ENSEADA DE BOTAFOGO

ENSEADA DE BOTAFOGO
"Andar pelo Rio, seja com chuva ou sol abrasador, é sempre um prazer. Observar os recantos quase que escondidos é uma experiência indescritível, principalmente se tratando de uma grande cidade. Conheço várias do Brasil, mas nenhuma tem tanta beleza e tantos segredos a se revelarem a cada esquina com tanta história pra contar através da poesia das ruas!" (Charles Stone)

VISTA DO TERRAÇO ITÁLIA

VISTA DO TERRAÇO ITÁLIA
São Paulo, até 1910 era uma província tocada a burros. Os barões do café tinham seus casarões e o resto era pouco mais que uma grande vila. Em pouco mais de 100 anos passou a ser a maior cidade da América Latina e uma das maiores do mundo. É pouco tempo. O século XX, para São Paulo, foi o mais veloz e o mais audaz.” (Jane Darckê Avelar)

15.1.11

RIO COMPRIDO


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Catumbi e Rio Comprido são dois bairros tradicionais da Zona Norte desfigurados & violentados & enfeados por obras viárias integradas aos túneis de ligação entre as zonas Sul e Norte (respectivamente, Santa Bárbara e Rebouças). Muitos cariocas só conhecem do Rio Comprido a "vista" do alto do elevado ou, na melhor hipótese, o Le Buffet (de alguma recepção de casamento), na Rua Santa Alexandrina (os judeus talvez conheçam o Lar dos Velhos nesta mesma rua). Mas elevado à parte, o bairro abriga algumas preciosidades arquitetônicas, como atestam as fotos desta postagem, entre elas uma das mais bonitas construções de nossa arquitetura colonial. Aliás, o Rio Comprido ainda bucólico, arrabaldino de 1910, é descrito na obra do gigante do memorialismo brasileiro Pedro Nava (ver trecho do Baú dos Ossos no final desta postagem).

CASA DO BISPO - Uma das mais belas residências rurais do Brasil (uma casa de chácara), construída no início do século XVIII para abrigar o segundo bispo do Rio de Janeiro. Tombada pelo IPHAN em 1938, desde 1980 pertence à Fundação Roberto Marinho. "É uma perfeição realmente, obra do nosso Brigadeiro Alpoim. Não me canso de admirar a elegância, a sobriedade, a harmonia e o entrosamento com a paisagem da nossa arquitetura colonial." Alexei Bueno.

Igreja de São Pedro, neorromânica, mas com portada barroca destoante. Rua Paulo de Frontin.

Portada barroca da Igreja de São Pedro destoando do resto da igreja. Trata-se da portada da antiga igreja de São Pedro dos Clérigos, do séc. XVIII, derrubada para a construção da Av. Presidente Vargas.

Chafariz das Fundições Val d'Osne (França) na Praça Condessa Paulo de Frontin tombado pelo município.

Sobrados ecléticos geminados na Praça Condessa Paulo de Frontin.

O mostrengo.

A Av. Paulo de Frontin foi aberta em 1919 com a canalização e retificação do Rio Comprido. Violentada, enfeada e desfigurada pelo "mostrengo", ainda preserva muitas casas bonitas da primeira metade do séc. XX. 

Rua Paula Frassinetti: uma rua tranquila como eram as ruas de Ipanema na minha infância.

Casa de Cultura da Universidade Estácio de Sá - campus Rebouças - de 1912 na Rua do Bispo (Rio Comprido).

Solar Marina de Mattos Lopes da Casa de Portugal na Rua do Bispo, 72 (Rio Comprido) fundada em 1928. Ver http://www.cportugal.com.br/.

Trecho do Capítulo IV, "Rio Comprido", do livro Baú de Ossos de Pedro Nava:

VINHA de encostas doces de Santa Teresa, da serra da Lagoinha, das escarpas do Corcovado. Por comprido, comprido — rio Comprido ficou sendo. Recebia o Catumbi (que quer dizer "água de mato escuro"), o Coqueiros, o Bispo. Outros. Os caminhos desses córregos é que fizeram o rebolado da Rua Santa Alexandrina, o meneio da do Bispo e o ondulado de Aristides Lobo — cujos ziguezagues, curvas e voltas mostram o traçado fluviátil livre, antes da canalização, antes das galerias subterrâneas. Juntavam-se, paravam, faziam atoleiros, mangue, pantanal — ali onde erigiram o Largo do Rio Comprido. Inchavam, transbordavam e seguiam lambendo Aristides Lobo e os fundos das casas de Barão de Ubá (depois de molhar Itapagipe e Haddock Lobo). Seguiam para o Aterrado, iam se jogar no Canal do Mangue, entre Miguel Frias e São Cristóvão. Suas inflexões é que traçaram Aristides Lobo, aliás Malvino Reis, aliás Rua do Rio Comprido. Vinha primeiro a curva cujo ápex está na atual junção de Campos da Paz e Ambirê Cavalcânti. Aquela já foi só da Paz e terminava ali. Depois prolongaram-na até Paulo de Frontin, trocaram seu nome para Dr. Costa Ferraz e, quando este médico foi esquecido, pelo de seu colega Campos da Paz — Artur Fernandes Campos da Paz, professor da Faculdade, abolicionista, republicano, antimilitarista e adversário de Floriano, que o perseguiu e desterrou para o Amazonas. Conserva a designação e vai fazendo lembrar outros Campos da Paz, os três Manoel Venâncio, também médicos, o avô (amigo de meu Pai), o filho, o neto (meus amigos), todos mortos... A segunda é a antiga Rua do Morro e morro por esse nome! Depois da primeira volta, cotovelo em sentido contrário; nova mudança de rumo e início do arco demorado que acaba em Barão de Itapagipe. Aí o logradouro tornando a torcer, passando aos pés da Rua Colina, entrava no seu fim — a hoje Travessa do Rio Comprido. Este, o rio, freava seu curso nos atoleiros que, entulhados, fizeram a Rua do Engenho Velho (que é o trecho da Haddock Lobo que vai até o Estácio). A Rua Colina lembra Ouro Preto e Belo Horizonte. Ouro Preto, pelas velhas casas, pela ladeira, Belo Horizonte, porque sobe e abre no céu, como a Avenida Álvares Cabral. Passou a chamar-se Quintino do Vale. A Travessa Rio Comprido era a parte final de Malvino Reis, até que o médico Roberto Jorge Haddock Lobo tivesse feito a doação dos terrenos onde se abriu a entrada direta entre aquela travessa e a rua de seu nome.

Quem olha as subidas de Quintino do Vale (antiga Colina), Maia Lacerda (antiga Leste), Vieira Sampaio, Ambirê Cavalcânti (antiga do Morro) e Campos da Paz (que já foi só da Paz) percebe que tudo foi condicionado pelas picadas que escorriam dos altos de Santos Rodrigues (ao nascente) e iam terminar nas margens do rio Comprido. Nestas se desenhou a rua, claro que primeiro o que é hoje o lado ímpar. As casas que sobraram do velho tempo são muito maiores, mais luxuosas e mais antigas neste, que no lado par. o arruamento ficaria longe do rio para evitar suas cheias, seus mosquitos, seus miasmas. Mas seguindo a linha de ouro do rio. As terras da direção da Tijuca devem ter sido loteadas depois: os prédios do poente, mesmo os mais antigos, não são vetustos como os fronteiros. Assim ter-se-ia formado a Rua do Rio Comprido, [atual Aristides Lobo], de que vem o nome de Rio Comprido dado a um trecho especial da freguesia do Espírito Santo.

Para mais informações sobre o bairro do Rio Comprido visite As Ruas Do Rio.

3.1.11

ILHA FISCAL


As visitas guiadas à Ilha Fiscal partem do cais do Espaço Cultural da Marinha (Praça XV) e o acesso à Ilha é por meio da Escuna Nogueira da Gama, de quinta a domingo, às 12h30, 14h e 15h30. Os ingressos são vendidos a partir das 11h (é bom chegar cedo porque podem se esgotar). Mais informações pelo tel. 2233.9165 ou no site da Marinha.



Trecho da crônica Muitos não são convidados para o baile! de Hélio Moreira publicada no Diário da Manhã de Goiânia:

Outro dia, lendo o agradável livro O baile da despedida, do inesquecível escritor Josué Montelo, lembrei-me que tive acesso, há algum tempo, ao opúsculo intitulado Ilha Fiscal, mandado publicar pela Marinha Brasileira em 1963. O livro de Josué é um romance onde o autor coloca uma personagem de nome Catarina para contar sobre a sua presença naquele baile, o baile mais famoso da história do Brasil e que teve, como cenário, justamente a citada Ilha Fiscal. Como o livro O baile da despedida não entra em detalhes sobre a festa propriamente dita, gostaria de passar aos meus leitores algumas curiosidades, colhidas daquele opúsculo. Antes de dar algumas bisbilhotadas na festa e ferir com o aguilhão da curiosidade alguns interessados, gostaria de aproveitar a oportunidade para evidenciar, mais uma vez, a falta de sensatez de alguns governantes.



O baile, uma homenagem à oficialidade de um navio chileno, em visita ao Brasil, ocorreu no dia 9 de novembro de 1889, portanto menos de uma semana antes do acontecimento que iria mudar, para sempre, a história do Brasil.



Segundo os historiadores, por aquela época, a tensão política e militar havia atingido o mais alto grau de efervescência, avolumavam-se atos de indisciplina militar, Ruy Barbosa e Quintino Bocaiúva pregavam, abertamente na imprensa, a instauração da República; no entanto o governo se preocupava, como de resto toda a elite política e social da Corte, exclusivamente, com a organização do baile.



Era um sábado de calor sufocante, nos lares e nos salões, a modista e o cabeleireiro vestiam e penteavam as damas; alguns vestidos precisavam ser apertados, outros, alargados; alguns cabelos precisavam ser reformados porque haviam sido arranjados muito cedo (havia maior procura que oferta de profissionais). Miravam-se no espelho à procura da silhueta que não lhes pertencia; o ruge remoça a fisionomia, o pó de arroz perfuma o olfato, desviando o olhar das possíveis rugas.



Ao anoitecer, carros e mais carros, puxados por garbosos cavalos, começam a chegar ao embarcadouro Pharoux, descarregando as senhoras vistosas, cobertas por capas riquíssimas e respirando esnobismo em cada movimento e sempre observadas por uma multidão de gente que se aglomerou nas imediações para ver o desfile claudicante de sapatos no tapete das ilusões, formado pelos paralelepípedos desnivelados.



Do cais se avistava a Ilha, toda iluminada e iluminando todo o litoral à custa de um foco elétrico localizado na torre principal do edifício do baile, as embarcações iam e voltavam, sempre apinhadas de convidados. A família Imperial, tendo a frente o imperador Dom Pedro II, embarcou as nove horas; na ilha foram recebidos pelos membros do Ministério, capitaneados pelo Visconde de Ouro Preto, com direito ao Hino Nacional tocado pela banda de música. Houve dança nos seis salões que foram adrede preparados, inclusive, atapetados de vermelho.


Não poderei, por falta de espaço, descrevê-lo em detalhes, porém, passo-lhes um resumo do informe da Confeitaria Pascoal, encarregada do serviço: havia 150 copeiros, 60 trinchadores, passaram pela copa 12 mil garrafas de vinho, licores, champanhe, cerveja, águas gasosas, 12 mil sorvetes, 12 mil taças de punch, 500 pratos de doces variados. Na cozinha havia 40 cozinheiros e 50 ajudantes e foram servidos 18 pavões, 80 perus, 300 galinhas, 350 frangos, 10 mil sanduíches, 18 mil frituras, mil caças, 50 peixes, 100 línguas, 50 mayonnaises e 25 cabeças de porco recheadas. A história sempre repete os fatos e os homens não querem ver! 


(Fotos da Ilha Fiscal tiradas pelo editor do blog. Uma curiosidade: no capítulo XLVIII do romance Esaú e Jacó, Machado de Assis faz alusão ao baile da Ilha Fiscal: "Nenhuma dessas coisas preocupava Natividade. Mais depressa cuidaria do baile da ilha Fiscal, que se realizou em novembro para honrar os oficiais chilenos. Não é que ainda dançasse, mas sabia-lhe bem ver dançar os outros, e tinha agora a opinião de que a dança é um prazer dos olhos. Esta opinião é um dos efeitos daquele mau costume de envelhecer. Não pegues tal costume, leitora.")