ENSEADA DE BOTAFOGO

ENSEADA DE BOTAFOGO
"Andar pelo Rio, seja com chuva ou sol abrasador, é sempre um prazer. Observar os recantos quase que escondidos é uma experiência indescritível, principalmente se tratando de uma grande cidade. Conheço várias do Brasil, mas nenhuma tem tanta beleza e tantos segredos a se revelarem a cada esquina com tanta história pra contar através da poesia das ruas!" (Charles Stone)

VISTA DO TERRAÇO ITÁLIA

VISTA DO TERRAÇO ITÁLIA
São Paulo, até 1910 era uma província tocada a burros. Os barões do café tinham seus casarões e o resto era pouco mais que uma grande vila. Em pouco mais de 100 anos passou a ser a maior cidade da América Latina e uma das maiores do mundo. É pouco tempo. O século XX, para São Paulo, foi o mais veloz e o mais audaz.” (Jane Darckê Avelar)

31.8.08

A CIDADE DESFIGURADA

Em 31 de agosto de 2008 Antonio Carlos Villaça - falecido em 2005 - completaria 80 anos. Esta crônica "A cidade desfigurada", publicada no Jornal do Brasil em 22/3/93, é inédita em livro. Onde quer que estejas, feliz aniversário, amigo Villaça.


puseram abaixo uma cidade e construíram outra no lugar

Procuro a cidade da minha infância e não a encontro. Onde está o Rio que vi, quando era menino? Desapareceu. Foi tragado pelo tempo, engolido pelas águas do tempo. A cidade, que conheci, foi destruída ao longo de 50 anos.

Houve no Rio uma cidade portuguesa, uma cidade francesa, e o que existe diante dos nossos olhos é uma cidade norte-americana, rival de qualquer Chicago ou Detroit. O Rio desfigurou-se. Perdeu em certo sentido a própria identidade.

Em cinco décadas, puseram abaixo uma cidade e construíram outra no lugar. Lima Barreto foi um que sempre se opôs às mudanças urbanísticas. Sofria com isso. Escreveu palavras de revolta e tristeza quando demoliram o Convento da Ajuda, onde é hoje a Cinelândia. Achava um abuso, um absurdo que se destruísse um velho edifício como aquele, coberto de história. Lima Barreto amava o Rio, aqueles prédios, aquelas ruas de uma cidade que ele conhecia intimamente.



o Largo do Boticário

Machado em carta a Nabuco se lembrava com ternura do Rio da sua meninice, da sua mocidade. Não encontrava mais na cidade reformada a cidade que amara. Sim, aquela cidade que viajava de barco da Saúde ou da Gamboa para o Centro, tão mais íntima do mar do que a cidade parisiense que nascia então.

Onde está, hoje, o Rio de Luís Edmundo, que o soube fixar vivamente nas páginas tão ágeis do seu livro em três volumes, O Rio de Janeiro do meu tempo? Gastão Cruls nos deu um retrato perfeito da cidade na sua Aparência do Rio de Janeiro. E, no entanto, o Rio de Cruls não existe mais, lá se foi na voragem dos dias. Um recanto ou outro ainda perdura, como que esquecido. Assim, o Largo do Boticário, que não é tão antigo, mas tem a sua graça inestimável, o seu encanto, a sua delícia, a sua magia.



o elegantíssimo palácio Itamaraty

Um mosteiro de São Bento. Um convento de Santa Teresa. Uma igreja da Penitência. Uma Santa Casa da Misericórdia, sem dúvida o palácio mais belo da cidade do Rio. Ou os Arcos da Lapa. Ou o elegantíssimo palácio Itamarati.


a serralheria carioca

Que fizeram de nossa cidade? Onde estão as casas de outrora? Onde estão as ruas de outrora? Onde estão aqueles gradis rendilhados que eram uma das glórias desta cidade? Pedro Nava disse que a serralheria carioca era uma das mais belas do mundo.

Já se pensou em um museu da serralheria do Rio? Gradis do século 19 e da belle époque, os minuciosos, os trabalhados gradis art-nouveau. Não podemos desprezar tudo isso. Pois isso é patrimônio nosso, realidade do Brasil, riqueza do nosso povo.



Da Academia de Belas-Artes salvou-se apenas a fachada

Preservar uma cidade que é mais bonita do que Nápoles e do que Constantinopla. Foi um absurdo, por exemplo, destruírem a Academia Imperial de Belas-Artes, obra de Granjean de Montigny. Demoliram o prédio venerável. Como demoliram o velho Tesouro da Avenida Passos, onde hoje é apenas um estacionamento como outro qualquer.

Tudo foi posto abaixo. Até a bela igreja de São Pedro. E a própria sede da Prefeitura Municipal, na Praça da República. Da Academia de Belas-Artes salvou-se apenas a fachada, que está no Jardim Botânico.



edifício da velha Alfândega

De Granjean de Montigny sobrou a sua casa, na Gávea, hoje biblioteca da PUC. O arquiteto construiu muitas edificações no Rio. Ficou o belo solar da Rua Marquês de São Vicente. Ficou o edifício da velha Alfândega, depois Tribunal do Júri, agora Centro Cultural Brasil-França. Onde está a casa de Aníbal Machado, Visconde de Pirajá 487?



Praia de Copacabana toda pontilhada de casas

Ainda me lembro da Praia de Copacabana toda pontilhada de casas, casas mesmo, com jardim, quintal, só um edifício ou outro como o Edifício Olinda, no Posto Seis, onde morava Manuel Dias, o irmão de Cícero Dias. Um Rio tão mais humano, tão mais habitável do que o Rio áspero e assustador de hoje. Um Rio sem filas. Um Rio sem violência. Um Rio delicado. Um Rio fraternal.


Uns trechos [...] da Saúde

Que fizeram da cidade do Rio? Destruíram-na. Em seu lugar, ergueram outra, monótona, impessoal, indistinta, cosmopolita. Sinto falta da cidade que conheci menino e me roubaram. Onde está a minha cidade? Porque uma cidade tem um rosto próprio, um caráter, uma certa marca, um quid que a define, a caracteriza, a eterniza. Ou então não é propriamente uma cidade. Um prédio aqui. Uma igreja ali, umas ruas de São Cristóvão. Uns trechos de Santo Cristo ou da Saúde. A cidade foi desfigurada pelo tempo ou pela rude ambição dos homens ávidos.


Pedro Nava, no seu belo passeio pela Glória

Pedro Nava, no seu belo passeio pela Glória, aponta uma casa ou outra, um recanto, uma velha amurada, resquícios da cidade que se foi, devorada pela cupidez e pela rapidez dos homens.


casarões machadianos

Vamos preservar a deliciosa e frágil Santa Teresa, com o seu Largo das Neves, as suas ruelas, os seus casarões machadianos.


esta maravilhosa Baía da Guanabara

Lélia Coelho Frota, escreva um poema sobre a cidade do Rio de Janeiro. Vamos salvar ao menos esta soberba, esta maravilhosa Baía da Guanabara, que Gilberto Amado considerava a obra-prima de Deus.

Fotos do editor do blog, exceto a antiga de Copacabana, cujo autor ignoro.

18.8.08

VILA ISABEL



Texto de Aldir Blanc extraído do livro Vila Isabel: Inventário da infância, da coleção Cantos do Rio, editado pela Relume Dumará. Fotos do editor do blog.


Vila Isabel será eternamente a inocência, uni-du-ni-tê, bente-que-bente-o-frade, trinta-e-um-de-janeiro-lá-vou-eu, firidô-sô-rei, palavras entrelaçadas à palavra BUCETA, escrita a lápis na parede suja do banheiro da escola 2-8 Barão Homem de Mello. Por mais que apagassem, a palavra ressurgia sempre, metáfora e advertência do que o desejo geraria no bojo do tempo, o tempo, esse balão que não pára de pegar fogo.


As manhãs compensavam tudo. Chegavam cheias de pássaros, sol, azul, verde, e uma procissão de penicos cheios pra descarregar. Talvez daí venha minha natureza “escatológica”: aprendi cedo que sol e mijo são inseparáveis, verter, jorrar, enquanto as noites, sempre assustadoras, nos enclausuram, obrigam a gente a reter, sob pena de atravessar a sala escura e ir espiar, pelo vão da porta da cozinha, o quintal amigo transformado no Continente Negro, onde quase se ouvia o rugido dos grandes carnívoros, o sibilar de ameaças veladas.


Eu não peguei a Vila Isabel das serestas, das batalhas de confete na rua Dona Zulmira, nem sei se o apito que eu ouvia era o da fábrica de tecidos do samba.


Como era Vila Isabel? Talvez mostrando as pessoas eu possa ser mais fiel ao lugar e à época. Vila Isabel, com seu nome de princesa, era capaz de assistir, inabalável, a situações assim: cedinho, minha avó Noêmia abria as janelas que davam para a rua. Era um ritual: arejar a sala da frente. Já encontrava dona Otylia em seu posto, ou melhor, na janela verde em frente.
— Dia, dona Noêmia.
— Dia, dona Otylia. Como tem passado?
— Os rins, um pobrema, sempre me apoquentando... não me deixam dormir.
— Toma um chazinho de quebra-pedra. Mas não esquece de lavar bem pra sair a terra. [...]


Vila Isabel é a febre, a rua cheia durante os torós de verão, barquinhos de jornal atirados da janela [...] feijoadas com a mesa grande armada no quintal [...] a casa do Benedito Lacerda com o jardim coberto de folhas amarelas o ano inteiro, como se em casa de flautista fosse sempre outono, festas de São João, anarriê, balancê com o par vis-à-vis [...] a grande frase do filósofo Von. S. Rossaren: “Asftas arden und aspregas döen” [...] voltar ao quintal pra brincar de O Anjo e de Metralha, de Gerônimo, o Herói do Sertão e de Moleque Saci, almanaques do Globo Infantil, Bolão e Azeitona, o Tico-Tico [...] sopa de entulho, caldo verde, doce de abóbora com coco, compota de jabuticaba, rocambole recheado de goiabada derretida [...] pelada com bola de meia, risco de giz e casca de banana pra pular amarelinha, não matar lagartixa, que é bicho de Nossa Senhora, sanduíche de queijo derretido com lingüiça, ou bola ou búlica, espingarda de rolha, revólver de espoleta, pistola d'água, bomba de Flit [...].


[...] canelas esfoladas, apanhar sereno, ficar gripado e mais febre, a morte rondando durante a coqueluche que se agravou, mas eu não tinha medo porque a vó Noêmia era a própria encarnação de Nossa Senhora do Perpétuo Socorro. [...] Quando ela já estava bem velhinha, tomei um porre e cantei uma valsa de minha autoria, música e letra, me desacompanhando ao violão, num dos últimos aniversários dela. Era assim:

Qual o outro nome da Lua?
Noêmia,
pois me acompanha de noite
na noite boêmia.
É como as fadas dos livros
que eu li no passado
pois quando menos se espera
aparece ao meu lado.
Dizem que em noites azuis
Noêmia
veste asas brancas de anjo
e pede, discreta,
que a Virgem Santa projeta
a ilusão de um poeta
que ainda pensa que o céu
fica em Vila Isabel.

Assim como, por abrir a camisa, não se vê o interior do meu peito, também não se verá lá dentro, nem na autópsia, como a tatuagem de um marinheiro de primeira viagem, meu coração pulsando e repetindo, apesar da flecha que o atravessa, as palavras em sangue: Vila Isabel.


Vila Isabel é a febre de viver, que não passará enquanto eu respirar. Vila Isabel é a febre que só vai abrandar (será?) com a minha morte. Vai, Aldir, ser Blanc na vida, em nome da Vila.

3.8.08

CENTENÁRIA AV. RIO BRANCO

UM ESTUDO DE IVO KORYTOWSKI


Banco Central, antiga Caixa de Amortização, da primeira geração de prédios da então Avenida Central, contrastando com prédio moderno.

Em crônica de 22 de março de 1929, escreveu Manuel Bandeira:

O Rio festejou no dia 8 o jubileu da sua grande Avenida. Todas as casas de comércio hastearam a bandeira nacional. À noite houve corso. [...]

A avenida estava linda como sempre. Ela não precisa de decorações suplementares para tomar aspecto festivo. Na realidade de todos os dias já é uma festa perpétua para os olhos: alegria dos cariocas e dos provincianos em trânsito. [...]

Nasceu quase de improviso. Em um mês derrubaram centenas de paredes, trabalho em que se empregou desde a dinamite até a junta de bois. E houve um bloco de casarões que foi arrasado pelo incêndio proposital. A abertura da avenida não foi uma obra friamente projetada e executada. Antes parecia uma obra de paixão. [...]

Houve pessimistas que duvidavam do êxito da empresa. Vamos ter uma avenida de escombros, diziam eles. Nem em cinco anos se edificará... Os preços dos terrenos são excessivos para a escassez atual de dinheiro...

Depois apareceram os críticos que a olho julgaram errado o eixo de abertura. Isso tudo provocava um sem-número de comentários. Foi assim que se rasgou a Avenida, nesse ambiente de viva e controvertida curiosidade.

E como foi por ela que começou a transformação urbanista do Rio, ela ficou como símbolo daquela transformação. (Manuel Bandeira, Crônicas inéditas I, Editora CosacNaify, pp. 177-8)

À esquerda o antigo Morro do Castelo, que veio a ser demolido na década de 1920, dando lugar à Esplanada do Castelo (ou simplesmente "Castelo"). Foto de autor desconhecido obtida no site do BNDES.

No dia 15 de novembro de 1905, a Gazeta de Notícias informava:

"Hoje deve ser entregue ao transito publico a primeira Avenida construída no Rio de Janeiro, que recebeu o nome de Central [atual Av. Rio Branco]. 


Como é igualmente sabido, esta grande arteria será officialmente inaugurada hoje pelo Sr. presidente da Republica, que cortará as fitas que a fecham.


Quasi todos os predios concluídos terão as suas fachadas ornamentadas com bandeiras e galhardetes." (Fonte: Hemeroteca Digital)



À esquerda, o edifício pós-moderno número 1 da Av. Rio Branco. À direita, o edifício art déco A Noite, com seus 22 andares o primeiro verdadeiro arranha-céu do Rio, de 1929. Ao centro o Barão de Mauá.

No dia seguinte, noticiava o Jornal do Commercio:


"Raras vezes um acontecimento publico terá attrahido a uma extensa área da cidade mais gente do que a inauguração da Avenida Central attrahio hontem desde pela manhã á zona urbana, vulgarmente conhecida pelo nome de ‘centro’. [...]


O facto demonstra o grande interesse da população pelo importante melhoramento que o actual Governo lega á Capital do paiz. Esse interesse, apressamo-nos em dizel-o, é de todo justificado. O extrangeiro que visitar agora a nossa Capital ja tem na Avenida um bello exemplo do progresso material que o Rio de Janeiro se sente resolvido a realizar." (Fonte: O Rio de Janeiro através dos jornais de João Marcos Weguelin)



Avenida Rio Branco fotografada por Von Peter Fuss em meados dos anos 30. O edifício em construção em primeiro plano fica na esquina da Rua Mairink Veiga.  Naquela época já existia uma primeira geração de edifícios altos,  sendo o maior deles o Edifício A Noite (não visto na foto). A Candelária, a construção mais alta do Rio antes do advento dos arranha-céus, também é visível na foto (centro esquerda).

O jornal O Paiz na primeira página da edição de 16/11 chamou a atenção para a chuvarada que atrapalhou, mas não chegou a estragar a festa:

"A esperança de um bello dia sagrando uma bella data e uma bella obra desfez-se, infelizmente; o sol não veiu, e foi sob um aguaceiro impertinente e odioso, fino e pulverizado a começo, grosso e encharcante depois, que se fez hontem a inauguração da formosa avenida que foi, no dia da festa da Republica, a concretização mais evidente e irrecusavel das suas promessas de melhores dias. O ceo amanheceu turvo e torvo se conservou até a noite, como uma carranca de sebastianista impenitente.


A despeito disto, a inauguração da Avenida Central e as festas commemorativas que se confundiram neste facto, tiveram um brilho consolador. Não houve sol, mas houve enthusiasmo; e a multidão que veiu para a rua e que a despeito do chuveiro se derramou pela grande via, enchendo-a de vida e movimento, nella se conservou até desapparecer no angulo da rua do Passeio o ultimo soldado da desfilada militar; valeu como consagração e calor pelo mais claro sol destes claros dias de novembro." (Fonte: Hemeroteca Digital)



Sede do Jornal do Brasil na Avenida Central, durante alguns anos o prédio mais alto da cidade. Foto de 1908 de Marc Ferrez obtida no site do Instituto Moreira Salles.

A cobertura do Correio da Manhã no dia 16/11 foi menos cor-de-rosa, chamando a atenção para supostas "negociatas" durante as obras:

"A chuva interrupta que cae sobre a cidade, desde ante-hontem, à noite, não permittiu que a inauguração da Avenida Central, tivesse o brilhantismo annunciado.

É realmente doloroso que tal acontecesse e somos os primeiros a sentir que as despezas feitas pelo Thesouro não produzissem o effeito desejado.

A inauguração, apezar do numero de pessoas presentes, esteve fria. O conselheiro Rodrigues Alves foi, durante longo tempo, acompanhado por uma enormidade de garotos, que pulavam de um lado para outro lado, formando um sequito incommodo e alvorecido.

O povo, divorciado por completo das festanças e pagodes officiaes, não teve uma acclamação, não teve um viva, para o presidente da República. É que, na sua intelligencia, enxerga bem não só a face brilhante do melhoramento inaugurado, mas também a face repulsiva, representada pelas immorallidades, pelas negociatas, pelas patifarias que acompanharam os progressos da Avenida." (Fonte: Hemeroteca Digital)

Obras de abertura da avenida, diante do Largo da Carioca. Uma enormidade de casas tiveram de ser demolidas. Nos jornais da época vemos anúncios de lojas tendo de liquidar seus estoques porque seriam demolidas. Observe o convento e igrejas ao fundo. Fonte: O Malho de 10/9/1904 pesquisado na Hemeroteca Digital.

Na página 3 da edição de 22-23 de novembro de 1905, o jornal A Notícia, em matéria intitulada "Os passeios da Avenida", previa um futuro jubiloso para nossa cidade:


Nestes últimos tempos nenhum acontecimento, no Rio de Janeiro, se poderá comparar com a inauguração da Avenida Central; nenhum de tamanha magnitude e de tão grande alcance!... Está isso na consciência de todos; ingrato aquelle brasileiro que o negar. O governo da República tem sido fecundo, é o da renovação e do trabalho.

A Avenida Central é hoje realidade, está alli prompta e quase toda edificada. Do grandioso exemplo provirão fatalmente as salutares consequencias. Vislumbro, jubiloso, a prosperidade, sempre crescente, da nossa cidade.

Palácio Monroe, antigo Senado, já demolido, na extremidade sul da Avenida. Fonte: Biblioteca Nacional Digital 

A revista O Malho, em "Chronica" assinada por J. Bocó na edição 166 de 18/11/1905, ao contrário do Correio da Manhã, considerava bem aplicado o dinheiro da Avenida:

A Avenida ahi está, na sumptuosidade da sua ampla perspectiva, orlada de bellos edificios. O povo esquece as maguas que porventura o possam entibiar, enche a colossal arteria de que elle é o sangue generoso, percorre-a de ponta a ponta, admirando os primores da architectura, compara com o presente os vestígios do passado, expresso na estreiteza das ruas affluentes, e dá por bem empregado o dinheiro que, em vez de sumir no abysmo hiante das revoltas sem pés nem cabeça, apparece-lhe alli representado numa obra realisada para o seu bem estar material e para o credito do seu prestigio moral no estrangeiro, visto como infelizmente la naturaleza não desempenha essas funções internacionaes...



Crônica de O Malho. Fonte: Hemeroteca Digital.

Edifício Lafont (e não Lafond como se costuma escrever), depois Palácio Rio Branco, já demolido, primeiro (e por algum tempo o único) prédio de apartamentos (de luxo) da cidade, do início da década de 1910, na esquina da Av. Central, depois Rio Branco, com Rua Santa Luzia, projetado por Viret & Marmorat, "mas que, pelas peculiaridades do estilo, dir-se-ia mandado vir, já pronto, de Paris" segundo Lúcio Costa em Arquitetura Brasileira.
Edifício Guinle na esquina da Rio Branco com Sete de Setembro. Empreendimento da Souza Cruz, inaugurado em 1929, primeiro prédio "moderno" (art déco) da Avenida, duas décadas e meia após sua inauguração já iniciando a destruição da primeira geração de prédios Beaux Arts afrancesados.

Em Rio de Janeiro: Uma cidade no tempo (organizado por Evelyn Furquim Werneck Lima et al. e editado em 1992 pela Prefeitura do Rio), lemos:

"Até o final do século XIX, o centro da cidade do Rio de Janeiro, Capital Federal da república do Brasil, tinha a aparência de uma antiga cidade colonial. [...] Entretanto, a nova estrutura política do país exigia a adequação do espaço urbano às necessidades da economia braileira, que se integrava ao mercado mundial através da exportação de café. [...] Indicado em 1902 para Prefeito do Distrito Federal, Pereira Passos foi responsável pela maior reforma urbana executada até então. [...] Do ponto de vista econômico, a remodelação da cidade consistiu primordialmente na transferência e modernização do porto do Rio de Janeiro [...] Seguindo o modelo de outros grandes centros latino-americanos, priorizou-se a construção de grandes avenidas que facilitassem a circulação urbana e embelezassem a cidade. [..] A Av. Central, atual Av. Rio Branco, rasgou o centro da cidade no sentido norte-sul, às custas da demolição de centenas de casas."

Em 1912, com o falecimento do Barão do Rio Branco, a Av. Central recebeu seu nome.



Avenida Rio Branco fotografada por Augusto Malta

Outra foto do Malta

Da primeira geração de prédios da Av. Rio Branco, vencedores de um concurso internacional de fachadas, com prêmios em dinheiro e a participação de 107 concorrentes, promovido pela Comissão Construtora da Avenida Central, sobrevivem dez: 

  • 1) Hotel São Bento, no número 19 da Av. Rio Branco, no encontro com as Ruas São Bento e Dom Gerardo 
  • 2) Banco Central (no número 30, antiga Casa de Amortização) 
  • 3) sede do Iphan (46, prédio que pertenceu à Docas de Santos) 
  • 4) Antigo Bar Simpatia, atual Simpatia Lotérica e outros (92, bem estreita para preservar a adjacente Igreja de Nossa Senhora da Conceição e Boa Morte)
  • 5) prédio comercial (155) 
  • 6) Clube Naval (180, esquina com Almirante Barroso) 
e na Cinelândia: 

  • 7) Teatro Municipal 
  • 8) Biblioteca Nacional 
  • 9) Museu Nacional de Belas Artes 
  • 10) Centro Cultural da Justiça Federal

Uma série de fotos desses prédios que nasceram com a Avenida pode ser vista em o O Globo.


Theatro Municipal com Carlos Gomes na frente [depois da restauração a estátua foi transferida para mais perto do teatro]

Rio Branco antes da implantação do VLT: uma avenida importante, mas sem o charme de outrora.



Com a implantação do VLT o trecho da Av. Nilo Peçanha até a Cinelândia tornou-se um aprazível passeio, sem carros, só o bonde, que circula mais ou menos de quinze em quinze minutos.

Postagem originalmente publicada em 15/11/05 quando a Avenida completou cem anos, e agora acrescida de fotos e textos novos. Outras fotos do Rio Antigo podem ser vistas clicando-se no marcador "fotos do Rio Antigo" abaixo. Saiba mais sobre a Avenida Central fazendo o download da versão em PDF do livro O Rio de Janeiro na época da Avenida Central. Veja as fotos e desenhos das fachadas dos prédios originais da Avenida Central clicando aqui.