ENSEADA DE BOTAFOGO

ENSEADA DE BOTAFOGO
"Andar pelo Rio, seja com chuva ou sol abrasador, é sempre um prazer. Observar os recantos quase que escondidos é uma experiência indescritível, principalmente se tratando de uma grande cidade. Conheço várias do Brasil, mas nenhuma tem tanta beleza e tantos segredos a se revelarem a cada esquina com tanta história pra contar através da poesia das ruas!" (Charles Stone)

VISTA DO TERRAÇO ITÁLIA

VISTA DO TERRAÇO ITÁLIA
São Paulo, até 1910 era uma província tocada a burros. Os barões do café tinham seus casarões e o resto era pouco mais que uma grande vila. Em pouco mais de 100 anos passou a ser a maior cidade da América Latina e uma das maiores do mundo. É pouco tempo. O século XX, para São Paulo, foi o mais veloz e o mais audaz.” (Jane Darckê Avelar)

27.4.09

BONDINHO DE SANTA TERESA



Santa Teresa precisa dos bondes, da alegria dos bondes. Os passageiros gostam de sentar nos seus bancos, vivenciar a paisagem do bairro, o vento gostoso. Tempos e espaços se aliam nesse passeio. [...]

A cidade do Rio de Janeiro não utiliza mais o bonde. Os carros, os ônibus, a pressa o expulsaram. Em Santa Teresa, o bonde permaneceu, porque a curvas, as ruas estreitas o pedem. Os moradores precisam dele, do seu ruído. "É muito bom isto aqui. Eu fico com as minhas telas, ouvindo o passarinho cantando, lá longe um latido, e aí vem o barulho do bonde", disse-me Regina Toledo Piza, que tem seu ateliê em Santa Teresa.

O barulho do bonde, a presença do bonde. O bonde é a maior referência de Santa Teresa. O tempo passa, as coisas se transformam, mas o bonde tem de permanecer. [...] Se tirarem o bonde, Santa Teresa sucumbe. Morre um pedaço do Rio de Janeiro.
(Texto extraído do livro de Lilian Fontes, Santa Teresa - um livro maravilhoso para se familiarizar com o clima desse aprazível bairro carioca.)

O bonde na estação

Os Arcos da Lapa

Trilho do bonde sobre os Arcos

Bondinho sobre os Arcos

Dentro do bondinho

A vista de cima dos Arcos

Bondinho em Santa Teresa

Idem

Uma das várias casas em estilo eclético que você vê do bondinho na Rua Joaquim Murtinho

De volta à estação; ao fundo, a Catedral

CRÔNICA DE MACHADO DE ASSIS SOBRE A INAUGURAÇÃO DOS BONDES DE SANTA TERESA (15 de março de 1877)

Inauguraram-se os bonds [bondes, palavra originária do inglês bond] de Santa Teresa, — um sistema de alcatruzes ou de escada de Jacó [escada bíblica que levava ao céu], — uma imagem das coisas deste mundo. Quando um bond sobe, outro desce, não há tempo em caminho para uma pitada de rapé, quando muito, podem dois sujeitos fazer uma barretada [saudação que consiste em tirar da cabeça o barrete].
O pior é se um dia, naquele subir e descer, descer e subir, subirem uns para o céu e outros descerem ao purgatório, ou quando menos ao necrotério.
Escusado é dizer que as diligências viram esta inauguração com um olhar extremamente melancólico.
Alguns burros, afeitos à subida e descida do outeiro, estavam ontem lastimando este novo passo do progresso. Um deles, filósofo, humanitário e ambicioso, murmurava:

— Dizem: les dieux s'en vont [os deuses vão-se embora]. Que ironia! Não; não são os deuses somos nós. Les ânes s'en vont [os asnos vão-se embora], meus colegas, les ânes s'en vont.

E esse interessante quadrúpede olhava para o bond com um olhar cheio de saudade e humilhação. Talvez rememorava a queda lenta do burro, expelido de toda a parte pelo vapor, como o vapor o há de ser pelo balão, e o balão pela eletricidade, a eletricidade por uma força nova, que levará de vez este grande trem do mundo ate à estação terminal.
O que assim não seja... por ora.
Mas inauguraram-se os bonds. Agora é que Santa Teresa vai ficar à moda. O que havia pior, enfadonho a mais não ser, eram as viagens de diligência, nome irônico de todos os veículos desse gênero. A diligência é um meio-termo entre a tartaruga e o boi.
Uma das vantagens dos bonds de Santa Teresa sobre os seus congêneresda cidade, é a impossibilidade da pescaria. A pescaria é a chaga dos outros bonds. Assim, entre o Largo do Machado e a Glória a pescaria é uma verdadeira amolação, cada bond desce a passo lento, a olhar para um e outro lado, a catar um passageiro ao longe. As vezes o passageiro aponta na Praia do Flamengo, o bond, polido e generoso, suspende passo, cochila, toma uma pitada, dá dois dedos de conversa, apanha o passageiro, e segue o fadário até a seguinte esquina onde repete a mesma lengalenga.
Nada disso em Santa Teresa: ali o bond é um verdadeiro leva-e-traz, não se detém a brincar no caminho, como um estudante vadio.
E se depois do que fica dito, não houver uma alma caridosa que diga que eu tenho em Santa Teresa uma casa para alugar — palavra de honra! o mundo está virado.


Na estação, aguardando os passageiros

Idem

Fotos do editor do blog. A estação do bonde para Santa Teresa fica na Rua Lélio Gama, ruela que liga a Senador Dantas (perto da Cinelândia) ao Largo da Carioca. Mais informações sobre o bonde no site da Riotur. Clique no marcador "Santa Teresa" abaixo para ver outras postagens sobre esse aprazível bairro.

PS. Recente acidente (agosto de 2011) com várias vítimas, algumas fatais, o pior da história centenária do bondinho, supostamente devido à manutenção deficiente do sistema, tirou um pouco do encanto desse ícone de Santa Teresa. A circulação foi interrompida, o sistema vem sendo totalmente remodelado, e os bondinhos entraram em pré-operação num trecho inicial da Carioca ao Curvelo, em 27/7/2015, como mostra o vídeo abaixo e a postagem A Volta do Bondinho de Santa Teresa neste blog. O sistema integral, até o Silvestre, estará totalmente implantado em 2017.

24.4.09

RIO ANTIGO

Museu da Imagem e do Som visto da Ladeira da Misericórdia (que dava acesso ao Morro do Castelo)

Chegando ao Rio, vi ainda o convento da Ajuda [situado na atual Cinelândia e demolido em 1911; o chafariz da Praça General Osório, Ipanema, pertencia ao convento], de onde partiam cantos místicos; a igreja que forçava a rua larga de São Joaquim [atual Rua Marechal Floriano] a tornar-se rua estreita; os banhistas da praia de Santa Luzia [a praia de Santa Luzia ligava a Praia da Lapa à Ponta do Calabouço, onde se situa o Museu Histórico Nacional; a Igreja de Santa Luzia, na Avenida Presidente Antônio Carlos, pertinho da ABL, e a Santa Casa da Misericórdia ficavam à beira-mar!], adestrados pelo grande nadador Abraão Saliture; o teatrinho do Passeio Público, com seus cantores e transformistas e um garção que era perfeito sósia do barão do Rio Branco; o Mercado Velho [em frente à Rua do Mercado, que dá para a Praça XV, o primeiro verdadeiro mercado do Rio, onde estão agora um edifício do Ministério da Agricultura e o Entreposto do Peixe], que fartava os gulosos na carne vegetal das talhadas de abacaxis; a Chácara da Floresta [no antigo Morro do Castelo, demolido entre 1922 e 1930], um pedaço de subúrbio no centro da cidade; a sobrecasaca do poeta Múcio Teixeira; a opa rubra do irmão das almas; a muleta do panfletário Deocleciano Mártir, que classificava a febre amarela de patriótica, por liquidar tantos portugueses; a cartolinha cinzenta do cronista João do Rio; [...] as vacas leiteiras conduzidas em plena rua e mungidas à porta do freguês; as carrocinhas de sorvetes em forma de navio, a navegar em seco; [...] o chafariz da Carioca [o Aqueduto da Carioca, em estilo romano, hoje conhecido como os Arcos da Lapa, trazia a água do Rio Carioca até o chafariz], que distribuía Nossa Irmã a Água, franciscanamente, por milhares de sequiosos; os moleques baleiros, muito ágeis ao saltar no estribo dos bondes em marcha e impecáveis ao desfiar o seu pregão: "Balas de ovo, alteia, lima e rosa, ó nenê!"; o acendedor de lampiões, a quem os garotos apelidavam profeta; a caixa de doces que vendedores ambulantes transportavam à cabeça; os tabuleiros de baianas que depois passariam a ser baianas apenas de indumentária; os casais fora da lei civil ou religiosa, afeitos a rumar para o hotel Locomotora; a cara amarrada do carnavalesco Morcego, funcionário postal; o cortiço de que meu pai saiu tantas manhãs, levando-me ao colo para que o barão do Lavradio, pediatra da Santa Casa da Misericórdia, me curasse da coqueluche. (Texto extraído do livro de memórias de Agripino Grieco.)


Largo de São Francisco da Prainha, na Saúde

Pátio dos Canhões (Museu Histórico Nacional)


Fotos do Rio de antigamente:

As fotos desta postagem, embora mostrem aspectos do Rio Antigo, são recentes, tiradas pelo editor do blog. Veja onde encontrar fotos antigas do Rio:

Instituto Moreira Salles

Uma lista de páginas com fotos do Rio Antigo também pode ser encontrada na comunidade Rio Antigo do Facebook.

Pinturas atuais tendo por tema o Rio Antigo podem ser encontradas no site do pintor Eduardo Camões.

Agradeço ao amigo Erik Steger por ter colaborado na pesquisa dos sites.


Cores da Lapa

Igreja de N.S. da Glória

Livros sobre o Rio Antigo:

João do Rio, A alma encantadora das ruas. Pode ser baixado em versão PDF no site Domínio Público. Existe também uma edição recente pela Companhia das Letras.

Brasil Gerson, História das ruas do Rio. Clássico da historiografia carioca, em edição revista e ampliada (depois da morte do autor) por Alexei Bueno.

Coleção Cantos do Rio da Editora Relume-Dumará. Pequenos livros abordando os bairros do Rio. Recomendo especialmente Gamboa, de Alexei Bueno, Santa Teresa, de Lilian Fontes, Lagoa, de Carlos Heitor Cony, Botafogo, de Cláudio Henrique, São Cristóvão, de Helio Brasil (livro belíssimo!), e Centro, de Antônio Torres.

A Livraria Folha Seca, à Rua do Ouvidor, 37 - Centro possui uma excelente seção de livros sobre o Rio de Janeiro antigo e moderno. Idem a Livraria Pereira Passos, na Rua Gago Coutinho, 52, perto do Largo do Machado. Nos sebos da Praça Tiradentes e Avenida Passos também é possível encontrar livros sobre a cidade.



Encosta do Morro da Conceição

Rua do Mercado

Como conhecer o Rio Antigo:

Caso queira conhecer especificamente o Morro da Conceição, você pode fazer uma visita guiada com o pintor Paulo Dallier, que tem ateliê no morro. O telefone é (21) 2263.4663 e o e-mail é dallier@oi.com.br

Outra boa pedida são os Roteiros Geográficos do Instituto de Geografia da UERJ, que incluem o imperdível Roteiro Noturno no Centro do Rio A Pé além de outros passeios. Para ver a programação dos passeios (noturnos e também diurnos) visite o blog dos Roteiros Geográficos.

No nosso GUIA DO RIO no cabeçalho deste blog temos algumas sugestões de passeios pelo Rio Antigo que você pode fazer: Morro da Conceição, Mosteiro de São Bento, Passeio pelo Centro Carioca, Igreja da Glória.

Janela do ateliê do pintor Dallier no Morro da Conceição

Travessa do Comércio

Ver o seu blog é também rever o Rio antigo que conheci em parte, antes da abertura da Av. Presidente Vargas. Morei por pouco tempo, no início de 1943, na Rua São Pedro, 61, bem atrás da Igreja da Candelária. Assisti a toda a demolição para a construção da grande avenida, vi cortarem um pedaço do Campo de Santana, que ia até quase ao meio da nova artéria, etc. Assisti à demolição do Hotel Avenida, e do Pálace Hotel, ambos na Av. Rio Branco, ex-Avenida Central. Conheci O Globo no primeiro andar, sobre uma livraria, onde hoje estão a Caixa Econômica e a estação Carioca do Metrô. Ali também estavam dois cinemas, um em cada lado da Av. Rio Branco, onde vi nesse mesmo ano tantos grandes filmes a preço irrisório. Um se chamava Eldorado, o outro Parisiense. E não esqueço o Hidrolitol, um envelope com um sal dissolvido em água borbulhante, no ponto de bondes próximo à Escola Nacional de Música. 

Ainda na Lapa, eu ia ao cinema Colonial, depois transformado em Sala Cecília Meireles. No apartamento de Manuel Bandeira, na Av. Beira-Mar, vi um desenho do poeta sobre o mar ali tão próximo, e pouco depois vi a grande cobertura de areia aspirada do fundo do mar e da terra trazida do morro de Santo Antônio para formar o que se chamaria o aterro do Flamengo. Vi o incêndio do Park Royal, ao lado da Igreja de São Francisco, dando para o largo do mesmo nome, e tendo ao lado a então estreitíssima Rua Ramalho Ortigão, e a Casa Cruz, cuja fachada foi arrebentada pela parede do Park Royal. Estudante, morei também numa pensão na Rua da Alfândega, onde não havia uma só casa comercial e sim residências e no térreo depósitos de mercadorias. O que mais vi? Vi o mar, que não conhecia, tão junto do asfalto, a praia do Flamengo apenas uma nesga de areia. Tudo vi e com tudo me maravilhei, ou me espantei. A demolição de quase todos os prédios da Av. Rio Branco, o do Jornal do Brasil principalmente, e o do "Ferro de Engomar", hoje com o mesmo formato na planta mas com não sei quantos andares. Perdoe-me esse acesso de lembranças. Leie e apague. São recordações que só a mim dizem respeito. (Depoimento de Waldir Ribeiro do Val)

Feira Rio Antigo na Rua do Lavradio no primeiro sábado de cada mês


Morro da Conceição

Folhetos sobre o Rio:

A Riotur fornece gratuitamente a turistas e cariocas mapas e folhetos sobre o Rio de Janeiro nestes locais:
- Quiosque na praia, na altura da Rua Hilário de Gouveia - 7h às 22h
- Centros de Atendimento ao Turista: Av. Princesa Isabel, 183 - Seg a Sáb, 9h às 20h | Dom, 9h às 5h. Rua da Candelária, 6 - Seg a Sex, 8h30 as 5h30 | Sáb 8h30 as 15h30


Sacada de serralheria na Glória, subida para Santa Teresa

Igreja de Nossa Senhora do Carmo da Lapa

Convento do Carmo

23.4.09

ANIVERSÁRIO DE PIXINGUINHA

TEXTO DE CYRO DE MATTOS


Filho de uma família musical, Alfredo da Rocha Viana Filho nasceu no Rio de Janeiro, em 23 de abril de 1897. Teve treze irmãos. O apelido Pixinguinha veio da junção de dois outros apelidos: “Pizindim”, apelido colocado pela avó Edwirges, que era africana, e “Bexiguinha”, herdado ao contrair varíola (bexiga), epidemia que deixou marcas em seu rosto.

A história da nossa música popular e do rádio confunde-se com a vida desse maravilhoso flautista, saxofonista, compositor, arranjador e regente. Choros, canções regionais, desafios sertanejos, maxixes, lundus, corta-jacas, batuques, cateretês, entre outras modalidades musicais, receberam o acento, o hálito, o sopro, a marca magistral do primeiro arranjador que a música popular brasileira teve, com “O Teu Cabelo Não Nega”, de Lamartine e os Irmãos Valença, e “Taí”, de Joubert de Carvalho.

Aos 12 anos começou a acompanhar seu pai, flautista, em festas, tocando cavaquinho. Aos treze fazia a primeira composição, “Lata de Leite”, inspirada nos chorões boêmios, músicos que de madrugada encerravam suas atividades e, voltando para casa, bebiam o leite deixado na porta das residências. De suas primeiras composições destacam-se ainda “Rosa” e “Sofre Porque Queres”.

Esse filho de Ogun, de fama internacional, fundiu a sua formação clássica, de base européia, com ritmos nossos, de raízes negras, além de incorporar a música negra norte-americana, formando assim um estilo em que sobressai o toque especial do sentimento brasileiro de nossa música popular. Diante de sua música, que mexe com a alma e traz um jeito tão nosso, não há quem não sinta o orgulho de ser brasileiro.

São tantas as composições marcantes realizadas por esse mestre de nossa música popular, entre tantos mestres, que é difícil destacar algumas dessas jóias. Cito aqui algumas do meu gosto: “Carinhoso”, “Gavião Calçudo” , “Chorei”, “Um a Zero” e “Vou Vivendo”. Mas há quem prefira “Mundo Melhor”, “Segure Ele” e “Sofres Porque Queres”. E ainda quem não abra mão de “A Vida É um Buraco”, “Naquele Tempo” e “Rosa”.

Estátua de Pixinguinha na Travessa do Ouvidor, Centro do Rio


Se música é pensar e sentir a vida através de sons, em Pixiguinha temos o exemplo primoroso de como não se pode viver sem ela. Esse poeta da nossa música popular tinha a alma de passarinho, que gostava de soltar da flauta pingos de ouro, de dia e de noite. Dos lamentos de seu saxofone lograva extrair sentimentos puros, fundos, pungentes choros, emoção numa coisa só música afinada, que traz também o riso,.além de fazer que famosos compositores, letristas e músicos de hoje se curvem diante dela.

Ele pensava, sentia e respirava música. Foi na terceira complicação cardíaca, nos idos de 1964, que ele ficou internado por mais de um mês. Foi proibido pelo médico de certas comidas pesadas, bebida e de tocar saxofone. Tempo depois, quando teve autorização para voltar a tocar saxofone, chorou. Escreveu vinte músicas durante o tempo que esteve internado,, cada uma delas se relacionando com os momentos que teve no hospital. Por exemplo, “Manda Brasa”, expressão que ouviu quando ia almoçar, e “Vou pra Casa”, escreveu no quarto, ao receber alta.

Pixinguinha morreu dentro de uma igreja, em Ipanema, no Rio de Janeiro, em 17 de fevereiro de 1973. Tinha ido batizar o filho de um amigo, depois de adiar por várias vezes o batismo por motivo de complicações no estado de saúde. É possível que não tenha resistido à emoção de ser padrinho do filho do amigo na hora do batismo quando então caiu fulminado por um enfarte. O pessoal da Banda de Ipanema, que saía pelas ruas em época de Carnaval, ao tomar conhecimento de sua morte, passou na porta da igreja onde o corpo de Pixinguinha estava sendo velado lá dentro. E naquele instante tocou como nunca o samba que homenageava o mestre. Os foliões cantavam num clima de alegria e tristeza o refrão: “Ô, lê, lê, ô,lá, lá, pega no ganzê, pega no ganzá...”

Um motorista, ao ouvir pelo rádio do carro a notícia da morte de Pixinguinha, disse para o passageiro:
- Esse homem tinha um coração tão bom que Deus quis que ele morresse dentro de uma igreja.


Painel a óleo em frente à estátua de Pixinguinha. O painel mostra um encontro hipotético entre bambas da nossa música (Nelson Sargento, Paulo Moura, Braguinha, Noel Rosa e outros) na Wiskeria Gouveia, o "Escritório do Pixinguinha".

12.4.09

ILHA DO GOVERNADOR

Texto do editor do blog com colaboração de Vitor Scalercio. Fotos do editor do blog (IK) e de Vitor Scalercio (VS).

Vista da entrada da Baía da Guanabara (IK).

Vista do Iate Clube Jardim Guanabara (VS).

O Rio é gigantesco, e por mais que você rode pela cidade, há sempre lugares novos para conhecer. Por exemplo, você conhece a Ilha do Governador? (As entranhas da Ilha, não apenas a estrada até o aeroporto.) Pois eu também só conhecia a Ilha en passant. Até que recebi do Vitor um e-mail onde ele dizia:

Vista do Jardim Guanabara (observe o Pão de Açúcar ao fundo) (VS).

Jardim Guanabara: a Ilha livrou-se da "verticalização", o gabarito lá é uniforme, máximo de três andares (VS).

Sou carioca e eterno apaixonado pela cidade do Rio de Janeiro. E não me canso, cada dia descubro lugares novos, cantinhos desconhecidos, novas impressões, um novo olhar, uma outra perspectiva. [...] O Rio é único, não há nenhum outro lugar no mundo que reúna todas essas características peculiares, elas são singulares! A cidade tem vida, uma identidade, tem uma 'alma'! [...] E o carioca é um dos trunfos desta cidade, eu diria.

E um dos motivos que escrevo é falar sobre uma outra grande paixão que também faz parte do Rio de Janeiro. Tem uma história própria, também é singular, é uma outra cidade dentro da metrópole. É a minha Ilha do Governador. [...] Não sei se você conhece seus bairros, suas características, sua vida, sua história. Bom, aqui deixo meu convite. [...] Tenho certeza que você se encantará e verá mais uma peça que faz parte deste lindo mosaico que é a nossa cidade.


Da Ilha você contempla um panorama singular do relevo carioca, as montanhas ao longe... (VS)

Rua Agostinho dos Santos: as casas ficam expostas, sem muros altíssimos nem grades de prisão (IK).

Aceitei o gentil convite do Vitor e... tornei-me um fã da Ilha! A Ilha livrou-se de um fenômeno chamado "verticalização": o gabarito lá é uniforme, máximo de três andares. Cheia de colinas, as ruas são sinuosas, seguindo as curvas de nível. Dentro da Ilha o trânsito sempre flui razoavelmente (você não fica retido no trânsito por uma eternidade), e existe a opção da barca. Muitos bairros da Ilha são seguros: as casas ficam expostas, sem muros altíssimos nem grades de prisão (veja as fotos). O calor do verão lá é atenuado pela brisa que sempre sopra do mar. A Ilha é um Rio de Zona Norte com nível de vida de Zona Sul: o bairro de Jardim Guanabara ostenta o terceiro maior IDH (índice de desenvolvimento humano) da cidade, superado apenas pela Gávea e Leblon. A Ilha está cheia de praias bucólicas como em Paquetá (é verdade que as águas da Baía estão poluídas, mas quem sabe, um dia...), com pescadores, barquinhos, peixe frito à beira-mar... Da Ilha você contempla um panorama singular do relevo carioca, as montanhas ao longe, Pão de Açúcar, Corcovado, etc. É como se existisse uma outra temporalidade, em que você está do lado da metrópole, mas consegue escapar de toda a agitação.

Parque Marcello de Ipanema: o bairro de Jardim Guanabara ostenta o terceiro maior IDH da cidade (VS).

Rua Jair Ramos: modernidade (IK).

A Ilha do Governador é enorme: com 40,8 quilômetros quadrados, aproximadamente o tamanho de todos os bairros da Zona Sul juntos. Só que 51% de sua área é ocupada pelo bairro do Galeão cuja ocupação é apenas para fins militares (aeronáutica) e para o aeroporto. A população, 211 mil habitantes (censo 2000), supera a de Copacabana (147 mil). Tem de tudo na Ilha do Governador: o aeroporto; um Porcão; um iate clube; uma escola de samba; uma grande presença militar em vários bairros (estação de radio da marinha, base aérea do galeão, fuzileiros navais, hospital da aeronáltica, hospital de medicina aeroespacial etc.); três reservas militares de mata atlântica; a APARU do Jequiá, que possui uma preservação do ecossistema de manguezal; um estádio de futebol; um shopping center; praias; as ruas costumam ser arborizadas; igrejas históricas; casas simpáticas; prédios modernos (mas baixos); favelas; tem até uma lenda indígena (a tribo de Arariboia, os temininós, habitava lá). Na verdade, a Ilha não é um bairro, mas uma região administrativa composta de duas ilhas (a do Governador e a do Fundão) e de 15 bairros: Bancários, Cacuia, Cidade Universitária, Cocotá, Freguesia, Galeão, Jardim Carioca, Jardim Guanabara, Moneró, Pitangueiras, Portuguesa, Praia da Bandeira, Ribeira, Tauá e Zumbi.

Igreja de Nossa Senhora da Conceição: antiga capela do engenho de Salvador Correia de Sá, construída na primeira metade do século XVII (IK).

Praça Jerusalém no Jardim Guanabara. Ao fundo, a Rua Uçá, ladeada de palmeiras (VS).


A Prefeitura, em seu plano de estratégias para a cidade, considera a Ilha um microcosmo do Rio de Janeiro. No Plano Estratégico da prefeitura lemos: “Com efervescente vida própria, um intenso comércio e dispondo de enormes recursos naturais, a Ilha do Governador tem tudo para se desenvolver de forma ordenada e coerente, preservando a qualidade de vida. A Região possui indicadores que representam uma média dos indicadores da cidade, ou seja, possui um ambiente urbano no qual os melhores bairros residenciais - confortáveis e elegantes - apresentam as mesmas condições de vida da Zona Sul, convivendo entretanto com favelas e cortiços com as mesmas mazelas características de alguns bairros da Zona Norte. A Região Ilha do Governador representa, em escala menor, um modelo de informações estatísticas da cidade.”

Estação de barcas de Cocotá: o trânsito flui razoavelmente e existe a opção da barca (IK). 

Crianças na Praia da Bandeira: A Ilha está cheia de praias bucólicas (IK).

A Ilha também teve uma longa história: antes do descobrimento, viviam lá os temininós, a tribo de Arariboia, mas foram expulsos pelos tamoios, aliados dos franceses. Após a vitória contra os invasores, Arariboia recebeu glebas do outro lado da baía, na atual Niterói. Salvador de Sá, irmão de Estácio e primo de Mem, fundaria lá os três primeiros grandes engenhos de açúcar e aguardente do Rio. O nome Governador vem de Salvador, duas vezes governador-geral do Rio. Na Ilha D. João VI tomava banhos de mar e caçava. Vinha da Quinta do Caju num pequeno galeão. A história completa você encontra na Wikipedia

Ponta do Tiro (IK).

Igreja da Sagrada Família (Ribeira) (IK).

Porta da Igreja da Sagrada Família (IK).

Vista da Igreja da Sagrada Família (VS).

Praia da Bica (VS).

Praia da Engenhoca (VS).

Igreja de N.S. da Ajuda, na Freguesia. A atual construção de 1898 apoia-se nas paredes das precedentes igrejas de 1710 e 1743. (IK)

Pedra da Onça, na Freguesia. Conta a lenda que uma índia ia todos os dias, no fim da tarde, até a praia, com seu gato maracajá, mergulhando da pedra durante horas. Um dia, a jovem índia não mais voltou, ficando o gato a esperá-la, olhando para o mar até morrer de fome (VS).