Tinha a pele amarelada, os dentes miúdos, os olhos como dois pequenos caroços nas órbitas fundas. Talvez fosse apelidado de Quebradinho por causa das pernas. Como dois cambitos, tinham dificuldade em sustentar o corpo magro com aquela barriga grande, pesada. Quando andava, as pernas pareciam que podiam quebrar a qualquer instante, uma corrida, até mesmo pequena, era impossível para ele. Suas pernas mal aguentavam andar quanto mais correr.
Ninguém queria que ele jogasse no time dos meninos lá da rua. Nem para ficar na banheira, na ponta-esquerda, nem para isso servia, era um inútil como jogador de futebol em qualquer posição. Insistia em querer jogar em um dos times formados pelos meninos lá da rua. Achava-se graça do seu pedido e da sua insistência. Não era aceito nem como juiz.
Era filho adotivo de um abastado fazendeiro e comerciante próspero, com lojas de artigos para campo e cidade instaladas na avenida do comércio. Como o fazendeiro e comerciante não tinha filhos, ele recebia do pai adotivo um tratamento especial. Não lhe faltava dinheiro para guloseimas, comprar gibi e guri, comparecer quantos vezes quisesse para se divertir à vontade no parque ou em algum circo que havia chegado à cidade.
Disse um dia, vocês me pagam, ainda vou ser o dono de um time porreta, uniformizado com calção e camisa com numeração atrás nas costas. Esse time seria chamado de Expressinho do Vasco. Não demorou de cumprir o que apregoara. Apareceu no campinho da Praça Camacã, nas imediações do rio Cachoeira, anunciando que havia comprado o jogo de calção e camisa do Vasco da Gama e uma bola de couro novinha. Acrescentou que queria que o maior número de meninos bons de bola estivesse presente ao campinho da Praça Camacã no sábado quando iria escolher os onze jogadores e mais quatro reservas para compor o Expressinho do Vasco.
No sábado, os jogadores escolhidos por ele para compor o elenco do Expressinho do Vasco da Gama ouviram assustados o que ele afirmara sério. Quebradinho comunicou que entraria para jogar as partidas como centroavante, aos 30 minutos do segundo tempo, estivesse ganhando ou perdendo o Expressinho do Vasco. Ninguém contestou. Afinal, ele era o dono da bola de couro e do jogo de calção e camisa do Vasco da Gama. E qual o menino que não queria jogar num time de futebol que usasse calção e camisa numerada nas costas, como se estivesse atuando num time verdadeiro de futebol?
A partida contra o Bangu valeu taça, melhor dizendo, Taça Rio Cachoeira. O Expressinho do Vasco da Gama venceu o Bangu por um a zero, depois de uma partida acirrada até os quarenta e quatro minutos do segundo tempo. No último minuto o gol salvador. Gol de quem? De Quebradinho, a bola chutada da linha de fundo pelo ponta-direito Magrelo raspou na sua barriga e entrou. Foi a sua consagração. Quem poderia imaginar aquele gol incrível por um jogador que mal conseguia andar?
Nenhum comentário:
Postar um comentário