gravíssimo, não acham? Nenhuma autoridade — nem Lula, nem Garotinha, nem César Maia — se manifestou.)
Atrás da Banda de Ipanema
Na Cinelândia, as eternas cantoras do rádio — Marlene, Ademilde Fonseca, Carmélia Alves (Emilinha agora só em espírito) — continuam cantando as eternas marchinhas de Carnaval, e a eterna vedete Virgínia Lane comemorou os 86 anos, o povo cantando o Parabéns pra você. Tudo isto tendo por cenário o templo do saber — Biblioteca Nacional — e o templo da música — Theatro Municipal. Do alto do pedestal, a estátua de Carlos Gomes também assistia a tudo.
Alegre folião
Alguns anos atrás, os profetas do pessimismo vaticinaram a morte do Carnaval de rua, ofuscado pela pompa do desfile das escolas de samba. Mas o Carnaval de rua continua firme e forte: blocos, bandas se sucederam, alguns arrastando multidões — Banda de Ipanema, Carmelitas de Santa Teresa, Cordão do Bola Preta.
A caminho do Sambódromo
Sobre as escolas de samba... ir pro desfile das escolas de samba é como ler o Fausto de Goethe: fica sempre pro ano que vem (mas ano que vem hei de assistir). O desfile tem alguma coisa de ópera, balé, musical, mas é muito mais do que isto — é uma arte nova que nós inventamos. Pelo que vi na TV (pouquinho, que na TV não tem tanta graça) deve ser tão bonito como uma viagem de LSD. Se fosse nos EUA ou Alemanha, seria apregoado como o maior espetáculo da face da Terra. Mas nós com nosso complexo de inferioridade... Só espero que a Vila tenha sido campeã por merecimento, e não por critérios ideológicos.
Lapa
Na Lapa, todas as tribos se reuniram. Tocou-se de tudo: techno, rock, hip-hop, forró. Quem compareceu às rodas de samba da meia-noite e quinze teve a rara oportunidade de ouvir o que há de mais autêntico em termos do samba carioca: samba de raiz, partido alto, clássicos dos sambas de enredo, as velhas guardas, os sambistas das comunidades. Mestres de se tirar o chapéu como Xangô da Mangueira, Walter Alfaiate, Ari do Cavaco, Darci da Mangueira, Noca da Portela, Nelson Sargento, Serginho Meriti, Monarco, Marquinho Diniz (autor do Você sabe o que é caviar...) O cenário: os Arcos da Lapa e, na encosta do morro, o Convento de Santa Teresa.
Nelson Sargento na Lapa
Aliás, o pessoal das antigas ainda deve se lembrar do velho sucesso do Carnaval de 1950, de Herivelto Martins e Benedito Lacerda: "A Lapa / Está voltando a ser a Lapa / A Lapa / Confirmando a tradição / A Lapa / É o ponto maior do mapa / Do Distrito Federal [antigamente aqui era o Distrito Federal] / Salve a Lapa!" Pois é, salve a Lapa, o Rio de Janeiro continua lindo, "Rio dos sambas e batucadas / Dos malandros e mulatas / De requebros febris" (esta é do mestre Silas). E para terminar, um lembrete à Prefeitura: que instale alguns mictórios públicos até o próximo Carnaval, porque o cheiro de xixi... (por que os homens não conseguem segurar o xixi como as mulheres?)
Ferveção na Lapa
Fotos: Ivo & Mi