ENSEADA DE BOTAFOGO

ENSEADA DE BOTAFOGO
"Andar pelo Rio, seja com chuva ou sol abrasador, é sempre um prazer. Observar os recantos quase que escondidos é uma experiência indescritível, principalmente se tratando de uma grande cidade. Conheço várias do Brasil, mas nenhuma tem tanta beleza e tantos segredos a se revelarem a cada esquina com tanta história pra contar através da poesia das ruas!" (Charles Stone)

VISTA DO TERRAÇO ITÁLIA

VISTA DO TERRAÇO ITÁLIA
São Paulo, até 1910 era uma província tocada a burros. Os barões do café tinham seus casarões e o resto era pouco mais que uma grande vila. Em pouco mais de 100 anos passou a ser a maior cidade da América Latina e uma das maiores do mundo. É pouco tempo. O século XX, para São Paulo, foi o mais veloz e o mais audaz.” (Jane Darckê Avelar)

21.3.16

COM PÉ DE MOLEQUE EM BANGU


Em 2014, nas minhas incursões pelas vastidões cariocas, fiz um passeio no  tradicional bairro Bangu da Zona Oeste Carioca (ver aqui), cuja história está ligada aos primórdios da industrialização carioca e do futebol brasileiro. Ontem tive a oportunidade de rever o bairro no passeio do Pé de Moleque Roteiros da simpática dupla Lúcio e Luiz, que no final realmente distribuem pés-de-moleque aos participantes. Estava também por lá o pesquisador do Velho Oeste carioca André Luís Mansur, vendendo seus ótimos livros (ver ao final da postagem lista de livrarias e bancas de jornais que vendem seus livros). 


TRECHO DE O VELHO OESTE CARIOCA, DE ANDRÉ LUÍS MANSUR, SOBRE BANGU:

A história de Bangu pode ser dividida entre antes e depois da fábrica que ajudou a popularizar o nome do bairro. Chamada oficialmente de Companhia Progresso Industrial do Brasil, a Fábrica de Tecidos Bangu, como ficou conhecida, foi a principal responsável pela urbanização daquela região, até então predominantemente agrária. Além disso, foi em torno da fábrica que começou a se organizar uma intensa vida social e cultural, com o surgimento da Sociedade Musical Progresso, que teve como diretor o maestro Anacleto de Medeiros, do Casino Bangu (assim mesmo, com um “s” só), do Bangu Athletic Club, de grupos carnavalescos como o Flor da Lira e o Flor da União, este formado só de negros, escolas e uma bela igreja, a de São Sebastião e Santa Cecília. Construída em estilo neogótico, ela foi concluída em 1908 e entregue à Arquidiocese, que criou a paróquia de Bangu.

Foi nas terras do antigo engenho de Barcelos Domingues que a Fábrica Bangu, instituída em 6 de fevereiro de 1889 e inaugurada oficialmente em 8 de março de 1893, com a presença do vice-presidente da República, Floriano Peixoto, iria se expandir. Começava ali um rápido e bem planejado processo de urbanização, que deixaria marcas até hoje, como o traçado das ruas em torno da fábrica.

A fábrica foi um empreendimento de comerciantes portugueses ligados ao comércio atacadista de tecidos e a outras fábricas têxteis. Seu capital inicial, na maior parte, era da praça do Rio de Janeiro. A princípio, ela seria construída na chácara do Duque de Caxias, na então bucólica rua Conde de Bonfim, na Tijuca.

Só existiam três fábricas de tecidos na cidade, a Aliança, em Laranjeiras, a Carioca, no Jardim Botânico, e a Confiança, em Vila Isabel. Como o fornecimento de água era irregular, o engenheiro Henrique de Morgan Snell, responsável pela construção, optou por Bangu, já que o Maciço da Pedra Branca e toda a região montanhosa em volta é até hoje um lugar privilegiado em cachoeiras e nascentes.

A decisão foi estratégica, pois a água era indispensável em seis das oito etapas do processo têxtil. A chegada da linha ferroviária a Santa Cruz, em 1878, também foi importante para a escolha. A estação de Bangu foi inaugurada em 1º de maio de 1890 e a companhia tratou logo de construir um novo ramal, de 400 metros, onde duas locomotivas, as “maquinazinhas”, faziam a comunicação entre a estação e a fábrica.

Uma medida semelhante foi tomada no Matadouro de Santa Cruz, onde o pequeno ramal ligando o matadouro à estação de trem ainda existe, embora esteja abandonado e cheio de capim.


A seguir, algumas fotos tiradas no passeio:

Busto da lenda do futebol Domingos da Guia no calçadão de Bangu

Antiga Fábrica Bangu, atual shopping. A fábrica foi construída pela Companhia Progresso Industrial do Brasil no terreno do antigo engenho Bangu. Em 1895 foi inaugurada a vila operária com 95 “casas higiênicas” que constitui a origem do bairro atual. Os mais antigos equipamentos urbanos do bairro foram criados em função da fábrica e seus operários. A unidade arquitetônica do conjunto é conferida pelo tijolo aparente que harmoniza a convivência de diferentes referências estilísticas. Sob esse aspecto, Bangu repete outras fábricas brasileiras de tecidos inspiradas na arquitetura fabril inglesa. Parte da ornamentação arquitetônica — arcos, pilares com seus capitéis, dentículos etc. — é constituída por relevos da própria alvenaria. No corpo da fábrica os diferentes blocos e alas convergem para a torre do relógio de quatro mostradores. O outro elemento vertical que faz contraponto com o refinamento da torre é a chaminé alta e simples. (Guia da Arquitetura Eclética do Rio de Janeiro)

Remanescentes da antiga vila operária da fábrica

Gastronomia banguense

Bangu Atlético Clube, antigo Casino Bangu, em tijolos aparentes como todo o complexo da fábrica

Bangu Atlético Clube (interior)

Igreja de São Sebastião e Santa Cecília (1908). Inaugurada em setembro de 1908, possui fachada em tijolo aparente avermelhado que confere unidade arquitetônica com as edificações do terreno da antiga Fábrica de Tecidos Bangu. Construída em estilo neogótico inglês, a igreja possui vitrais e arcos apontados no interior e uma torre sineira encimada por cúpula piramidal. (Guia do Patrimônio Cultural Carioca)

Pegando o trem de volta para casa

LIVRARIAS QUE VENDEM OS LIVROS DE ANDRÉ LUÍS MANSUR:

- Livraria Arlequim, no Paço Imperial.
- Livraria Folha Seca, na Rua do Ouvidor, 37.
- Banca de jornais da rua da Quitanda, em frente ao número 50.
- Blooks, na Praia de Botafogo.
- Livraria do Instituto Pereira Passos perto do Largo do Machado.
- Café & Pauta do Botafogo Praia Shoppping e do Boulevard Rio Shopping.
- Livraria Leitura, no Park Shopping, em Campo Grande.
- N & R Restaurante, em Santa Cruz.
- Fernando´s Bar, na Pedra de Guaratiba.
- Lado Oeste Cervejas, em Campo Grande.
- Bar Chopp da Villa, em Campo Grande.
- Livraria Real Engenho, em Realengo.
- Restaurante Don Ganache, em Marechal Hermes.
- Livraria Moviola, em Laranjeiras.
- Sebo de Campo Grande, em Campo Grande.
- Banca Dá Poesia, na pra 7 de Abril, em Paciência.
- PubBeer Paciência.
- Café Consenso, em Pedra de Guaratiba.

13.3.16

13 DE MARÇO DE 2016: A MAIOR MANIFESTAÇÃO DA HISTÓRIA DO RIO




PARA BOM ENTENDEDOR, MEIA PALAVRA BASTA:
"NÃO SE TRATA DE DIREITA CONTRA ESQUERDA
NÃO SE TRATA DE RICOS CONTRA POBRES
É A NAÇÃO CONTRA A CORRUPÇÃO!"

ESTE JUIZ ME REPRESENTA

A MÁSCARA CAIU

NÃO VOU DESISTIR DO BRASIL

"Verás que um filho teu não foge à luta..."

BASTA DE GENOCÍDIO: EXTERMINADORA DO FUTURO

BRASILEIROS HONESTOS PARABENIZAM SÉRGIO MORO

VAMOS DESPETIZAR O BRASIL!

TODO MUNDO SE AJUDANDO PELO BRASIL

"Todos unidos na mesma emoção..."

FORA DILMA

ATÉ QUANDO SEREMOS OTÁRIOS?

O POVO UNIDO JAMAIS SERÁ VENCIDO

A NOSSA BANDEIRA JAMAIS SERÁ VERMELHA

BRASIL, UM FILHO TEU NÃO FOGE À LUTA

"Se gritar pega ladrão, não sobra um meu irmão..."

FODOCRACIA

A ORIGEM DO MAL

LULA, VOCÊ PODE ENGANAR UMA PESSOA POR MUITO TEMPO, ALGUMAS POR ALGUM TEMPO, MAS NÃO CONSEGUE ENGANAR A TODOS POR TODO O TEMPO

FORA DILMA E PT

8.3.16

CASAS (RESIDENCIAIS URBANAS) MAIS ANTIGAS DO RIO

A onda de modernização do Rio pós-proclamação da República – abertura da Av. Central, desmonte do Morro do Castelo, Exposição de 1922 que resultou na destruição do antigo bairro da Misericórdia – fez com que o casario colonial no Centro Histórico fosse totalmente arrasado, embora construções de maior porte, como igrejas, conventos, mosteiros, palácios, fortalezas felizmente fossem preservadas. Mas uma ou outra casa escapou à destruição, algumas acabaram sendo tombadas, outras resistem de teimosas. Alguma são anexos de igrejas, construídos para o pároco ou para alugar, contribuindo para a renda da irmandade. Vejamos quais são as casas residenciais urbanas mais antigas que sobrevivem na cidade

Se olharmos um mapa do Rio Antigo (para ver mapas antigos da cidade clique aqui) veremos que a zona urbana se limitava ao atual Centro, Lapa e Glória. O resto eram arrabaldes (subúrbios) e zona rural. Destarte, nossa procura se limitará a tal perímetro. É bem verdade que, desde o final do século XVIII, existia um núcleo residencial no atual Largo e Beco do Boticário, mas por estar fora da área urbana, não vamos tratar dele aqui. Já o Arco do Teles e a Casa da Glória não incluí nesta postagem por não terem sido estritamente residenciais, a casa sobre o primeiro tendo abrigado o Senado da Câmara e a segunda construída originalmente para abrigar os romeiros vindos de longe. 

Caso alguma casa residencial urbana antiga me tenha escapado, por favor, avise pelo e-mail ivokory@gmail.com. Agradeço a Alexei Bueno, ex-diretor do INEPAC, pelas valiosas informações fornecidas sempre que o consultei e ao Prof. Milton Teixeira pelas informações enviadas logo após a publicação da postagem que permitiram sua ampliação. A consulta ao livro de Nireu Cavalcanti  Rio de Janeiro: Centro Histórico Colonial 1567-2015 mês e meio após a publicação original desta postagem e outras informações fornecidas pelo historiador também permitiram sua ampliação.

Sobrado na Rua Regente Feijó, 74. "Exemplo da arquitetura urbana do Rio de Janeiro na passagem do século XVIII para o século XIX, mantém preservadas as vergas de madeira com arcos abatidos e os beirais de telha canal." (Guia do Patrimônio Cultural Carioca) "Embora a carreira de portas com vergas de gnaisse do térreo seja obviamente posterior às janelas — mas isso é uma adaptação comercial de época também interessante — ela é uma das poucas casas ainda com beiral de telha vã e vergas de madeira (umas de madeira, outras de gnaisse) do Centro. A casa sofreu um pequeno incêndio, mas foi bem restaurada." (Alexei Bueno) Tombado junto com os números 72 e 76 em 2001 pelo INEPAC. 

Casa (à esquerda) na Rua Leandro Martins, 38. "Não posso precisar a época de forma exata, mas morfologicamente é de um colonial puro, até com as vergas das portas e janelas em madeira. Ou é de fins do XVIII ou bem do comecinho do XIX, de qualquer modo antes da Independência. Descobri esse fóssil urbano há muitos anos, e quando fui diretor do INEPAC consegui tombá-la. Não há outra igual em todo o Centro." (Alexei Bueno).

A mesma casa da foto acima com o beiral adulterado por reforma recente, conforme alertou Fábio Cunha em comentário ao final da postagem.

Conjunto arquitetônico na Rua Gonçalves Ledo, 5 a 11. Segundo o Guia da Arquitetura Colonial, Neoclássica e Romântica no Rio de Janeiro, "um raríssimo conjunto preservado de sobrados médios do início do século XIX". Segundo Lúcio Costa, "a construção conserva ainda a estruturação arquitetônica tradicional [...] mas já apresenta tratamento de pormenores [...] de inspiração neoclássica" "Esse conjunto é um tesouro, é do Primeiro Império, escapou por milagre. Vi que finalmente restauraram a casa da esquina com a Luís de Camões, que ficou mais de dez anos com o beiral escorado. Foram os caras da Gentil Carioca que conseguiram isso, para uso próprio. Amém!" (Alexei Bueno) "Esse sobrado de esquina é o protótipo da arquitetura carioca setecentista. Para essa região (o entorno da Rocio Grande, Praça da Constituição e, hoje, Tiradentes) foram estabelecidas regras estéticas, que esse prédio representa bem. No século XIX essas regras foram abolidas e no final do século, a Prefeitura (Intendência) acatou o pedido dos engenheiros e arquitetos para que os projetos não fossem analisados com relação da estética da fachada. A experiência mostra que essa liberdade para os projetistas foi usada de forma perniciosa e para ajudar a especulação imobiliária. Passamos a ter a fachada principal, com alguma arremedo estético e as demais completamente ao sabor do lixo estético." (Nireu Cavalcanti) Tombado pelo IPHAN em 1980.

Casas geminadas do final do séc. XVIII ou início do séc. XIX na Rua do Riachuelo, 354 e 356. No número 354 residiu Francisco Alves, o Rei da Voz. "São originalmente duas casas, embora sem divisão visível, pois eram as famosas casinhas de 'porta e janela', das quais havia inúmeras no Centro. Essas são das últimas preservadas, e o telhado original, que conheci muito bem, era uma beleza." (Alexei Bueno) Tombadas pelo Município em 1987.

Sobrado na Rua Conselheiro Saraiva, 11. " Ele deve ser da época da Regência para trás, provavelmente do Reinado, mas, morfologicamente, é como se fosse do XVIII. As janelas são literalmente iguais às do solar do Visconde de São Lourenço, arruinado arruinado criminosamente na esquina de Inválidos com Riachuelo pela completa incúria do IPHAN e pelo analfabetismo dos nossos governantes. É uma beleza de sobrado, não? Quem me dera ter uma grana para comprá-lo e restaurá-lo!" Alexei Bueno

Casa natal (esquerda) do Barão do Rio Branco, atual Escola de Teatro Martins Pena, do finalzinho do século XVIIIna Rua Vinte de Abril, 14. O Barão nasceu aqui em 20 de abril de 1845, como informa a placa entre os dois portões. Tombada de IPHAN em 1938.

Casa na Praça Tiradentes onde hoje fica a Adega do Pimenta (foto tirada pouco antes da adega se instalar aí). Segundo Alexei Bueno, "ela pode ser de fins do XVIII, ou começos do XIX, é muito difícil precisar. Tem a mesma morfologia da linda casa natal do Barão do Rio Branco, a única casa urbana dessa época que manteve todo o interior. Essa casinha não tem tombamento nenhum, mas deve estar protegida pelo Corredor Cultural." A platibanda sobre o beiral original é um acréscimo tardio.

Casa na Ladeira do Valongo, 21, à esquerda do Jardim Suspenso do Valongo. "O conjunto de edificações da Ladeira do Valongo ainda guarda características das áreas urbanas do Rio de Janeiro em fins do século XVIII. Pelo seu valor paisagístico foi tombado, especialmente a casa de nº 21." (IPHAN)   A casa, da época do mercado de escravos na Rua Camerino embaixo, infelizmente está em mau estado de conservação e descaracterizada, com grades de metal. Para ver no Street View clique aqui. O conjunto das casas da ladeira e jardim suspenso foi tombado pelo IPHAN em 1938. Fotos do editor do blog.

Casa na Ladeira do João Homem, Morro da Conceição, do século XVIII segundo informação do Prof. Milton Teixeira.

Casa remanescente da era colonial na Rua General Caldwell, quase esquina com Rua Moncorvo Filho, como mostra Nireu Cavalcanti em Rio de Janeiro: Centro Histórico Colonial 1567-2015, pág. 132.

Ruínas da antiga Chácara do Livramento, na Ladeira do Livramento, Morro do Livramento. Essa chácara teve como agregada a mãe de Machado de Assis, e o historiador Milton Teixeira acredita que nosso maior escritor teria nascido nesta casa em junho de 1839. Diz Milton: "A certidão de batismo de Machado de Assis conta que ele foi batizado na capela da casa da chácara do Livramento, à qual era ligada diretamente e que foi demolida em c. 1945, estando hoje no local um prédio moderno. O que se pode precisar é que ele foi batizado nessa casa. E isso para mim é o suficiente." Sobre essa casa diz Alexei Bueno: "Esse casarão, apesar de muito adulterado, com uma platibanda tardia estragando o beiral, etc., me parece do final do XVIII. É um exemplar precioso de arquitetura civil desse período, do qual tão pouca coisa sobrou no Rio, excetuando os exemplares rurais. Só por isso, para mim, já merecia ser tombado e restaurado. Esse casarão é realmente bem antigo, e me parece uma construção importante, não é uma coisa popular. Ele foi cortado ao meio, desmembrado, seguramente. Aquele edifício colado a ele está sobre uma área onde a construção continuava, dá para ver no corte do beiral. É bem provável que seja uma parte reminiscente da sede da Chácara do Barroso (que deve ter dado nome à ladeira), que devia ser maior." 

Casa colonial nos fundos da Igreja de Santa Rita

Casa colonial na Travessa do Comércio, nos fundos da Igreja de Nossa Senhora da Lapa dos Mercadores

Uma curiosidade: A casa mais antiga da cidade antes da destruição do Morro do Castelo, datando de 1578 (mas sofreu reformas posteriores), cujo primeiro morador foi o padre Matheus Nunes, pároco da Igreja de São Sebastião, inaugurada naquele ano. Fonte: Revista da Semana.

1.3.16

AQUI ESTÁ, de ÁLVARO MOREYRA


A terra carioca tem o tempo de vida contado às avessas. Os anos vão passando, ela vai ficando mais nova. Quem a procura, na lembrança dos dias coloniais, encontra uma velhinha tristonha, de nome cristão e vista fatigada, em frente ao mar... Cidade de São Sebastião do Rio de Janeiro. Durante a permanência de D. João VI, a velhinha desaparece. E lá está, entre os uivos da rainha doida e os primeiros lampiões urbanos, uma grave matrona, vestida sem gosto nenhum... Com d. Pedro I, ei-la chegada ao outono, já bem-posta, aparecendo nas igrejas, nos salões, no teatro... A Regência deixa-a na mesma idade. Pelo meio do Segundo Império, ela rejuvenesce escandalosamente... Quando se proclamou a República, andava a terra carioca nos seus vinte anos... De então para hoje, ficou assim... Menina e moça, pouco a pouco se desembaraçou, perdeu o ar acanhado, quis viver... O corpo tomou o ritmo das ondas, a graça das árvores esguias. Tem um resto de sonho nos olhos, o voo de um desejo alegre nas mãos... Mulher bem mulher, a mais mulher das mulheres... Conhece o presente. Adivinha coisas deliciosas do futuro. Mas, não lhe falem em datas, épocas, feitos, criaturas do passado... Não lhe falem, que se atrapalha. Em compensação, enumera todos os costureiros e chapeleiros de Paris... diz de cor a biografia de todos os artistas de cinema... entende de sports como ninguém entende... Conversa em francês, inglês, italiano, espanhol... Ama os poetas... Toma chá, com furor... E dança tudo... É linda!

Crônica extraída do livro Álvaro Moreyra A Cidade Mulher publicado em 1923