ENSEADA DE BOTAFOGO

ENSEADA DE BOTAFOGO
"Andar pelo Rio, seja com chuva ou sol abrasador, é sempre um prazer. Observar os recantos quase que escondidos é uma experiência indescritível, principalmente se tratando de uma grande cidade. Conheço várias do Brasil, mas nenhuma tem tanta beleza e tantos segredos a se revelarem a cada esquina com tanta história pra contar através da poesia das ruas!" (Charles Stone)

VISTA DO TERRAÇO ITÁLIA

VISTA DO TERRAÇO ITÁLIA
São Paulo, até 1910 era uma província tocada a burros. Os barões do café tinham seus casarões e o resto era pouco mais que uma grande vila. Em pouco mais de 100 anos passou a ser a maior cidade da América Latina e uma das maiores do mundo. É pouco tempo. O século XX, para São Paulo, foi o mais veloz e o mais audaz.” (Jane Darckê Avelar)

25.3.09

CONFEITARIA COLOMBO


Inaugurada a 17 de setembro de 1894, por Manoel Lebrão e Joaquim Borges de Meirelles, com o nome de Pâtisserie Colombo, quase na esquina com a Rua do Ouvidor, a rua da moda da cidade no século XIX e no início do século XX, tornou-se logo ponto de atração para a sociedade e local de reunião de artistas, intelectuais e jornalistas. A área reunia, na época, o comércio mais sofisticado do país. A Confeitaria Colombo é a única casa comercial remanescente daqueles tempos, em que era elegante fazer compras no Centro e tomar chá, às cinco, nas requintadas confeitarias. Sua aparência atual data da reforma de 1913, que lhe assegurou uma atmosfera art nouveau irresistível.


No primeiro andar, a área da confeitaria tem balcões e vitrines de jacarandá, em estilo Luís XV, bancadas de mármore italiano e antigos vidros de balas. O salão de refeições exibe monumentais espelhos belgas, com molduras brasileiras de jacarandá, paredes com a parte inferior recoberta de mármore lavrado, com desenho de delicadas gregas; as mesas, com pés de ferro fundido, têm tampos de mármore; as cadeiras são em estilo Luís XV. O teto é trabalhado com sancas e florões e os lustres obedecem a desenho caprichoso. O piso, de ladrilhos, tem desenho colorido e delicado. No segundo andar, o salão de chá tem camarotes para orquestra, atualmente ocupados, eventualmente, por piano. Uma notável claraboia de vidro decorado com motivos florais e anjos é o ponto alto do salão, em harmonia com os painéis pintados existentes nas paredes, retratando vestais, anjos e flores. (Texto extraído do Guia Michelin do Rio de Janeiro)



Em "Confeitaria Colombo: 100 anos de charme", escreve Alessandro Motta Buzas: "A roda mais famosa dos intelectuais que ali frequentaram é a de Olavo Bilac, fundador da Sociedade dos Homens de Letras, em 1914. O objetivo dessa sociedade era criar uma bandeira de luta pela defesa dos "trabalhadores intelectuais" que não tinham uma remuneração adequada em jornais e revistas. Na festa da Colombo, em 1955, quando houve o centenário de nascimento de Olavo Bilac, este foi homenageado com uma placa comemorativa na entrada da casa. O poeta era tão pontual para os diários chás da cinco que os funcionários sempre acertavam os relógios da casa assim que ele chegava. Bilac viajava muito e, sempre que retornava ao Brasil, havia festa na Colombo, com direito a "quadrinhas comemorativas" dos padrinhos da roda." Para ler o artigo completo de Alessandro sobre a Colombo, clique aqui.






Saiba tudo sobre a Confeitaria Colombo (endereço, menu, horário etc.) visitando o site da confeitaria. Para ver uma exibição de slides com estas e outras fotos da Colombo tiradas pelo editor do blog, clique aqui.

16.3.09

RIO VISTO PELA FRANCESA VÉRONIQUE



Como conheço bem o Rio, às vezes me pedem que eu organize passeios guiados. Este Carnaval levei para passear um grupo de uns trinta franceses curtidores do samba que vieram desfilar na Sapucaí. Uma das participantes, a Véronique, achou (em francês, claro) la balade que nous avions faite avec vous dans Rio, très belle et interessante balade d'ailleurs. (Balade em francês é passeio). Ela tirou umas fotos bem interessantes. Algumas mostro nesta postagem. Para ver todas as fotos da Véronique no Brasil (inclusive na Bahia e no Sambódromo), clique aqui.









28.2.09

A VISITA DO POETA

Crônica de Antônio Maria


Estatueta de Zé Andrade exposta na Modern Sound


Bar Garota de Ipanema (esquina das ruas Vinicius de Moraes e Prudente de Morais), onde Tom Jobim e Vinícius de Moraes se inspiraram para compor a música Garota de Ipanema

Cá está o poeta Vinicius de Moraes. Bebe, silenciosamente, um copo de cerveja, enquanto desenha.
— Vai falando, Poesia — digo-lhe, de vista baixa...
— Eu não — responde ele, de vista mais baixa ainda.
Vou desenhando e pensando. O que haverá com Poesia? Alguém judiou dele. Para ele estar assim...

Terá sido mulher? Sempre que o vi, estava feliz. Opulento, até. Na face, o seu saudável “rosa-colonial”. Hoje, até pálido ele está. Poucos sabem a extensão da maldade, quando se faz sofrer aos poetas. Aos poetas, não se pode negar nada. Tirar, muito menos. Principalmente a este, que é um franciscano. Vocês não sabiam? Vinicius de Moraes é franciscano, apenas está dispensado de usar o hábito porque todos o dispensam de fazer sacrifícios. O Itamarati, por exemplo, o dispensou de ir lá. Quando o ministro Hermes Lima precisa de alguma orientação, manda Lolô Bernardes telefonar e Vinicius instrui, pelo telefone. Na Casa de Rio Branco não se faz nada sem ouvir Vinicius de Moraes. Daí a mágoa de Pomona Politis, que se considera uma continuação e, às vezes, o próprio Barão do Rio Branco.

Mas, o que há com Poesia para estar ali sentado, sem um som, sequer o da respiração? Esse poeta arfava muito. Antigamente, a dois metros dele, era possível ouvir-se-lhe a arfância. E nunca foi de sentar muito tempo, a não ser se tivesse alguém no colo. No mínimo, uma criança. Também, não se pode dizer que tenha sido um poeta vertical; isto é, em pé. Na horizontal, com simples acenos, abalou montanhas, causou muita febre terçã, afundou navios e derrubou aeronaves. O Zepelin, não o bar, mas o Graf Zepelin pegou fogo por quê?

E hoje, cá está o poeta, de vista baixa, bebendo sua cervejinha, calado, de repente, como ele mesmo vaticinou, “não mais que de repente”. Poesia, que é da moça, que dizia à lua: “Minha carne é cor-de-rosa; não é verde como a tua.” Que é da mulher, que passou, com sete esperanças na boca fresca. Que é da outra, cujos cabelos rescendiam à flor da murta. E tu disseste, Poesia, gloriando a todas elas: “Tende piedade, Senhor, de todas as mulheres!”

Não queria ver o poeta assim, em minha casa. A cabeça pendida, o peito silencioso, a mão trêmula, erguendo o copo de cerveja... cerveja que sabe às amargas ingratidões. Quero-o, como antes, contando o abalo que causou em Ava Gardner, em Rosana Schiafino, na Soraya, na própria Edith Piaf, quando essas senhoras o viram pela primeira vez. Ava Gardner, coitada, ainda era virgem e ficou de tal maneira perturbada que se casou com Mickey Rooney.

Uma vez, no Louvre, diante da Gioconda, eu lhe disse, muito a sério:
— Vamos sair daqui, Poesia, que essa mulher vai se descontrair e cair na gargalhada.


Bar Vinicius, em frente ao Garota de Ipanema


Toca do Vinicius, na rua Vinicius de Moraes

Crônica extraída da antologia Seja feliz e faça os outros felizes organizada por Joaquim Ferreira dos Santos e publicada pela Civilização Brasileira. Clique no marcador "Vinicius de Moraes" abaixo para ver outras aparições de Vinicius no blog.

19.2.09

CARNAVAL DE RUA

Fotos do Carnaval de 2008


Neste Carnaval de 2009 mais de 700 mil turistas visitam o Rio. Se os americanos conseguiram enviar uma nave tripulada à Lua, nós conseguimos organizar o maior espetáculo da Terra (o desfile das Escolas de Samba). Ano retrasado, escrevi neste blog: “Ano que vem, se Deus quiser, estarei lá”. Estive nos ensaios técnicos, já é alguma coisa. Mas nem só de Sapucaí vive o Carnaval do Rio. Os blocos de rua a cada ano atraem mais gente. O Carnaval carioca é cem por cento democrático, sem "cordinhas" de isolamento, sem abadás — diversão garantida a baixo custo (o custo das cervas vendidas por ambulantes). "Ninguém precisa ficar de fora, tem bloco para todos os gostos. Dos antigos Cordão da Bola Preta, Banda de Ipanema e Simpatia é Quase Amor — que arrastam milhares de pessoas em seus desfiles — aos estreantes como o alegre Filhos de Bambi, que se concentra na Rua Bambina." (O Dia)

As dezesseis primeiras fotos da postagem foram tiradas durante o desfile dos blocos de embalo (Bafo da Onça, Turma do Serrote, Cacique de Ramos etc.), domingo à noite, na Avenida Rio Branco. A antepenúltima e penúltima fotos, no desfile do Clube do Samba, terça-feira, na Avenida Atlântica, e a última, na velha e boêmia Lapa. As fotos são do Carnaval de 2008, quando esta postagem foi originalmente ao ar.

















Fotos de Ivo & Mi. Para ver outras postagens sobre o Carnaval carioca, clique no marcador abaixo.

26.1.09

A KOMBI (homenagem a Pedro Nava)

Texto (de 2004) e fotos da Glória do editor do blog


E ela, a paisagem, como tudo, na Natureza, é graça.
Pedro Nava, Cera das almas (último livro de memórias, inacabado)

No prédio com portão maciço de ferro e vidro, fachada de mármore no térreo e amplas janelas envidraçadas no corpo abaulado, no estilo Art Déco tão típico da geração de prédios cariocas da década de 30 — entrada descaracterizada por grade de ferro recentemente instalada para espantar mendigos e ladrões — a placa indica (mas os transeuntes, apressados, não prestam atenção):

Pedro da Silva Nava
1903-1984
Médico, escritor e poeta
Mineiro de Juiz de Fora,
aqui residiu entre 1943 e 1984.
Sua obra destaca-se no panorama cultural brasileiro.


Pouco adiante, vestígios grafitados de antigo chafariz colonial, onde escravos, barris equilibrados à cabeça (imagino), vinham pegar água — bons tempos? Ambulantes oferecem quinquilharias: velhos vinis, revistas de mulher nua pra lá de amassadas (quantas punhetas já inspiraram!), software pirata, incensos, caquis de um vermelho que fere a vista (dois reais a caixa). Cãozinho, preso ao poste por corda, dormita.


Outro lado da rua, a amurada, de onde podemos imaginar Camilo olhando para o mar, até onde a água e o céu dão um abraço infinito, em "A Cartomante" — e o famoso relógio da Glória, que orna as capas dos livros de memórias do Nava na edição da Nova Fronteira (e que aparece também na foto de Nava da quarta capa do volume 5 das memórias, na edição original da José Olympio). Atualmente nem sinal do mar, empurrado pra bem longe dali.



Na banca de jornais, Syang exibe os dotes físicos no cartaz da Status. Discreto a um canto, o apontador do jogo do bicho, velhinho de cabelos brancos. Verde das frondosas árvores contra o brancoazul celeste. A esse caleidoscópio de cores vêm se juntar as listras laranja das camisetas de grupo de alunas da escola municipal próxima.

Pouco depois do ponto final do Glória—Leblon, via Copacabana, fica o ponto da Kombi que leva a Santa Teresa. A rigor, deveria sair de quinze em quinze minutos, mas não estamos em Londres, are we? E enquanto restarem lugares vazios o motorista se verá tentado a esperar só mais um "minutinho" pra ver se a Kombi lota. Ganhar a vida não é brinquedo não.

Antes da partida, um auxiliar (às vezes, o próprio motorista) cobra as passagens — dinheiro, um e trinta; vale-transporte, um e cinqüenta.
No pára-sol aberto do lado do "carona", os dizeres edificantes: "Entrega tua vida a Jesus. Confia nele e o mais ele fará." Vai contar isto a um prisioneiro de campo de concentração. Menino, dois incisivos faltando, chupa pirulito com a mesma verdade com que a pequena suja comia chocolates no poema do Pessoa.

Na hora de pagar, uma velhinha mirrada, coque prateado, mas ainda transbordando vitalidade, brinca com o cobrador:

— Você fica explorando a velhinha — e, logo em seguinte, abre um sorriso. O cobrador sorri de volta. A velhinha entrega nota amarfanhada de um real, e umas moedas. (A rigor, a velhinha deveria ser dispensada do pagamento, mas no transporte alternativo essas regras nem sempre são observadas.)
— Tenho 82 anos — revela a velhinha. — Está na hora do Homem lá em cima me chamar.
— Pra 82 anos a senhora até que está ótima — elogia uma passageira.
Parte a Kombi. Dobra à direita e sobe o início da Cândido Mendes. Caminhão de lixo atravanca a entrada da Hermenegildo. Alguém resmunga:
— Neste país não tem lei, não tem nada, e mesmo que tiver, ninguém obedece.

A Kombi segue o mesmo percurso que Nava costumava fazer a pé, e narra com detalhes em Galo das trevas:

Meus passeios a pé pelo bairro seguem sempre os mesmos itinerários. Saio do meu 190 para a direita, transponho fachadas de arranha-céus. Na esquina, onde havia aquele café das madrugadas, existe hoje uma lanchonete [atualmente, Chopperia Vila Rica, "o melhor chopp do bairro" "Não temos comida a quilo, tudo é feito na hora e não demora. Experimente."]. Virando à direita, começo a subir Cândido Mendes. (...) Nenhuma casa antiga no princípio. Só os altos prédios. (...) Estaco sempre a contemplar as fachadas dos belos sobradões de números 118 e 117.

A velhinha põe-se a contar que, dia desses, tropeçou e caiu; culpa da sandália, de plástico. Na terra onde nasceu (e aí ela abre um parêntese e conta que nasceu em Sergipe) as sandálias eram de couro. Velhinha arretada!

Da vida nada se leva. A velhinha vive sua vida humilde, mas se tem o que comer, já é bom demais. Os filhos, criados, lhe deram netos, bisnetos. Mês passado, a filha, que mora em Aracaju, veio visitar a mãe, e foi logo reclamando da casa.

— Achou a casinha pequena demais. Por que não aluga um apartamento pra mim aqui na Glória? Filho, hoje em dia, só quer saber de bater papo. "Mãe, como é que está? Mãe, tudo bem?" Sabe de uma coisa? Quem bate papo é sapo. Dinheiro mesmo que é bom, pra ajudar, os filhos nem dão.


Quem acompanha o blog desde o princípio lembrará que esta foi a postagem número 1, de 17/7/05. Agora foi reformatada e ganhou fotos novas.

9.1.09

LAGOA RODRIGO DE FREITAS, de CARLOS HEITOR CONY

Texto extraído do livro Lagoa: História, Morfologia e Sintaxe, editado pela Relume Dumará. Fotos da Lagoa tiradas pelo editor do blog.


O Rio é mais Rio no verão, quando — como dizem os franceses — é bom suar. Sem jogar no lixo a temporada folgazã do carioca, prefiro a cidade nesse meio-ano.

Embora não seja outono, as amendoeiras na praça Paris ficam douradas, o chão coberto de folhas — anos atrás, trazendo Otto Maria Carpeaux para o trabalho, ele comparou a paisagem a um quadro de Utrillo. Um vienense, o Carpeaux: seu referencial era a cultura europeia. Sou carioca, meu referencial é minha própria raiz, Utrillo uma ova, o meu Rio é como aquele relógio do português que às vezes era de ouro e às vezes não era.




Tropical ou impressionista, a cidade talvez não seja boa para se viver, mas é ótima para se olhar. Quando acordo, olho a Lagoa, que renasce a cada manhã como uma criança. São três planos superpostos: o céu muito lavado, nem se pode dizer que é azul; as montanhas, que deviam ser verdes, ficam indecisas sobre a cor que o sol trará a cada uma delas. E a Lagoa, em si, é uma lâmina fina de laboratório que mistura em suas águas as cores que ainda não se definiram.

Eis que surge, enfim, uma cor nítida, estanque: é um barco de corrida, comprido, branco, uma brancura de creme, de filme de Luchino Visconti. Corta com a decisão de seu branco, esse amontoado de cores que aguardam o sol para serem azul ou verde, pelo menos até que a tarde chegue e misture tudo outra vez.




Os barcos de regata costumam ser da cor dos violinos. Mas este, que vem todas as manhãs, é branco. É ele que recebe a primeira luz do sol que enfim deu a cara, depois de vencer a nua pedra do morro dos Cabritos. E é dele que a luz parece se espalhar: o céu fica azul, verde fica a montanha, o dia nasceu da pele escura da Lagoa cortada pelo barco branco.

É um Rio bom que vejo a cada manhã. Depois leio os jornais. Olho mais uma vez a Lagoa: o barco branco sumiu. Amanhã virá outra vez.


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