Largo do Paço, gravura de Louis Buvelot de 1845 obtida na Biblioteca Nacional Digital. O Arco do Teles está sob a seta. |
O Arco do Teles era originalmente uma passagem por uma das três casas
coloniais de uso misto (residencial e comercial) de meados do século XVIII de propriedade do juiz de órfãos Francisco Teles Barreto de
Meneses ligando o Largo do Paço (atual Praça XV) ao Beco do Arco do Teles (atual
Travessa do Comércio), como vemos na gravura acima, sob a seta. O Arco
sobrevive até hoje, tombado pelo IPHAN em 1938, só que das três casas coloniais
originais só restam as fachadas dianteira e traseira da casa central acopladas a prédios modernos, como você pode ver na primeira foto abaixo.
No Capítulo II de O Rio de Janeiro no Tempo dos Vice-Reis, Luís Edmundo assim descreve as casas do Teles e seu Arco: “À direita, na linha do casario que avança para a praia, as casas do Teles, com os seus balcões verdoengos [=esverdeados] e os seus telhados íngremes e pardos. Na linha do rés-do-chão, vê-se a porta que dá entrada à bodega do francês Philippe, uma das mais populares figuras da cidade e que a profissão de bodegueiro liga à de intérprete, agente de câmbio e mais negócios. A sua tasca é uma das mais populares, sítio onde vão parar os viajantes vindos de Minas e de S. Paulo e onde, por vezes, dormem. Que os que estão em trânsito no porto podem descer, mas não podem dormir em terra. O Arco do Teles abre adiante a face escancarada e suja. É uma passagem curta, onde se amontoam e desaparecem mendigos, rascoas [=meretrizes], vadios e soldados." (Ver ilustração ao final da postagem.)
No Capítulo II de O Rio de Janeiro no Tempo dos Vice-Reis, Luís Edmundo assim descreve as casas do Teles e seu Arco: “À direita, na linha do casario que avança para a praia, as casas do Teles, com os seus balcões verdoengos [=esverdeados] e os seus telhados íngremes e pardos. Na linha do rés-do-chão, vê-se a porta que dá entrada à bodega do francês Philippe, uma das mais populares figuras da cidade e que a profissão de bodegueiro liga à de intérprete, agente de câmbio e mais negócios. A sua tasca é uma das mais populares, sítio onde vão parar os viajantes vindos de Minas e de S. Paulo e onde, por vezes, dormem. Que os que estão em trânsito no porto podem descer, mas não podem dormir em terra. O Arco do Teles abre adiante a face escancarada e suja. É uma passagem curta, onde se amontoam e desaparecem mendigos, rascoas [=meretrizes], vadios e soldados." (Ver ilustração ao final da postagem.)
Arco do Teles visto da Praça XV. Observe que a fachada da casa colonial está encaixada entre os prédios modernos. |
A casa colonial, abstraindo-se os prédios modernos |
Chegando mais perto |
Vamos entrar? Em outras eras a passagem não era tão segura assim, como lemos no texto do Coarary |
O texto a seguir foi extraído da obra-prima de Vivaldo Coaracy Memórias da cidade do Rio de Janeiro:
O Arco do Teles está hoje tombado como monumento histórico. Policiado e relativamente asseado, serve quase exclusivamente para a passagem de caminhões que nele carregam ou descarregam mercadorias dos depósitos situados na travessa. Nem sempre, porém, assim foi. Passagem nobre e bem frequentada no tempo dos vice-reis, prestigiado pela vizinhança do Senado da Câmara e proximidade do Paço, decaiu e abastardou-se com o correr dos anos. Por proporcionar abrigo das intempéries, por ser sombrio, tornou-se o Arco do Teles uma espécie de Pátio dos Milagres, valhacouto de vagabundos, refúgio de delinquentes e palco de cenas vergonhosas, pouso de desacreditados tipos de rua como o Filósofo do Cais, a Bárbara Onça, e outros.
O Arco do Teles está hoje tombado como monumento histórico. Policiado e relativamente asseado, serve quase exclusivamente para a passagem de caminhões que nele carregam ou descarregam mercadorias dos depósitos situados na travessa. Nem sempre, porém, assim foi. Passagem nobre e bem frequentada no tempo dos vice-reis, prestigiado pela vizinhança do Senado da Câmara e proximidade do Paço, decaiu e abastardou-se com o correr dos anos. Por proporcionar abrigo das intempéries, por ser sombrio, tornou-se o Arco do Teles uma espécie de Pátio dos Milagres, valhacouto de vagabundos, refúgio de delinquentes e palco de cenas vergonhosas, pouso de desacreditados tipos de rua como o Filósofo do Cais, a Bárbara Onça, e outros.
À entrada do arco existia primitivamente um dos pequenos
oratórios abundantes na velha cidade: simples nicho abrigando uma imagem diante
da qual geralmente ardia uma luz. Eram demonstrações da devoção do proprietário
dos prédios e diante de muitos desses nichos se reuniam, em certos dias da
semana, moradores da vizinhança para rezar ladainhas. No oratório do Arco do
Teles venerava-se a imagem de Nossa Senhora dos Prazeres. Tão escandalosas,
porém, eram as cenas que a imagem presenciava que, revoltado com semelhante
profanação, um dos moradores da zona, Manuel Machado de Oliveira, tomou a
iniciativa de remover a santa imagem para a Igreja de Santo Antônio dos Pobres,
onde até hoje se encontra.
Em começos do corrente século [século XX], em ação conjunta,
a Polícia e a Prefeitura promoveram o saneamento moral e material do Arco do
Teles e desde então, removida das proximidades a Praça do Mercado, modificados
os costumes, ele ficou sendo simples passagem para trânsito comercial.
Em 1750, como já ficou registrado, a Câmara cedeu a sua
casa, sobre a Cadeia Velha, para sede do Tribunal da Relação que acabava de ser
criado no Rio de Janeiro. Passou a Casa das Vereanças a funcionar então no lado
oposto do Largo, nas casas de Teles de Meneses de que alugou uma parte dos
sobrados onde instalou todos os seus serviços de secretaria. Estava aí alojada
quando, em 1757, a provisão régia de 11 de março lhe concedeu o título de
Senado da Câmara.
Nos baixos, ou pavimento térreo, das casas dos Teles funcionavam
várias lojas de pequenos mercadores. Entre elas, havia a de um belchior ou
adeleiro, Francisco Xavier, mais conhecido por alcunha popular que a decência
não permite reproduzir, mas que consta de autos antigos. Na noite de 20 de
julho de 1790, irrompeu violento incêndio nessa loja. No empenho de salvar as
mercadorias que ali guardava e representavam todos os seus haveres, pereceu nas
chamas o belchior e com ele um menino que lhe servia de caixeiro e criado. O
fogo propagou-se aos sobrados e comunicou-se à casa da Câmara, destruindo não
só os móveis, alfaias e pertences, como o precioso arquivo municipal, do qual
apenas se salvaram uns poucos livros que se encontravam eventualmente em poder
do escrivão do Senado da Câmara. [...]
A perda irremediável do arquivo municipal representou
prejuízo de extensas consequências. Até hoje, muitos pontos obscuros da
história da cidade e numerosas controvérsias sobre a origem de posses
territoriais e seu caráter alodial ou enfitêutico, não podem ser esclarecidos
com exatidão em resultado daquele incêndio. [...]
O juiz Francisco Teles Barreto de Menezes mandou reconstruir
os prédios de sua propriedade que o incêndio destruíra em parte. Quanto ao
Senado da Câmara, passou a funcionar em prédios alugados, sucessivamente na Rua
do Ouvidor, na Rua Direita, no Consistório da Igreja do Rosário, sem sede
própria, até instalar-se por fim, em 1825, em casa especialmente construída, no
Campo da Aclamação [...]
Vivaldo Coaracy, Memórias da Cidade do Rio de Janeiro, Coleção Rio 4 Séculos, pp.42-43
Arco do Teles visto da Travessa do Comércio. |
Aqui também se vê claramente que o Arco hoje fica sob um prédio moderno. |