O Rio sempre foi polarizado. No século XIX, o máximo era viver em São Cristovão, onde morava a família imperial. Os chiques da época tinham horror à praia, que era considerada lugar de gente pobre, e só entravam no mar por recomendação médica. Pouco a pouco o Rio foi indo, inexoravelmente, rumo ao sul. Primeiro, era bem morar no Flamengo e em Botafogo. Depois, em Copacabana. Depois, em Ipanema, no Leblon e em São Conrado. E agora Barra e Recreio. (Daqui a pouco, será in o carioca morar na praia do Gonzaga, em Santos.) Houve um tempo em que a divisão era entre a Zona Sul e a Norte; hoje a cidade se divide entre as pessoas que moram ou não na Barra.
A Barra e o resto da cidade são dois universos distintos, que raramente se misturam. Quem mora lá freqüenta academias de ginástica, salões de beleza, médicos, dentistas, psicanalistas, hospitais, butiques, cinemas, veterinários, escolhidos não pelo critério de serem os melhores, mas por outro, muito mais importante: estão localizados na Barra. Lá não há ruas nem calçadas, todo mundo anda de carro. Os prédios são enormes e sem características marcantes, como o Alfabarra. A alma do bairro está nos shoppings. As mulheres costumam ser louras, de cabelo comprido e liso, e fazem muita ginástica.
Quem mora entre o Leblon e o centro dá um grito se alguém sugerir jantar num restaurante além-túnel. Pode ser o melhor do mundo, eles não querem nem saber. E tente convidar um habitante deste outro planeta a jantar do lado de cá: eles vão dar uma desculpa qualquer, mas de lá não saem. Por isso bons restaurantes do Rio têm aberto filiais na Miami carioca. É imenso o número de pessoas que, tendo se mudado para lá, acabaram transferindo seus escritórios para perto de suas casas. Mal disfarçando a empáfia, eles contam que levam de cinco a sete minutos para ir e voltar do trabalho.
A maior tragédia de uma mãe é quando seu filho comunica que vai se mudar para a Barra. Ela sabe que vai ser pior do que se ele fosse morar em São Paulo ou no exterior. Se fosse para a Europa, ele sentiria saudades da terra em que nasceu e viria visitar seu país uma vez por ano; ela também iria encontrá-lo e, apesar da falta que sentiria do seu filho, teria de se conformar em vê-lo tão pouco. No entanto, se ele for morar e trabalhar na Barra será muito pior. Adeus almoços de domingo, jantares familiares, telefonemas do carro, pelo celular, enquanto ele estava no congestionamento do trânsito. Se seu filho se mudar para a Barra, prepare-se para vê-lo uma ou duas vezes por ano, quando ele tiver de sair do seu paraíso para uma importante reunião de trabalho em, digamos, Botafogo. Aí, talvez – talvez – ele telefone e diga que, como estará perto de sua casa, vai dar uma passada para te ver. Mas por que essa mãe não vai visitá-lo naquele apartamento tão lindo, com um varandão enorme de frente para o mar?
É simples: assim como os de lá se recusam a vir para cá, os de cá têm horror a ir para lá, mesmo para ver um filho querido. A Barra desagregou as famílias e separou os amigos, pois quem mora lá passa a se dar apenas com quem mora lá. Por isso, previna-se: quando conhecer aquela pessoa maravilhosa, que poderia vir a ser seu amor definitivo, pergunte onde ela mora. E só dê prosseguimento ao romance se morarem do mesmo lado da cidade.
A Barra e o resto da cidade são dois universos distintos, que raramente se misturam. Quem mora lá freqüenta academias de ginástica, salões de beleza, médicos, dentistas, psicanalistas, hospitais, butiques, cinemas, veterinários, escolhidos não pelo critério de serem os melhores, mas por outro, muito mais importante: estão localizados na Barra. Lá não há ruas nem calçadas, todo mundo anda de carro. Os prédios são enormes e sem características marcantes, como o Alfabarra. A alma do bairro está nos shoppings. As mulheres costumam ser louras, de cabelo comprido e liso, e fazem muita ginástica.
Quem mora entre o Leblon e o centro dá um grito se alguém sugerir jantar num restaurante além-túnel. Pode ser o melhor do mundo, eles não querem nem saber. E tente convidar um habitante deste outro planeta a jantar do lado de cá: eles vão dar uma desculpa qualquer, mas de lá não saem. Por isso bons restaurantes do Rio têm aberto filiais na Miami carioca. É imenso o número de pessoas que, tendo se mudado para lá, acabaram transferindo seus escritórios para perto de suas casas. Mal disfarçando a empáfia, eles contam que levam de cinco a sete minutos para ir e voltar do trabalho.
A maior tragédia de uma mãe é quando seu filho comunica que vai se mudar para a Barra. Ela sabe que vai ser pior do que se ele fosse morar em São Paulo ou no exterior. Se fosse para a Europa, ele sentiria saudades da terra em que nasceu e viria visitar seu país uma vez por ano; ela também iria encontrá-lo e, apesar da falta que sentiria do seu filho, teria de se conformar em vê-lo tão pouco. No entanto, se ele for morar e trabalhar na Barra será muito pior. Adeus almoços de domingo, jantares familiares, telefonemas do carro, pelo celular, enquanto ele estava no congestionamento do trânsito. Se seu filho se mudar para a Barra, prepare-se para vê-lo uma ou duas vezes por ano, quando ele tiver de sair do seu paraíso para uma importante reunião de trabalho em, digamos, Botafogo. Aí, talvez – talvez – ele telefone e diga que, como estará perto de sua casa, vai dar uma passada para te ver. Mas por que essa mãe não vai visitá-lo naquele apartamento tão lindo, com um varandão enorme de frente para o mar?
É simples: assim como os de lá se recusam a vir para cá, os de cá têm horror a ir para lá, mesmo para ver um filho querido. A Barra desagregou as famílias e separou os amigos, pois quem mora lá passa a se dar apenas com quem mora lá. Por isso, previna-se: quando conhecer aquela pessoa maravilhosa, que poderia vir a ser seu amor definitivo, pergunte onde ela mora. E só dê prosseguimento ao romance se morarem do mesmo lado da cidade.
A Barra se tornou também o reino dos jogadores de futebol, que compraram apartamentos imensos e caríssimos, para a infelicidade dos seus vizinhos. Os moradores odeiam quando as famílias desses jogadores – imensas, com montes de crianças – vão visitá-los e usufruir dos luxos que os condomínios oferecem, como a piscina e demais apetrechos de lazer. Houve até um caso famoso em que, não sabendo que se tratava dos pais de um desses jogadores, alguns moradores chamaram o porteiro para impedi-los de subir pelo elevador social.
Clique no marcador abaixo para ver todas as postagens deste blog sobre a Barra da Tijuca. Para ler a crônica de Fernanda Torres "Eu amo a Barra" publicada na Veja Rio de 20/8/08 clique aqui.