ENSEADA DE BOTAFOGO

ENSEADA DE BOTAFOGO
"Andar pelo Rio, seja com chuva ou sol abrasador, é sempre um prazer. Observar os recantos quase que escondidos é uma experiência indescritível, principalmente se tratando de uma grande cidade. Conheço várias do Brasil, mas nenhuma tem tanta beleza e tantos segredos a se revelarem a cada esquina com tanta história pra contar através da poesia das ruas!" (Charles Stone)

VISTA DO TERRAÇO ITÁLIA

VISTA DO TERRAÇO ITÁLIA
São Paulo, até 1910 era uma província tocada a burros. Os barões do café tinham seus casarões e o resto era pouco mais que uma grande vila. Em pouco mais de 100 anos passou a ser a maior cidade da América Latina e uma das maiores do mundo. É pouco tempo. O século XX, para São Paulo, foi o mais veloz e o mais audaz.” (Jane Darckê Avelar)

1.8.16

DECLARAÇÕES DE AMOR AO RIO DE JANEIRO

LOUVAÇÕES À CIDADE MARAVILHOSA RECOLHIDAS PELO EDITOR DO BLOG EM JORNAIS, REVISTAS, LIVROS e até em textos já publicados por este blog:


1) “Ninguém pode amar mais do que eu esta cidade do Rio de Janeiro. Ó grande beleza de cidade, ó cidade que é vinte, trinta, quarenta cidades imprevistas, uma infiltrada na outra, esta mais colonial que Ouro Preto, aquela mais nova que Goiânia, uma de alta montanha, uma de oeste de Minas, uma toda de praia, outra de casarões de arvoredo – ó ruas estranguladas entre mares e morros, recantos e esplanadas, cartões-postais baratos e segredos de esquinas sutis, avenidas afogadas em sol e ladeiras de húmus esquecidos – cidade de minhas tantas agonias e felicidades, palcos de velhas inquietações, canais de silenciosa aventura, blocos de cimento que me esmagaram, praças de humilhações, arrabaldes de exaltações líricas – minha medíocre história anda escrita em tuas ruas e nenhuma entre as cidades é mais formosa que tu, nem sabe mais coisas de mim”

RUBEM BRAGA


2) “Estou apaixonado pelo Rio. Vocês têm praia, arte, cultura, montanha, floresta, tudo o que existe de melhor no mundo. Liguei para a minha esposa e falei que a gente precisa morar aqui.”

JOHN GREEN, autor de A culpa é das estrelas


3) “A cidade do Rio de Janeiro, com seu belo céu de azul e sua natureza tão rica, com a beleza de seus panoramas e de seus graciosos arrabaldes, oferece muitos desses pontos de reunião, onde todas as tardes, quando quebrasse a força do sol, a boa sociedade poderia ir passar alguns instantes numa reunião agradável, num círculo de amigos e conhecidos, sem etiquetas e cerimônias, com toda a liberdade do passeio, e ao mesmo tempo com todo o encanto de uma grande reunião.

Não falando já do Passeio Público, que me parece injustamente votado ao abandono, temos na Praia de Botafogo um magnífico boulevard como talvez não haja um em Paris, pelo que toca à natureza. Quanto à beleza da perspectiva, o adro da pequena igrejinha da Glória é para mim um dos mais lindos passeios do Rio de Janeiro. O lanço d'olhos é soberbo: vê-se toda a cidade à vol d'oiseau, embora não tenha asas para voar a algum cantinho onde nos leva sem querer o pensamento.”

JOSÉ DE ALENCAR


4) “Outro dia recebi a carta de uma leitora que me perguntava por que eu não deixo o Rio. Dizia que já havia sido baleada e que, se pudesse, já teria partido. Ela tinha a fantasia de que eu poderia deixar o país, viver fora, e não entendia o fato de eu continuar aqui. Acontece que não posso e não quero largar mão desta cidade. Sou dependente do Rio, das montanhas do Rio, dos cariocas. Sou fruto desta cidade.”

FERNANDA TORRES


5) “Quando saí pela primeira vez do Rio e fui para Nova York, Boston, São Francisco, Paris, Londres, Viena, o que mais me impressionou foram as paisagens humanas. Tudo tinha sido feito por nós, homens e mulheres. Já o carioca fez uma cidade que usa elementos da natureza, criando uma paisagem que transborda dela, sem destruí-la. Não existe nada igual no mundo. Por isso, a gente tem esta facilidade de transcender. É difícil até não acreditar em Deus.”

ROBERTO DAMATTA


6) “Seguindo por uma vereda, penetrei no interior de uma nobre floresta e, de uma altura de cento e cinquenta a duzentos metros, pude contemplar um dos soberbos panoramas tão comuns ao redor de todo o Rio. Vista dessa altura, a paisagem adquire seu brilho mais colorido. Cada forma, cada sombra ultrapassa de modo tão magnificente tudo o que um europeu jamais possa ter visto em sua terra natal, que este não sabe como expressar suas sensações.”

CHARLES DARWIN


7) “Somos privilegiados por viver numa cidade que é a própria História do país, a história da formação de um povo, da formação da brasilidade. Os baianos que me perdoem, mas o Rio de Janeiro tem uma característica mais heterogênea do que a própria Bahia, só pelo fato de ter sido capital do país desde 1763 até a segunda metade do século XX, e por abrigar um porto altamente cosmopolita.”

NIREU CAVALCANTI


8) “Sabe aquela famosa frase de caminhão 'viajo porque preciso, volto porque te amo?' Eu poderia assinar esta. Saio do Rio, mas o Rio não sai de mim.”

JOYCE MORENO


9) “Você é múltipla, diversa, encantadora em todos os seus cantos. A melhor companhia sempre, em qualquer situação. Um mergulho na praia. Uma caminhada no calçadão. Um passeio pela Floresta da Tijuca, Um samba em Madureira. Um bate-papo com vizinhos numa calçada do subúrbio. Um jogo de futebol no Maracanã. Uma festa na laje da favela. Um chope com amigos no bar. Um encontro casual na esquina. Você é toda essa mistura de gente. Você favorece o encontro. Você é da rua, é de todo mundo e virou até Patrimônio da Humanidade.”

EDUARDO PAES


10) “Aqui tem mar e montanha. E as mulheres têm bunda e peito. É por isso que chamam o Rio de Janeiro de Cidade Maravilhosa. Vocês têm tudo que os outros lugares do mundo queriam ter.”

RAPPER AMERICANO DON BLANQUITO


11) “O Rio é síntese brasileira que escapa a guias de turismo, transcende. É cidade-mulher e não precisa de joias para se enfeitar. Mais bela está para existir. Já completou quatrocentos janeiros e fica cada vez mais criança, ri de tudo, ri à toa. Ri de todos e, depois, de si mesma. Também por isso, fascina.”

JOÃO ANTÔNIO


12) “O Rio é vício realmente, você é dependente dele... É a beleza... As montanhas do Rio têm contorno de mulher, uma mulher deitada. O Rio de Janeiro é um orgasmo.”

MÁRIO LAGO


13) “Esta capitania do Rio dista da Equinocial 23 graus para o Sul, e da Bahia 130 léguas. É muito sadia, de muitos bons ares e águas. No verão tem boas calmas algumas vezes, e no inverno mui bons frios; mas em geral é temperada. O inverno se parece com a primavera de Portugal: têm uns dias formosíssimos tão aprazíveis e salutiferos que parece estão os corpos bebendo vida. [...] A cidade está situada em um monte de boa vista para o mar, e dentro da barra tem uma bahia que bem parece que a pintou o supremo pintor e architecto do mundo Deus Nosso Senhor, e assim é cousa formosíssima e a mais aprasivel que ha em todo o Brasil, nem lhe chega a vista do Mondego e Tejo.”

PADRE FERNÃO CARDIM


14) “Nesta manhã chuvosa, quase fria, neste dia cinzento, o Rio deixa de ser capital do Brasil, mas não se sente infeliz por isso. Que imaginam vocês da responsabilidade, da utilidade ou da necessidade de uma beleza como esta, plantada na orla marítima, inundada de sol, feliz com os seus defeitos, qual a vantagem de ser capital política e administrativa? Acenaram-nos o consolo de que, por muitos séculos, o centro literário, musical, artístico, não sairá daqui. [...]

De qualquer forma, obrigado, Juscelino, por fazer disto uma cidade. Com a sua Brasília, fez do Rio uma cidade autônoma, habitável e mais vazia, embora sem o encanto de sua presença. Nós, os ingratos, nem de longe poderíamos imaginar como é bom viver longe dos políticos, das confusões, de todo esse aglomerado humano que faz da Corte uma cidade hostil, atravancada, sem nenhum atrativo. Ninguém podia imaginar que de repente voltássemos, sem sair daqui, a uma ilha de paz, de sol e de perdão.”

DAVID NASSER (em crônica sobre a transferência da capital para Brasília)


15) “Ser brasileiro é ter certidão de Estados da graça.
Qualquer um, tem o seu charme de seduzir.
Mas o cortejo do Rio... cativação para sempre.
Quem pode resistir?
Inspirar beleza e expirar poesia, função vital de coração de poeta.
Desvendar a alma do Rio... ousadia de quase morrer lindamente, de emoção.”

VILMA DUARTE, a cronista de Araxá


16) “Fellini se apaixonou por Roma quando, menino, em sua cidade natal, Rimini, viu num vagão de trem a placa com o nome: Roma. Em tempos de orgulho gay, toda vez que vejo o nome da minha cidade, mesmo num ônibus que chega de não sei de onde, coberto de pó e fadiga, sinto um orgulho besta e sempre renovado de aqui ter nascido, o rio de minha vida e de minha saudade.”

CARLOS HEITOR CONY


17) “Não há no mundo Cidade mais encantadora. Paris, Londres, Roma, Atenas, Jerusalém, Cairo, Tóquio e Nova York guardam seus encantos, suas tradições, suas culturas e suas civilizações. A Cidade Maravilhosa, coração do Brasil, guarda encantos mil. Guarda praias, abriga florestas, encanta com o Pão de Açúcar e é abraçada pelo Cristo Redentor, que, diariamente, do Alto do Corcovado, também abençoa a todos, e sempre de braços abertos.”

PAULO CÉSAR MARTINEZ Y ALONSO


18) “Quando criança eu pensava: ‘Sorte ter nascido na cidade mais bonita do mundo’. Depois de adulto, tive curiosidade em conhecer outras cidades mundo afora, mas após tantos périplos, continuo fiel ao primeiro amor, o Rio.
É só sair pelas ruas para deparar com grandes e pequenas maravilhas.”

“O Rio de Janeiro não é uma cidade como, digamos, Goiânia ou Caruaru, onde você esgota as atrações turísticas em um ou dois dias de visita (claro que não estou desmerecendo estas simpáticas cidades que já tive o prazer de visitar). As atrações são infinitas, ou melhor, transfinitas, porque estão sempre aumentando, sempre aparecem coisas novas. Moro no Rio há seis décadas (nasci aqui) e sou um eterno turista carioca, sempre me surpreendendo, sempre descobrindo uma novidade.”

IVO KORYTOWSKI (editor deste blog)


19) “Andar pelo Rio, seja com chuva ou sol abrasador, é sempre um prazer. Observar os recantos quase que escondidos é uma experiência indescritível, principalmente se tratando de uma grande cidade. Conheço várias do Brasil, mas nenhuma tem tanta beleza e tantos segredos a se revelarem a cada esquina com tanta história pra contar através da poesia das ruas!”

CHARLES STONE


20) “Esta primeira impressão de multiplicidade repete-se e aumenta continuamente de dia a dia; nunca se acaba de ver essa cidade, porque ela procura sempre mostrar, de dentro de um outro esconderijo, um novo encanto: talvez não exista outra no mundo que seja tão engenhosa em vistas e panoramas inesperados, também nenhuma que possua tantas camadas culturais diferentes. Passeios a pé ou de automóvel significam aqui a descoberta de coisas imprevistas, porém a surpresa que mais espanta é a extensão do Rio de Janeiro. Imagina-se que depois de trinta ou quarenta minutos de passeio de auto já chegamos a uma extremidade da cidade, e, deveras, já se eleva um outeiro e a rua perde-se no verde, porém, ali, de repente, recomeça uma outra cidade de vilas ou um subúrbio, e este crescimento parece permanecer invariavelmente. E nessa dimensão gigantesca, que multiplicidade! Quantas cidades diferentes nessa única cidade!”

STEFAN ZWEIG, “Pequena Viagem ao Brasil” (1936)


21) “O Brasil está associado a todas essas qualidades de bom humor, boa vida e Carnaval. O Carnaval é muito importante — é a imagem clássica que as pessoas têm do Rio, e é uma imagem de felicidade”.

SIMON ANHOLT, consultor da pesquisa publicada em 2009 pela Forbes elegendo o Rio a cidade mais feliz do mundo




22) “A cidade tem mar e montanha, clima bom o ano inteiro e a felicidade do carioca”

CLAUDE TROISGROS

 

23) “Poucas cidades no mundo têm o mar e a floresta tão próximos. É isso que torna o Rio tão especial”

PAULO BETTI



24) “Muitas coisas fazem o Rio especial: a magia, a poesia, gente bonita, o Maracanã, o futebol, o Flamengo

JORGE BEN JOR



25) “A mistura do Rio é muito cativante: é uma cidade moderna, mas com foco enorme na natureza”

PAULA BEZERRA DE MELLO, gerente de marketing do Fasano



26) “O melhor é acordar e dar de cara com o Cristo e o Pão de Açúcar. Fico de bom humor o dia inteiro”

ANA BOTAFOGO



27) “Em cada esquina há vida, diferente de São Paulo ou Brasília. As pessoas conversam nos botequins

MOACYR LUZ



28) “O melhor do Rio é o espírito do carioca, o humor, as praias, as montanhas, o Carnaval”

EVANDRO MESQUITA


29) “O Rio seguiu sendo, ao lado de São Paulo, a grande metrópole brasileira, centro de encantos civilizatórios e oportunidades profissionais, da vida alegre e das praias azuis, da descontração do espírito, onde até os contrastes da miséria, com os cortiços de fins do século XIX e as favelas do século XX, amontoadas umas sobre as outras, acabam sendo motivo para enredos de sambas, audácias de bambas e fonte de turismo internacional. O Rio não perdeu o seu carisma ao deixar de ser o centro do poder. Porque Brasília ainda não logrou firmar o seu. Se é que o fará algum dia... Prossegue atraente, envolta em lendas e mistérios, orgulho dos brasileiros, fonte de atração internacional, logrando superar os riscos da violência nada ‘encantadora de suas ruas’, com promessas de amor, graça, encanto e diversão.”

NELSON MELLO E SOUZA, “Rio de Janeiro e Seu Carisma”, 450 Anos da Cidade de São Sebastião do Rio de Janeiro, revista da Academia Carioca de Letras


30) “O vento beijando o teu rosto, o mar se arrojando a teus pés, o verde descendo das Serras... Meu Rio, que lindo tu és!
Uma cidade que é gente. Que sonha, que sente, que chora e que ri...
Esta é a minha cidade. Que felicidade é viver por aqui. Há sempre um lugar pra se amar e curtir vendo o sol no horizonte ou o dia raiar.
Arpoador... Ipanema... Praia Vermelha... Grumari...
Que maravilha o dia amanhecendo e como é suave a brisa me beijando. Que extasiante meu corpo suado, tão excitante o sol me possuindo... Um peixe frito e um chope gelado.
Há tanta ternura numa tarde-noite e como é romântico o som de um piano!
Meu amor! Viajei no teu alto-astral. Além de samba e futebol, culturalmente és capital. Minha flor. Beija-flor do meu carnaval. Corpos livres dourando ao sol num calor de quarenta graus.
Vascão, Fla, Flu, Botafogo... Asas delta no ar.
O bicho pega no jogo. Muitos motéis pra transar.
Sou um amante do Rio e fã de Vila Isabel. Alô Madureira, Tijuca, Mangueira e Padre Miguel!
Viva o Cacique de Ramos!
Salve a Banda de Ipanema e o Cordão do Bola Preta!
Só alegria. É carnaval... Vamos lá minha Vila!
Depois vem quarta-feira de cinzas, que legal! Dez! Nota dez! Chope de graça na quadra da escola campeã.
É plena quaresma, mas na sexta-feira tem o Baile das Cremações. Se for pecado Deus perdoa.
Deus é carioca. É carioca, é carioca, é carioca!
Jesus Cristo é carioca...”

MARTINHO DA VILA, “Delírios de Amor Carioca” (trecho), 450 Anos da Cidade de São Sebastião do Rio de Janeiro, revista da Academia Carioca de Letras


31) “Esta é a minha cidade, saudade! a cidade que escolhi para vida, paixão e morte do mineiro despencado do seu Caminho Novo. A cidade onde todos se abraçam no mesmo bloco e seguem sob o mesmo estandarte rutilante. Porque no resto é aquela merda de mineiro contra paulista e cabeça-chata [nordestino], de paulista contra mineiro e guasca [gaúcho], de nordestino contra amazonense e acreano e de todos, a uma, versus a boa terra da Bahia. Aqui, pelo menos, todos rebolam no mesmo samba.”

PEDRO NAVA, Balão Cativo, Capítulo III


32) “Gênova, a soberba, com todos os seu palácios de mármore e jardins; Nápoles, risonha, com as suas águas límpidas, o seu Vesúvio e as suas vilas; Veneza, a rica, com as suas cúpulas e monumentos; o Bósforo, mesmo, com os seus imensos minaretes — nada oferece ao olhar deslumbrado tão magnífico panorama. Eis o Brasil! terra fecunda, entre as mais fecundas, natureza à parte, natureza privilegiada!”

ARAGO (cronista da expedição científica da corveta Uranie ao redor do mundo que aportou no Rio de Janeiro em dezembro de 1817)



33) Rio de Janeiro, cidade a mais ditosa do Novo Mundo! Rio de Janeiro, aí tens a tua augusta rainha, e o teu excelso príncipe com a sua real família, as primeiras majestades que o hemisfério austral viu e conheceu. Estes são os teus soberanos e senhores, descendentes e herdeiros daqueles grandes reis, que te descobriram, te povoaram, e te engrandeceram, ao ponto de seres de hoje em diante a princesa de toda a América, e Corte dos senhores reis de Portugal; enche-te de júbilo, salta de prazer, orna-te dos teus mais ricos vestidos, sai ao encontro dos teus soberanos; e recolhe com todo o respeito, e veneração, e amor o princípio ditoso, que vem em nome do Senhor visitar o seu povo.

LUÍS GONÇALVES DOS SANTOS, O PADRE PERERECA (escrevendo sobre a chegada da Família Real na cidade)


34) A cidade, como o resto do país, vive todas essas misérias. Mas gosto dela mesmo assim, minha cidade louca que já foi tão delicada, berço de Nem, mas de Cartola também, cidade de bambas e de bombas, tão linda e tão depravada. Gosto tanto dela, mesmo assim.

CACÁ DIEGUES na crônica Flores do Mal publicada em O Globo de 24/3/2017


35) Parece-me erro supor que o artista cria independente do meio. Meio pífio, artista pífio – obra d’arte pífia. Entre nós, só no Rio há ambiente para alguma arte – e por isso todos que têm veia para lá acodem.

MONTEIRO LOBATO em carta a Godofredo Rangel de 21 de julho de 1907 (A Barca de Gleyre)


36) A proporção e medida que entrávamos pela baía a dentro,  íamos, paulatinamente, descortinando as magníficas construções da  cidade: o Colégio da Companhia e o Mosteiro de São Bento, sem  iguais no mundo, que formavam, com as demais edificações, o mais  encantador panorama do universo.

A cidade, que se pode, então, descortinar em tôda sua amplitude, fica situada à esquerda de quem entra, constituindo-se no mais formoso panorama que imaginar se possa, em virtude da grandiosidade  de suas construções, situadas em colinas revestidas de perpétuo  relvado.

LOUIS CHANCEL DE LAGRANGE, integrante da esquadra francesa que atacou o Rio de Janeiro em 1711


Fotos tiradas no Rio de Janeiro pelo editor do blog, com exceção do desenho a bico de pena de autor desconhecido de 1836 ao final obtido na Biblioteca Nacional Digital. Você pode reproduzi-las desde que cite a fonte.

19.7.16

A NOVA VELHA ORLA DO CENTRO CARIOCA


Com a aproximação das Olimpíadas, vão sendo abertos à população novos trechos de uma nova orla durante meio século oculta pela Perimetral e que, na verdade, é a nossa orla histórica original: a orla do Centro da cidade. Quando totalmente concluída (o que se dará em poucas semanas) será possível caminhar dos antigos armazéns do Cais do Porto até o Museu Histórico Nacional. O VLT contribui para dar uma nova mobilidade aos frequentadores do Centro, sejam os tradicionais (quem trabalha lá) ou os novos (a multidão que agora acorre ao Centro nos fins de semana para o lazer, inclusive eu e minha esposa). Dois grandes museus na Praça Mauá, os food-trucks, a abertura de uma área durante séculos restrita à Marinha: tudo isso aumenta a atratividade da nova orla. Aqui estão algumas fotos tiradas espontaneamente (sem que eu tivesse a intenção prévia de preparar a postagem que agora preparo). 


O VLT deu uma nova mobilidade a quem percorre o Centro. Veja mais sobre o VLT clicando em "bondes" no menu da barra lateral direita)

O artista no guindaste desenha o grafite enquanto no fundo, à esquerda, o operário no guindaste constrói os novos prédios de uma nova Zona Portuária

Uma área antes degradada pela Perimetral renasce (clique em Perimetral no menu lateral direito para ver o mostrengo que era a Perimetral)

O passeante contempla o painel Etnias do artista Kobra

Quem te viu (Perimetral), quem te vê (Porto Maravilha)

No bonito ex-depósito da Cibrazem surge o Aquário do Rio, preservando a fachada do antigo imóvel

Detalhe da fachada da antiga Cibrazem: Urso polar

Com a derrubada da Perimetral novos ângulos se descortinam, aqui do Morro da Saúde, com a igrejinha no meio e um condomínio à direita

Praça Mauá, novo point carioca

Do terraço do Museu de Arte descortinamos os contrastes arquitetônicos tão típicos de nossa cidade

Na exposição sobre a Princesa Leopoldina no MAR descubro que, ao chegar no Rio, ela desembarcou exatamente na Orla Conde como mostra esta gravura de Debret! Ao fundo o Mosteiro de São Bento.

Museu do Amanhã (veja mais clicando em "Museu do Amanhã" no menu da barra lateral direita). Fotos do editor do blog. Arte na abertura da postagem obtida no Facebook do Porto Maravilha.

1.7.16

ARTE NA LADEIRA DO CASTRO, SANTA TERESA

Por mais tempo que você viva em uma metrópole (vivo no Rio há 65 anos, desde meu nascimento), por mais que percorra seus meandros, você sempre descobre algo novo, surpreendente. Foi o que me aconteceu ontem (25/6). Morei uma década no bairro alto de Santa Teresa, a cavaleiro da cidade. Gostava de explorar as várias descidas para diferentes partes da cidade: para a Lapa, Catete, Glória, Laranjeiras, Catumbi, Rio Comprido, Centro. Ontem fui fazer o passeio guiado do professor Milton Teixeira, de quem sou fã (veja aqui a programação de seus passeios guiados gratuitos), por Santa Teresa. Chegando ao Largo dos Guimarães (alusão, como explicou o prof. Milton, a Joaquim Fonseca Guimarães, dono da chácara cujo loteamento iniciou a ocupação do bairro, em meados dos oitocentos, que veio a se adensar quando se descobriu, mais à frente, que a febre amarela não chegava àquelas alturas) deu-me na veneta separar-me do grupo e explorar a Ladeira do Castro, que leva à Rua do Riachuelo, no Centro, e que eu, em meus mais ou menos dez anos de bairro, nunca havia descido. E o que lá encontro? Uma galeria de arte a céu aberto! Eis uma amostra fotográfica do que vi e uma matéria que garimpei no acervo eletrônico de O Globo.


Painel "Guerra de Egos" de Cazé (parte) nas paredes de uma farmácia no início da Ladeira do Castro

Grafites ladeira acima

Grafites ladeira acima

Grafites ladeira acima

GRAFITE LADEIRA ACIMA, matéria de EMILIANO URBIM (emilianourbim@oglobo.com.br) publicada na Revista O Globo de 21/2/2016

Uma ruazinha estreita, íntreme e sinuosa, daquelas que só o GPS é capaz de salvar do anonimato entre o emaranhado de vias que ligam a Lapa a Santa Teresa. Assim é a Ladeira do Castro – até que, em 16 de novembro de 2015, uma intervenção urbana começou a cobrir seus muros de grafite e a colocou no circuito de arte de rua da cidade.

O idealizador do projeto, chamado simplesmente de Ladeira do Castro, é o artista plástico Fernando Sawaya, conhecido como Cazé. Desde o ano passado, ele e a produtora cultural Luciana Vasconcellos agilizaram a vinda de mais de 30 artistas, incluindo coletivos, para realizar murais na ladeira que começa na Rua do Riachuelo e segue até o Largo dos Guimarães, em pleno fervo de Santa Teresa.

– É um projeto cujo benefício é o diálogo urbano – diz Cazé. – Você revitaliza a rua, um espaço público, através da intervenção artística realizada nos muros das casas, um espaço privado.

Há quatro anos morando no Centro do Rio, Cazé já havia realizado alguns grafites na região quando descobriu os vários “muros virgens” que ladeiam os 800 metros da ladeira. Enxergando o potencial do espaço, ele começou a negociar com moradores e comerciantes a liberação dos espaços.

O primeiro grafite da galeria a céu aberto foi realizado nas paredes de uma farmácia na esquina da ladeira com a Rua Riachuelo: o painel “Guerra de egos”, em que Cazé pintou vários autorretratos envolvidos numa batalha. Desde então, o projeto ganhou apoio da FAC (Fábrica de Arte e Cidadania), ONG que tua na Lapa, e vários adeptos. Já pintaram por lá nomes como Memi, Tarm, Criz, Marcelo Eco, Aiog, Efixis, Cast, Snc, Franey Nogueira e o 8-bitch Project. Com a sessão de pintura do fim de semana passado, a primeira metade da subida está quase completa, faltando a superior.

– Convido os artistas e também sou requisitado por eles. Levo para visitarem o espaço, caminhamos juntos, definimos um muro. Os artistas bancam suas tintas e têm liberdade de expressão, podem pintar o que quiserem. O importante é que todos estejam engajados no projeto, com o objetivo comum de colorir, alegrar, intervir no espaço de forma positiva. [...]


Barbudinho do Cazé

Amor, de Ment

Sanfoneiro de Wallace Pato

Coração geométrico de Cristiano Preas

Mulher de Gil Faria

Ave de Tick

Arte de Tarm

"Autorretrato" do grafiteiro Pato

Rosto na fachada de uma casa

Palhaço de Franey Nogueira

Réptil

Arte de PNG

Carinhas de Cast

Paginário
Clique no label "Grafites cariocas" abaixo para ver outras postagens sobre grafites ou "Santa Teresa" para ver outras matérias sobre esse aprazível bairro carioca. Obrigado por visitar o blog e volte sempre.

20.6.16

VISITA AO MUSEU DO AMANHÃ


O Rio é rico em museus, alguns tradicionais, como o das Belas Artes e o Histórico Nacional, outros mais recentes (e, portanto, mais interativos) como o MAR e o ainda não inaugurado MIS. Mas o Museu do Amanhã é diferente de tudo. Primeiro, pelo projeto arrojado, futurista, pós-moderno do arquiteto espanhol Santiago Calatrava (embora os irreverentes de plantão digam que se assemelha a uma barata) que proporciona não só uma experiência estética para quem o contempla do lado de fora, mas também uma experiência espacial inusitada e surpreendente para quem o percorre por dentro. A exposição permanente pode ser descrita por termos como experiencial, sensorial, interativo, imersivo, audiovisual, multimídia, sensacional, em suma, um barato como diríamos nos anos sessenta. O filme amador acima dá uma ideia da experiência, mas deixe para ver depois de ter visitado o museu para não estragar a surpresa.

Explica a página do museu no site do Porto Maravilha: "A experiência promove o encontro entre ciência e arte, razão e emoção, linguagem e tecnologia, cultura e sociedade. Iniciativa da Prefeitura do Rio realizada com a Fundação Roberto Marinho, o museu já é ícone das transformações pelas quais a cidade vem passando." Nos fins de semana as filas são enormes (tipo Louvre), e nos seis primeiros meses de operação o museu já recebeu meio milhão de visitantes. Mas de terça a sexta é tranquilo. Funciona das dez às dezessete, com ingresso a 10 reais, meia para estudantes e jovens e gratuidade nas terças ou último domingo do mês, ou para estudantes ou professores da rede pública, ou ainda para sexagenários como eu ou ainda mais maduros. Está tudo explicadinho no site do museu. O museu faz parte de um grandioso projeto de revitalização da Zona Portuária e da orla do Centro da Cidade, como que criando uma nova cidade dentro da cidade já existente.

17.6.16

MORRO DO PINTO no SANTO CRISTO II

O MORRO DA JULES RIMET, CRÔNICA DE JOAQUIM FERREIRA DOS SANTOS PUBLICADA ORIGINALMENTE EM O GLOBO DE 30/6/2014. FOTOS DO MORRO DO PINTO TIRADAS EM 16 DE JUNHO DE 2016 PELO EDITOR DO BLOG.

Dizem — pode ser lenda urbana, pode ser a força de imaginação carioca —, dizem, na esquina das ruas Farnese e Mont’Alverne, que o morro é urbanizado assim porque Getúlio Vargas tinha uma amante na Rua Deolinda.

Torre da antiga fábrica Bhering aos pés do Morro do Pinto

A confirmar.

O Morro do Pinto é o da música do Geraldo Pereira, aquele em que o Escurinho — depois de ir ao Morro da Formiga procurar intriga, ir ao Morro do Macaco pra bater num bamba —, no final de seu périplo sincopado pelos morros do Rio, o Escurinho malemolente vai ao Morro do Pinto acabar com o samba.

Do Morro do Pinto dá para ver o Maracanã ao longe (centro esquerda, abaixo das bases dos morros). E os arranha-céus novos que  vão surgindo no Porto Maravilha

Pois eu, que não sou esse escurinho todo e quero mais que o samba peça passagem e vá em frente — eu tenho ido ao Morro do Pinto, no Cais do Porto, no intervalo de um jogo e outro da Copa. Vagueio sem rumo, na esperança de relaxar a hemoglobina e apascentar as hemácias, essas senhoras sanguíneas que me têm sido tão cruéis. Flano ao léu, zero o QI, os olhos cheios de uma cidade que poucos conhecem.

Travessa Sousa

Há quem enfrente a fila do bondinho do Corcovado para lá de cima observar a Zona Sul. Nada contra, mas quem ainda não colocou o cenário como pano de fundo num selfie do Instagram?

Eu tenho preferido entrar pela Rodoviária, pegar o Santo Cristo, subir a Rua Sara, atravessar a esquina com a Orestes, galgar a escadaria da Carlos Gomes, dobrar à direita na Rua do Pinto, entrar no Parque Machado de Assis e ficar lá de cima, embasbacado com o que vai embaixo — o avesso de um cartão postal que o mundo inteiro vem ver e a própria cidade desconhece. No canto esquerdo do olho, o prédio da Central; no direito, as antenas do Sumaré; no meio, 450 anos de história.

Coreto

O Morro do Pinto é um daqueles paraísos que o carioca desperdiça diariamente, preguiçoso de sair do seu quarteirão e descobrir que a cidade é maravilhosa não só por causa das curvas do Aterro, das curvas das garotas e das curvas das pedrinhas no calçadão. O Rio não entende o Rio, acha que isso aqui é só sal, sol e sul. Faz a curva no fim do calçadão do Leblon e volta para casa, crente que viu tudo o que interessa.

Igrejinha de Nossa Senhora de Montserrat, que os cariocas costumam ver de longe, da Av. Presidente Vargas, mas poucos sobem o morro para ver de perto

Eu lamento a falta de curiosidade do carioca ixperto, sempre nos mesmos engarrafamentos humanos e águas de coco, mas não perco tempo com isso. Sigo no caminho que mestre Jaguar ensinou, o de ir na contramão do turismo e das multidões, rumo ao âmago do lepo lepo, ao fundo do BIP-BIP, a Busca Insaciável do Prazer.

Troto ladeira acima do Morro do Pinto, vizinho do Morro da Conceição e da Providência, feliz como cabrito que foge do zoo congestionado das calçadas da Zona Sul. Passo pela esquina do bloco Pinto Sarado, cruzo com a arquiteta Bel Lobo, que tem um ateliê na fábrica da Bhering, e paro no hambúrguer do Omar, o Troisgros local.

Tranquilidade

Da varanda, cercado pelo canto dos galos, eu agora escorrego a vista por uma outra região da cidade, e varro as chaminés de São Cristóvão, os guindastes do cais do porto, as torres da Igreja da Penha e, nos dias mais claros, a unha rochosa do Dedo de Deus. Alguém na mesa ao lado conta a incrível história do bandido Zé Piroca, morador da Rua Sara, o soldado maluquete que um dia subiu o morro pilotando um tanque roubado do quartel da Quinta da Boa Vista.

Vista para a via férrea com a sombra do fotógrafo abaixo

Pode ser lenda urbana, mais uma conversa de bar, mas é disso também, de adoráveis assombrações, que se faz uma cidade. Fato indiscutível é que foi derrubada a casa do Seu Normando, na Rua Deolinda, onde, nos anos 70, Zeca Pagodinho e Beth Carvalho abriam a roda.

Velho bar

Os mais viajados vão achar que estão subindo as ladeiras da Alfama, o bairro de Lisboa — e há bandeiras de Portugal nas janelas, memória evidente de que antes de Getúlio, antes do Escurinho, o Morro do Pinto foi ocupado pelos portugueses no século XVIII. Eu, com menos milhagens, acho que estou de volta ao subúrbio, a uma foto do Malta ou a um maxixe do Sinhô. “Isso aqui é o melhor lugar do Rio para se criar marreco” — diz um morador, numa tradução ao carioquês de que ali há paz.

Chalé
Eu respondo com um “amém”, passo pelo coreto da Igreja de N.S. de Montserrat, peço contrito que tudo fique como está e mais adiante, ainda na Rua Mont’Alverne, dou um tempo no Bar do Carlinhos para ouvir o compositor local Carlos Gomes de Oliveira. Ele canta, de sua autoria, conforme atesta documento lavrado em cartório, o samba “Para pegar o caranguejo é preciso molhar a mão na lama”. Ao fundo, na gaiola, um papagaio parece gritar disparates contra a especulação imobiliária que, alimentada pelas obras do Porto Maravilha, começa a subir o Pinto.

O gato na moto

Para não dizer que fui ao morro e perdi a Copa, de um dos mirantes vê-se o Maracanã. E ainda conto mais sobre o grande torneio internacional que nos acomete: nos anos 1980, em uma das fundições da Rua Capiberibe, outro maluco do bairro, o Peralta, derreteu a Taça Jules Rimet, roubada com dois comparsas.

Casas com fachadas de azulejos tombadas pela Prefeitura na Rua Farnese

Não é uma história muito edificante em meio a tantas ladeiras gloriosas — mas este é o Morro do Pinto. A Taça do Mundo acaba aqui.

Sacada

OBRIGADO POR VISITAR MEU BLOG. Clique no label "Morro do Pinto" abaixo para ver outras postagens neste blog sobre esse aprazível morro da Zona Portuária carioca. E veja meu vídeo sobre a visita que fiz ao morro:


15.6.16

VIAGEM NO VLT CARIOCA (VEÍCULO LEVE SOBRE TRILHOS)


O Veículo Leve sobre Trilhos (VLT), quando estiver plenamente implantado, interligará todo o Centro e Zona Portuária carioca em aproximadamente 28 km de trilhos e duas linhas com um total de 26 paradas, integrando todos os demais modais, como metrô (Estação Cinelândia e outras), trem urbano (Central), ônibus interestaduais (Rodoviária), aviões (Aeroporto Santos Dumont), barcas (Praça XV), bonde de Santa Teresa (perto da Cinelândia) e o Teleférico da Providência. Quando fiz o filme amador acima (15 de junho de 2016) o VLT estava funcionando parcialmente da Parada dos Navios, na Zona Portuária, até o Aeroporto Santos Dumont, com bondes mais ou menos de meia em meia hora, mas quando estiver funcionando plenamente, 24 horas por dia, o sistema terá capacidade de transportar 300 mil passageiros diários. O VLT é a nova encarnação do bonde que por um século transportou os cariocas cidade afora, mas extinto nos anos sessenta (com a honrosa exceção de Santa Teresa) para ser substituído pelo mal-sucedido "trólei" (ônibus elétrico)   — é o "bondinho do futuro". Um legado das Olimpíadas (junto com os BRTs, o Porto Maravilha e a expansão do metrô) pelo qual está de parabéns nosso prefeito (independentemente de posições ideológicas, partidárias, etc.) Seja bem-vindo e boa viagem (e clique no label bondes abaixo para ver nossas outras postagens sobre esse simpático veículo tão associado à história carioca)!

5.6.16

DICA DE FILME: SÃO SEBASTIÃO DO RIO DE JANEIRO – A FORMAÇÃO DE UMA CIDADE


Vi hoje o filme SÃO SEBASTIÃO DO RIO DE JANEIRO - A FORMAÇÃO DE UMA CIDADE e eis minha impressão, que publiquei no ADORO CINEMA. Para quem é apaixonado pelo Rio de Janeiro, para quem se interessa  pela história da Cidade Maravilhosa ou tem curiosidade em conhecer, para quem é de fora e vai visitar o Rio, o filme é nota dez, bem pesquisado, com ótima iconografia (mapas, gravuras, etc.), ótima fotografia, ótimo texto, ótimo material de arquivo, ótimos depoimentos. Agora para quem não está interessado por nada disso... vale o bonequinho dormindo de O Globo. Uma grande safadeza desse jornal que prejudica a carreira comercial de um filme que tem, sim, muitas virtudes.

1.6.16

RIO DE JANEIRO EM 1584: CARTA DE FERNÃO CARDIM

Como teria sido a cidade de São Sebastião do Rio de Janeiro duas décadas após sua fundação? O jesuíta português Fernão Cardim, aqui esteve como secretário do visitador da companhia, de 1583 a 1598, retornando como provincial da companhia de 1604 a 1609, como lemos na Wikipedia. Em carta ao padre provincial de Portugal descreveu sua passagem pelo Rio de Janeiro, em dezembro de 1584. A carta encontra-se na obra Tratados da terra e gente do Brasil que pode ser acessada na Brasiliana Eletrônica. Os textos de Cardim fornecem uma visão privilegiada do Rio de Janeiro quinhentista, e os jesuítas se destacaram como protagonistas desse processo inicial de colonização. A seguir trecho da carta de Cardim.

Rio de Janeiro em 9/11/1599 em gravura de autor anônimo ilustrando a obra de Olivier van Noort Descrição da penosa viagem ao redor do mundo por Olivier van Noort). Foi o primeiro holandês a fazer uma viagem ao redor da terra, iniciada em 1598. Dos quatro navios iniciais, apenas um retornou, em 1601. A letra B no mapa mostra a cidade na época circunscrita ao Morro do Castelo e encosta. A letra D deve ser a fortaleza de Nossa Senhora da Guia, atual de Santa Cruz, e C deve ser o Pão de Açúcar, mal desenhado.

Do Espírito Santo partimos para o Rio de Janeiro, que dista ali 80 léguas. Dois ou três dias tivemos bom tempo, e logo nos deu um temporal tão forte, que foi necessário ficarmos árvore seca [mastreação de um navio com todos os panos ferrados] quase dois dias com muito perigo, por estarmos sobre uns baixos dos goitacazes mui perigosos [região de Campos dos Goytacazes], e não muito longe da costa. Ali estivemos a Deus misericórdia, e cada um se encomendava a Nossa Senhora quanto podia por vermos perto a morte. Deste perigo nos livrou Deus por sua bondade, e aos 20 de dezembro de 1584, véspera de São Tomé, arribamos ao Rio. Fomos recebidos do padre Ignacio Tolosa, reitor, e mais padres, e do Sr. Governador [Salvador Corrêa de Sá], que manco de um pé com os principais da terra veio à praia com muita alegria, e os da fortaleza também a mostraram com salva de sua artilharia. Neste colégio tivemos o Natal com um presépio muito devoto, que fazia esquecer os de Portugal; e também cá Nosso Senhor dá as mesmas consolações, e avantajadas. O irmão Barnabé Telo fez a lapa, e às noites nos alegrava com seu berimbau.

   Trouxemos no navio uma relíquia do glorioso Sebastião engastada em um braço de prata. Esta ficou no navio para a festejarem os moradores e estudantes como desejavam, por ser esta cidade do seu nome, e ser ele o padroeiro e protetor. Uma das oitavas à tarde se fez uma célebre festa. O Sr. governador com os mais portugueses fizeram em lustroso alardo de arcabuzaria, e assim juntos com seus tambores, pífaros e bandeiras foram à praia. O padre visitador com o mesmo governador e os principais da terra e alguns padres nos embarcamos numa grande barca bem embandeirada e enramada: nela se armou um altar e alcatifou a tolda com um pálio por cima; acudiram algumas vinte canoas bem esquipadas, algumas delas pintadas, outras empenadas, e os remos de várias cores. Entre elas vinha Martim Affonso [Arariboia], comendador de Cristo, índio antigo abaetê [homem bom e de palavra] e moçacára [amigo], sc. grande cavaleiro e valente, que ajudou muito os portugueses na tomada deste Rio. Houve no mar grande festa de escaramuça naval, tambores, pífaros e flautas, com grande grita e festa dos índios; e os portugueses da terra com sua arcabuzaria e também os da fortaleza dispararam algumas peças de artilharia grossa e com esta festa andamos barlaventeando um pouco à vela, e a santa relíquia ia no altar dentro de uma rica carola com grande aparato de velas acesas e música de canto de órgão, etc. Desembarcando viemos em procissão até a Misericórdia, que está junto da praia, com a relíquia debaixo do pálio; as varas levaram os da câmara, cidadãos principais, antigos e conquistadores daquela terra. Estava um teatro à porta da Misericórdia com uma tolda de uma vela, e a santa relíquia se pôs sobre um rico altar em quanto se representou um devoto diálogo do martírio do santo, com choros e várias figuras muito ricamente vestidas; foi asseteado [martirizado] um moço atado a um pau: causou este espetáculo muitas lágrimas de devoção e alegria a toda a cidade por representar ao vivo o martírio do santo, nem faltou mulher que não viesse à festa; por onde acabado o diálogo, por a nossa igreja ser pequena lhes preguei no mesmo teatro dos milagres e mercês, que tinham recebido deste glorioso mártir na tomada deste rio, a qual acabada deu o padre visitador beijar a relíquia a todo o povo e depois continuamos com a procissão e danças até nossa igreja: era para ver uma dança de meninos índios, o mais velho seria de oito anos, todos nuzinhos, pintados de certas cores aprazíveis, com seus cascavéis [guizos] nos pés, e braços, pernas, cinta, e cabeças com várias invenções de diademas de penas, colares e braceletes. Parece-me que se os viram nesse reino, que andaram todo o dia atrás deles; foi a mais aprazível dança que destes meninos cá vi. Chegados à igreja foi a santa relíquia colocada no sacrário para consolação dos moradores, que assim o pediram.

   Têm os padres duas aldeias de índios, uma delas de São Lourenço [na atual Niterói], um légua da cidade por mar; e a outra de São Barnabé [nas vizinhanças do rio Macacu], sete léguas também por mar, terão ambas três mil índios cristãos. Foi o padre visitador à de São Lourenço, aonde residem os padres, e dia dos Reis lhes disse missa cantada oficiada pelos índios com canto de órgão com suas flautas; casou alguns em lei de graça, e deu a comunhão a outros poucos. Eu batizei dois adultos somente, por os mais serem todos cristãos.

Esta capitania do Rio dista da Equinocial 23 graus para o Sul, e da Bahia 130 léguas. É muito sadia, de muitos bons ares e águas. No verão tem boas calmas [calores] algumas vezes, e no inverno mui bons frios; mas em geral é temperada. O inverno se parece com a primavera de Portugal: tem uns dias formosíssimos tão aprazíveis e salutíferos [salutares] que parece estão os corpos bebendo vida. E' terra mui fragosa [em que há muitas fragas, rochas escarpadas] e muito mais que a serra da Estrela; tudo são serrarias e rochedos espantosos, e tem alguns penedos tão altos que com três tiros de flecha não chega um homem ao chão e ficam todas as flechas pregadas na pedra por causa da grande altura; destas serras descem muitos rios caudais que de quatro e sete léguas se veem alvejar por entre matos que se vão às nuvens, e do pé de algumas destas serras até riba há uma grande jornada; são todas estas serras cheias de muitas e grandes madeiras de cedros, de que se fazem canoas tão largas de um só pau, que cabe uma pipa atravessada; e de comprimento que levam dez, doze remeiros por banda e carregam cem quintais de qualquer cousa, e outras muito mais. Há muitos paus de sândalos brancos, aquilo e noz-moscada e outros paus reais muito para ver. Agora se descobriu um pau que tinge de amarelo [tatajuba, árvore da família das urticáceas], como o brasil [pau-brasil] vermelho; é pau de preço; é abundante de gados, porcos e outras criações; dão-se nela marmelos, figos, romeiras, e também trigo se o semeiam; a um grão respondem 800 e mais e cada grão dá 50 e 60 espigas, das quais umas estão maduras, outras verdes, outras nascem; também se dão rosas, cravos vermelhos, cebolas-cecéns, árvores de espinho, todo gênero de hortaliça de Portugal; as canas também se dão bem, e tem três engenhos de açúcar, enfim é terra mui farta.

   A cidade está situada em um monte de boa vista para o mar [Morro do Castelo], e dentro da barra tem uma baía que bem parece que a pintou o supremo pintor e arquiteto do mundo, Deus Nosso Senhor, e assim é cousa formosíssima e a mais aprazível que há em todo o Brasil, nem lhe chega a vista do Mondego e Tejo: é tão capaz que terá 20 léguas em roda cheia pelo meio de muitas ilhas frescas de grandes arvoredos, e não impedem a vista umas às outras, que é o que lhe dá graça. Tem a barra meia légua da cidade, e no meio dela um lagoa de 60 braças em comprido, e bem larga que a divide pelo meio, e por ambas as partes tem canal bastante para naus da Índia; nesta lags [Lagea Rattier, Ilha da Laje] manda el-rei fazer a fortaleza, e ficará cousa inexpugnável, nem se lhe poderá esconder um barco; a cidade tem 150 vizinhos com seu vigário, e muita escravaria da terra.

   Os padres têm aqui o melhor sítio da cidade [o colégio dos jesuítas no morro do Castelo, terceiro colégio do Brasil, fundado pelo padre Manuel da Nobrega em 1567]. Têm grande vista com toda esta enseada defronte das janelas: têm começado o edifício novo, e têm já 13 cubículos de pedra e cal que não dão vantagem aos de Coimbra, antes lha levam na boa vista. São forrados de cedro, a igreja é pequena, de taipa velha. Agora se começa a nova de pedra e cal [Igreja de Santo Inácio], todavia tem bons ornamentos com uma custódia de prata dourada para as endoenças, uma cabeça das Onze Mil Virgens, o braço de São Sebastião com outras relíquias, uma imagem da Senhora de São Lucas. A cerca é cousa formosa; tem muito mais laranjeiras que as duas cercas de Évora, com um tanque e fonte; mas não se bebe dela por a água ser salobra; muitos marmeleiros, romeiras, limeiras, limoeiros e outras frutas da terra. Também tem uma vinha que dá boas uvas, os melões se dão no refeitório quase meio ano, e são finos, nem faltam couves mercianas bem duras, alfaces, rabões e outros gêneros de hortaliça de Portugal em abundância: o refeitório é bem provido do necessário; a vaca na bondade e gordura se parece com a de Entre-Douro e Minho; o pescado é vário e muito, são para ver as pescarias da sexta-feira, e quando se compra vai o arrátel [unidade de medida] a quatro réis, e se é peixe sem escama a real e meio, e com um tostão se farta toda a casa, e residem nela de ordinário 28 padres e irmãos afora a gente, que é muita, e para todos há. Duvidava eu qual era melhor provido, se o refeitório de Coimbra se este, e não me sei determinar: quanto ao espiritual se parece na observância bom concerto e ordem com qualquer dos bem ordenados de Portugal; e estes padres velhos são a mesma edificação e desprezo do mundo, e esta fruta colheram cá por estes matos sem prática nem conferências, e são um espelho de toda virtude, e muito temos os que de lá viemos para andar, se havemos de chegar a tanta perfeição da sólida e verdadeira virtude da Companhia.

   Nas oitavas do Natal ouviu o padre visitador as confissões gerais, e renovaram-se os votos dia de Jesus, e aquele dia preguei em nossa igreja, houve muitas confissões e comunhões por causa da festa e jubileu.