ENSEADA DE BOTAFOGO

ENSEADA DE BOTAFOGO
"Andar pelo Rio, seja com chuva ou sol abrasador, é sempre um prazer. Observar os recantos quase que escondidos é uma experiência indescritível, principalmente se tratando de uma grande cidade. Conheço várias do Brasil, mas nenhuma tem tanta beleza e tantos segredos a se revelarem a cada esquina com tanta história pra contar através da poesia das ruas!" (Charles Stone)

VISTA DO TERRAÇO ITÁLIA

VISTA DO TERRAÇO ITÁLIA
São Paulo, até 1910 era uma província tocada a burros. Os barões do café tinham seus casarões e o resto era pouco mais que uma grande vila. Em pouco mais de 100 anos passou a ser a maior cidade da América Latina e uma das maiores do mundo. É pouco tempo. O século XX, para São Paulo, foi o mais veloz e o mais audaz.” (Jane Darckê Avelar)

30.8.18

DIFERENÇA ENTRE NEGRO, CRIOULO, PARDO, MULATO, CABRA, CAFUSO, FORRO E LIVRE, SEGUNDO O HISTORIADOR NIREU CAVALCANTI

Texto explicativo que recebi certa vez por e-mail do historiador Nireu Cavalcanti, maior autoridade viva sobre a história do Rio, e resolvi incluir aqui para compartilhar com o público a terminologia com que se designava a população africana e afro-descendente na época da escravatura, de triste memória. Fotos de grafites que tirei aqui no Rio. 


O pessoal faz uma confusão imensa com essas classificações de negros e mestiços [na época da escravatura].

1- O negro que saiu diretamente da África = preto (negro) de Nação ... Mina, Cabinda, Angola etc.
2- O negro que nasceu de escravo no Brasil = crioulo
3- O filho da primeira mistura de negro com branco = pardo
4- O filho do pardo com branco = mulato
5- O filho do pardo com negro = cabra
6- O filho de preta escrava (ou livre), ou misturada, com o índio = cafuso
7- O escravo que tornou-se livre: a classificação da cor da pele (mistura) seguida de forro
8- O filho de forro = a classificação da cor da pele (mistura) seguida de livre, ou simplesmente a cor da pele.

Algum tradutor da primeira metade do século XIX é que escreveu essa bobagem de cabra ser o animal. Não me lembro se foi no Debret que o tradutor (ou o próprio) referindo-se a um escravo masculino escreveu bode.

Se não me engano o tradutor (ou a própria) do livro da Mary Karasch fez essa mesma confusão.


26.8.18

O MORRO DA VIÚVA


O Morro da Viúva, entre Botafogo e Flamengo, que na foto aérea em preto e branco do Jorge Kfuri acima se vê claramente no canto superior esquerdo (indicado pela seta), e onde na década de 1920 se planejou construir um hotel e belvedere (como informa a matéria "Embeleza-se o Morro da Viúva", da Revista da Semana de 12 de março de 1921), hoje é um morro "invisível", cercado de prédios por todos os lados. O fortim lá erguido por ocasião da Questão Christie (século XIX - foto abaixo) desapareceu, mas ainda subsistem ruínas do antigo reservatório, construído em 1891, tombado pelo INEPAC em 1998, mas em péssimo estado de conservação (ver fotos adiante). 


Entrada do forte do Morro da Viúva em foto de Carlos Malta de 1906 obtida no site do Instituto Moreira Salles. Segundo o engenheiro militar Augusto Fausto de Sousa (tomo 48 da revista do IHGB), "foi construído por ocasião do conflito com a Inglaterra, a chamada Questão Christie. Era uma bateria levantada em 1863 com o fim de defender a baía de Botafogo e a enseada do Flamengo, até em frente do Passeio Público, auxiliando a defesa de algumas das faces das fortalezas de São João, Lage e Villegagnon. O espaço acanhado, de que dispunha a mesma bateria, a pouca elevação e a facilidade de ser ofendida por fogos curvos, não permitem ligar a esta obra grande importância". A posição acabou sendo abandonada e a fortaleza foi arrasada em 1922 para a construção do Hotel Sete de Setembro, que acabou não ocorrendo, conforme informa Ulysses de Aguiar em "Terra Carioca" numa edição da Revista da Semana de 1934. O local no morro onde se erguia esse forte ignoro, se alguém souber, por favor informe. 




Se você olhar o mapa do Google Maps do Morro da Viúva, verá que a nordeste existe uma grande área, mais alta, com a mata totalmente preservada (letra A). No centro (letra B) existem piscinas e outras instalações tipo clube pertencentes a condomínios aparentemente de dois edifícios, um na Avenida Oswaldo Cruz e o outro na Avenida Rui Barbosa (Edifício Residência). O edifício da Av. Oswaldo Cruz ergueu-se no terreno do antigo Palacete Martinelli e incorporou a área que esse palacete ocupava no morro, que incluía até uma capela, conforme informação de um morador do morro. A sudoeste (letra C) ficam as ruínas do reservatório e umas casinhas de uns moradores que ocupam aquela área há muitas décadas. São casas simples mas com acabamento, não são casas de tijolos aparentes como nas favelas. 

O morro ficava à beira-mar até que, no início da década de 1920, abriu-se a Avenida Rui Barbosa contornando o morro e ligando a Avenida Beira-Mar à Praia de Botafogo. Com a construção do Aterro do Flamengo na década de 1960 o morro afastou-se ainda mais do mar, como você pode conferir no mapa acima. O plano de construir um hotel e belvedere no morro nunca saiu do papel, e o morro acabou sendo cercado por prédios cada vez mais altos que taparam sua visão para quem está embaixo. Mesmo assim, do alto do morro, ainda se avista o Pão de Açúcar e Corcovado por algumas nesgas entre um prédio e outro.

O acesso ao reservatório se dá pela Travessa Acaraí, no início da Av. Oswaldo Cruz, altura da Praça Nicarágua, na Praia de Botafogo. Essa travessa não consta do Google Maps mas tem placa indicando (vide foto). No início da escadaria tem uma portinhola aparentemente fechada, mas você pode puxar o trinco que ela abre. O morro e as ruínas do reservatório são considerados "um dos grandes segredos da cidade" pelo guia RIO SECRETO de Manoel de Almeida e Silva, Marcio Roiter e Thomas Jonglez. No final desta postagem transcrevemos (em azul) o texto do guia referente ao morro.

Travessa Acaraí, no início da Av. Oswaldo Cruz, altura da Praça Nicarágua

Travessa Acaraí (placa)

Portinhola e escada de acesso ao Morro da Viúva no fundo da Travessa Acaraí (no. 127)

Escadinha de acesso ao morro 

Alto da escadinha, com reservatório em cima

Mais em cima, quase chegando 

Antigo Reservatório do Morro da Viúva, construído em 1891 por Antônio Gabrielli, com projeto dos engenheiros Jerônimo Jardim e Luiz Francisco Monteiro de Barros. Feito de alvenaria, o reservatório possui três compartimentos cobertos por abobadilhas (uma das quais vemos na foto), alimentados pela tubulação que sai do Reservatório de Pedregulho. O simpático morador de uma das casas me mostrou a área, contou que os moradores, que ocupam o espaço faz décadas, ocasionalmente sofrem tentativas de despejo, e disse que graças aos moradores o local está limpo e conservado.

Outra abobadilha

Para um bem tombado, poderia estar mais bem conservado

Entranhas do velho reservatório

O Morro da Viúva foi sendo cercado por prédios cada vez maiores

Do alto do morro, por algumas nesgas entre os prédios, dá para ver o Pão de Açúcar e Corcovado

Casas do moradores do "núcleo pobre". O núcleo rico são as instalações e piscinas dos condomínios dos prédios

Casa do  "núcleo rico" vista por sobre o muro



Completamente cercado por prédios altos, o Morro da Viúva é invisível a partir das ruas ao redor. Muitos cariocas nem sabem da sua existência. 

Apesar de alguns prédios terem construído acessos para o morro, com quadras de esporte e outros prazeres para os felizes privilegiados que moram nos prédios vizinhos, existe um meio oficial, público e secreto, para subir lá. No final da avenida Oswaldo Cruz, do lado de Botafogo, a viela chamada travessa Acaraí dá para uma pequena porta. Basta empurrá-la para abrir.

Não é preciso ter medo. Um comandante da polícia mora na esquina e o lugar é conhecido como sendo bastante seguro.

A impressão de chegar a um dos recantos realmente secretos da cidade é particularmente agradável para aqueles que gostam de exploração urbana e que têm verdadeiro prazer em subir os 195 degraus dessa escada que leva às ruínas de um antigo reservatório.

Construído por Antônio Gabrielle em 1891 para levar água potável aos bairros de Botafogo, Praia Vermelha e Leme, ele foi fechado em 1970 e parcialmente tombado em 1998. Hoje, abandonado, ele faz parte de um espaço onde vivem, modestamente, seis famílias, que terão prazer, na sua maioria, em fazê-lo descobrir o lugar que proporciona uma vista, através das árvores, para a praia do Botafogo, a Pedra da Gávea e o Corcovado, de um lado, e para o Pão de Açúcar, do outro.

Vista (ainda não obstruída pelos prédios) do alto do Morro da Viúva em gravura de Alfred Martinet de meados do século XIX

13.8.18

IGREJA DE SÃO LOURENÇO DOS ÍNDIOS (1585)

Texto de Alexei Bueno da pág. 42 do livro PATRIMÔNIO CONSTRUÍDO: As 110 mais belas edificações do Brasil, da Capivara Editora


ORAÇÃO DE SÃO LOURENÇO: Ó Deus, que comunicastes o ardor da Vossa caridade ao diácono S. Lourenço e fizestes fiel no ministério e glorioso no martírio, fazei com que o vosso povo siga os seus ensinamentos e o imite no amor a Cristo e aos irmãos.

A igreja no dia da festa de São Lourenço

Em 22 de novembro de 1573, o chefe temiminó Arariboia – por batismo Martim Afonso de Souza – tomava posse da sesmaria, do outro lado da baía, que lhe fora doada cinco anos antes, por sua ajuda na expulsão dos franceses do Rio de Janeiro. Data daí o assentamento indígena de São Lourenço, origem da futura cidade de Niterói. Em 10 de agosto de 1585 foi inaugurada a ermida inicial, com a representação do auto de São Lourenço. O que se sabe de posterior são duas reconstruções, em 1627 e 1769, embora a igreja apresente todas as características de obra antiga. Com nave única, frontão triangular com óculo, portada de verga reta e três janelas também de verga reta, ladeada por uma pequena sineira com dois arcos plenos, reproduz muito de perto, em escala mais singela, o partido da Igreja de Santo Inácio do colégio do Rio de Janeiro (que você pode ver aqui), projetada pelo irmão Francisco Dias e desaparecida no vergonhoso arrasamento do Morro do Castelo nos anos 1920, assim como recorda o partido da grandiosa São Roque de Lisboa (aqui).



Com duas sacristias laterais, coro e capela-mor, é um exemplar típico do primeiro estilo jesuítico no Brasil. A praça em frente, totalmente descaracterizada, era a praça do aldeamento. Com a expulsão dos jesuítas, passou para a Mitra de Niterói, até ser desapropriada como monumento histórico da cidade, em 1915, pelo então prefeito de Niterói, Manuel Otávio de Souza Carneiro, fato absolutamente pioneiro e admirável para a época, mas que só se concretizou juridicamente em 1934.

capela-mor

coro

púlpito lateral

Passo XIII da Paixão

telhado sem forro

pia batismal

confessionário

Em seu interior, destaca-se o magnífico retábulo do altar-mor, muito próximo dos três retábulos da já mencionada Igreja de Santo Inácio do Rio de Janeiro, hoje conservados na Igreja de Nossa Senhora de Bonsucesso. É obra do final do século XVI ou início do XVII, das mais belas e importantes do Brasil nesse período, tendo passado recentemente por acurada restauração, assim como toda a igreja. Outro elemento de grande importância são os pisos de tijoleira muito antigos da capela-mor e da sacristia, com desenhos geométricos de evidente origem indígena, sem dúvida trabalho dos habitantes da extinta aldeia jesuítica.

magnífico retábulo maneirista (renascentista tardio) do altar-mor

Imagem de São Lourenço com a grelha, de origem portuguesa

São Lourenço

pintura de anjo à esquerda do altar-mor

trabalho de talha à esquerda do altar-mor, em estilo maneirista, que é o renascentista tardio, portanto anterior ao "rebuscamento" do barroco

anjos entalhados

pisos de tijoleira muito antigos da capela-mor, com desenhos em ziguezague (cobrinhas) feitos com os dedos dos índios aldeados e pegada de cachorro que pisou num deles quando secava ao sol, segundo informação de Alexei Bueno





10.8.18

PAULO DALLIER: DO SILÊNCIO À EXPLOSÃO


A obra de Paulo Dallier possui uma relevância que se expressa antes de tudo na maturidade alcançada. Aos 86 anos de uma vida devotada inteiramente às artes plásticas e com uma lucidez e uma força ainda presentes, vem ao longo do tempo apenas depurando ainda mais o cerne de seu estilo, sem perder a força vital de sua expressão. Expressionista em seu cerne, à qualidade artística da obra de Dallier, vem se aliar logo em seguida um traço humano efetivamente marcante.

Marco Casanova, curador



1.8.18

EVOLUÇÃO DA ARQUITETURA CARIOCA: DO MANEIRISMO AO PÓS-MODERNISMO

UM ESTUDO DE IVO KORYTOWSKI

O Rio é um verdadeiro museu a céu aberto de arquitetura, tamanha a variedade de construções de diferentes épocas que convivem em nosso espaço geográfico. Tanto é que foi escolhido pela União Internacional de Arquitetos e UNESCO para ser a capital mundial da arquitetura de 2020, ano em que ocorrerá na cidade o Congresso Mundial de Arquitetos. Veremos a seguir os principais estilos presentes na arquitetura civil e/ou religiosa da cidade, em ordem cronológica.

1) Maneirismo
Maneirismo é um estilo artístico intermediário entre o renascentista e o barroco, que rompe com o excesso de “perfeição” (perspectiva, simetria, harmonia) da arte da Renascença, retomando alguns valores da arte medieval. Na arquitetura, o maneirismo português e, por conseguinte, o brasileiro se caracterizaram por certa simplicidade e rusticidade: fachadas quase quadradas, frontões triangulares e contraste entre os contornos de pedra e as paredes brancas. O maneirismo português tem em comum com o italiano e espanhol apenas o momento cronológico, já que esteticamente diferem. No Brasil, estilo adotado por nossas primeiras igrejas e conventos (ver postagem QUAL A IGREJA MAIS ANTIGA DO RIO DE JANEIRO?). O melhor exemplo sobrevivente é a fachada da igreja do mosteiro de São Bento (foto 1.1). Outro exemplo é a Igreja de Nossa Senhora da Apresentação, no Irajá, dentre as mais antigas do Rio, de 1613 (foto 1.2). Do lado de lá da baía, em Niterói, temos a igreja de São Lourenço dos Índios, de 1585 (foto 1.3).  


Foto 1.1: Igreja de N.S. de Montserrat do Mosteiro de S. Bento. Construção: 1633-1642.  Fachada maneirista sóbria, na linha monástica tradicional, contrastando com o interior barroco exuberante em talha dourada.

Foto 1.2: Na parte inferior da moldura de pedra da janela central consta que esta igreja é de 1613. Segundo Alexei Bueno (a quem consultei) "A torre é tipicamente do século XVII, o frontão triangular também está em pleno acordo. Talvez as vergas da porta e das janelas tenham sido alteradas no século seguinte, mas não tenho maiores dúvidas de que a igreja é mesmo dessa data." Segundo o Guia da Arquitetura Colonial, Neoclássica e Romântica no Rio de Janeiro, "Foi a igreja matriz da freguesia de Irajá, que abrangia a zona rural açucareira do Rio de Janeiro. O interior foi alterado e a nave sofreu acréscimos, mas a fachada mantém as características coloniais: uma porta encimada pelas três janelas do coro com vergas em arco abatido, frontão triangular e torre sineira com coroamento semiesférico."


2) Barroco
O barroco no mundo inteiro se caracteriza pela exuberância e ilusão de movimento. No Brasil restringiu-se à arquitetura religiosa e só atingiu a plenitude na decoração de interiores — a talha barroca, que explode com força total na igreja do Mosteiro de São Bento (foto 2.1) e na Igreja da Ordem Terceira de São Francisco da Penitência (foto 2.2). Nas fachadas das igrejas o barroco se manifestou em alguns elementos, como os frontões curvos (por exemplo, da Igreja de São Francisco de Paula - foto 2.3) e as portadas trabalhadas (por exemplo, da Igreja de Nossa Senhora do Carmofoto 2.4).


Foto 2.1: Interior da Igreja de N.S. de Montserrat do Mosteiro de S. Bento:
explosão barroca 

Foto 2.2: Nave da Igreja da Ordem Terceira de São Francisco da Penitência com exuberante talha barroca. Mais detalhes aqui e aqui.

Foto 2.3: Igreja de São Francisco de Paula. Observe o frontão curvo barroco.

Foto 2.4: Portada barroca da Igreja da Ordem Terceira de N. S. do Monte do Carmo (ou simplesmente Igreja de N. S. do Carmo).

3) Rococó
O rococó, surgido na França no reinado de Luís XV, é uma suavização do barroco. Caracteriza-se pela estilização de conchas — a chamada rocaille, de onde deriva o termo rococó — flores e folhagens, cores pastel (suavizadas pelo acréscimo de pigmento branco), douramento sobre fundo branco. Uma série de igrejas do Rio ostenta ornamentação rococó no interior: 

Igreja de Bom Jesus da Coluna na ilha do Fundão
Igreja de Nossa Senhora da Conceição e Boa Morte (aqui)
Igreja de Nossa Senhora da Saúde (aqui)
Igreja de Nossa Senhora de Bonsucesso (aqui, com exceção dos retábulos maneiristas salvos da Igreja dos Jesuítas do antigo Morro do Castelo)
Igreja de Nossa Senhora do Carmo da Antiga Sé (foto 3.3)
Igreja de N.S. do Terço e Senhor dos Passos (aqui)
Igreja de Nossa Senhora Mãe dos Homens (aqui)
Igreja de Santa Cruz dos Militares (foto 3.2)
Igreja de Santa Luzia (foto 3.1)
Igreja de São José (aqui).


Também o Salão Nobre do Palácio Guanabara está decorado em estilo rococó (ver aqui).


Foto 3.1: Igreja de Santa Luzia: Capela-mor rococó

Foto 3.2: Igreja da Irmandade da Santa Cruz dos Militares: interior rococó

Foto 3.3: Igreja de N.S. do Carmo da Antiga Sé: interior com exuberante talha rococó atribuída ao Mestre Inácio Ferreira Pinto. Ver detalhes aqui, aqui e aqui.

4) Colonial
O termo colonial designa antes um período do que propriamente um estilo. Mas como por aqui o barroco nunca se manifestou plenamente, a não ser na decoração dos interiores das igrejas, e como a nossa arquitetura civil da época (o Paço, a Casa do Bispo, o Palácio Episcopal) se caracterizou – talvez por escassez de materiais e recursos, e também porque, como colônia, não podíamos ofuscar as edificações da metrópole  pelo despojamento e caráter utilitário, eu diria que tivemos um estilo arquitetônico colonial brasileiro mantendo alguns elementos do maneirismo, incorporando alguns elementos barrocos e introduzindo elementos novos, por exemplo, as sacadas com gradis de serralheria. A arquitetura colonial civil inclui:

palácios urbanos – Palácio Episcopal, atual Serviço Geográfico do Exército (aqui) e Paço Imperial, no Centro (foto 4.1)
► um palacete rurala Casa do Bispo no Rio Comprido (foto 4.2);
► casas para diversos usos institucionais, como o Arsenal de Guerra (aqui) e Casa do Trem (foto 4.3), atualmente integrando o complexo do Museu Histórico Nacional;
► casas de fazenda, como a Fazenda do Engenho D'Água, em Jacarepaguá (foto 4.5);
► casas residenciais, como a Casa da Glória, que acolhia romeiros da Igreja da Glória, cujos fundos preservam o aspecto colonial, embora a frente tenha sido descaracterizada (foto 4.6), a casa nos fundos da Igreja de N.S. da Lapa dos Mercadores (aqui), casinha na Rua General Caldwell (aqui) e a Casa dos Pilões no Jardim Botânico (aqui).

Um exemplo primoroso da arquitetura colonial religiosa é a igreja do Convento de Santa Teresa (foto 4.5). Outro é a Igreja de Santo Antônio da Bica, antiga capela rural que passou a integrar o sítio de Burle Marx (aqui). 


Foto 4.1: Paço Imperial, um dos exemplos mais notáveis da arquitetura civil colonial brasileira. Construído em meados do século XVIII e inaugurado em 1743 para servir de residência e paço ao governador da capitania do Rio de Janeiro Gomes Freire de Andrade. Em 1763, com a transferência da capital da colônia de Salvador para o Rio de Janeiro, tornou-se o Paço dos Vice-Reis. Com a chegada da corte portuguesa em 1808 foi promovido a Paço Real. Serviu pouco tempo como residência nobre, pois a família real considerou-o pouco confortável e se mudou para a Quinta da Boa Vista. Passou a servir então para solenidades, despachos e recepções. Após a independência tornou-se o Paço Imperial. Com a República o prédio entrou em declínio e serviu por muitas décadas como sede dos correios. No início da década de 1980 foi restaurado, recuperando as características originais.

Foto 4.2: Casa do Bispo - Av. Paulo de Frontin, 568 - uma das mais belas residências rurais do Brasil, construída no início do século XVIII para abrigar o segundo bispo do Rio de Janeiro. "É uma perfeição realmente, obra do nosso Brigadeiro Alpoim. Não me canso de admirar a elegância, a sobriedade, a harmonia e o entrosamento com a paisagem da nossa arquitetura colonial." (Alexei Bueno)

Foto 4.3: A Casa do Trem (1762), para a guarda do “trem de artilharia” (armas e munições), hoje integra o conjunto do Museu Histórico Nacional

Foto 4.4: Casa da Fazenda do Engenho D'Água. "Neste exemplo estão presentes um alpendre com colunata e uma capela possivelmente inserida no corpo da casa em período posterior à sua construção, alterando assim a simetria de eixo central da composição. Apresenta detalhes construtivos de acabamento esmerado que a destacam das edificações congêneres: os capitéis das colunas, a escada que se abre em forma curva, as jardineiras nos intercolúnios, o piso do alpendre com paginação especial , e o interessante detalhe da aplicação de azulejos nos espelhos da escada de acesso." (Guia de arquitetura colonial neoclássica e romântica no Rio de Janeiro)

Foto 4.5: Casa da Glória (fundos). Apenas os fundos mantiveram o aspecto colonial de quando a casa foi erguida, em 1769, para acolher os romeiros. A frente e lateral foram ecleticizadas em reforma de 1880.

Foto 4.6: Igreja do Convento de Santa Teresa.

5) Neoclássico
Estilo predominante na época do Reino Unido (1815-22) e do Império (1822-1889), dir-se-ia o estilo oficial do período imperial brasileiro. Caracteriza-se pela simetria rigorosa na composição das fachadas e das plantas, como você pode observar nas fotos abaixo. Se quiser entender na prática a diferença entre o estilo neoclássico e o espírito eclético subsequente, percorra a Rua da Carioca no Centro: as construções do lado ímpar são neoclássicas, da segunda metade do século XIX, enquanto no lado par, devido ao alargamento da rua no início do século XX, os prédios são bem diferentes, com grande diversidade eclética.

Nas construções neoclássicas mais imponentes — palácios, igrejas, hospitais — vemos também elementos da arquitetura greco-romana como:

  • colunas: estruturas cilíndricas ornamentais ou de sustentação, originárias da arquitetura grega clássica, compostas de pedestal, fuste e capitel


  • pilastras: falsas colunas, ornamentais, semiembutidas nas paredes


  • frontões: elementos arquitetônicos decorativos normalmente triangulares (mas às vezes curvos, como na foto 5.5 abaixo) geralmente no alto da fachada 



Uma das primeiras construções neoclássicas da cidade foi a antiga Alfândega, atual Casa França-Brasil, projeto de Granjean de Montigny de 1819, erguida em 1820 (foto 5.1). O francês Montigny, membro da Missão Artística francesa vinda ao Rio no tempo de D. João VI, contribuiu para divulgar o neoclassicismo em nossa terra, embora seja falso dizer (como às vezes se diz) que o tenha introduzido aqui. O Real Teatro de São João de 1813, por exemplo, já exibia uma fachada neoclássica.


Foto 5.1: Casa França-Brasil, antiga Alfândega, projeto de 1819 de Granjean de Montigny, estilo neoclássico, construção em 1820

Eis uma relação de grandes prédios neoclássicos construídos no século XIX:

  • Academia Militar: Projeto de 1811, no Largo de São Francisco, no local onde deveria ter sido erguida a nova catedral, depois Escola Politécnica, Escola Nacional de Engenharia, atual Instituto de Filosofia e Ciências Sociais da UFRJ, onde estudei na década de 1970. O projeto original sofreu mudanças posteriores, como as rampas de acesso, colunata, frontão e os dois pavimentos superiores (aqui).
  • Casa da Moeda: projeto de 1858, na Praça da República, atual Arquivo Nacional (foto 5.2).
  • Antigo Museu Real/Imperial, depois Arquivo Nacional, atual Museu da Casa da Moeda do Brasil, na Praça da República, obra pioneira do estilo neoclássico (foto 5.3). 
  • Sede nova da Santa Casa da Misericórdia: projetos de 1840 e 1865 (ampliação), na Rua Santa Luzia, 206 — Centro (foto 5.4).
  • Campus hospitalar da Beneficência Portuguesa: projeto de 1840, na Rua Santo Amaro, 80/84 — Glória (foto 5.5).
  • Hospício de Alienados (onde Policarpo Quaresma passou uma temporada no famoso romance): projeto de 1842, atual Palácio Universitário da UFRJ, na Av. Pasteur, 250 — Urca (ver aqui).
  • Hospital da Venerável Ordem Terceira de Nossa Senhora do Monte do Carmo, cuja sede na Rua do Riachuelo foi inaugurada pelo Imperador em 1870 (aqui).
Cabe mencionar também o antigo Paço de São Cristóvão, atual Museu Nacional, que, embora originalmente uma sede de fazenda, depois residência suburbana, doada pelo comerciante Elias Antônio Lopes para se tornar palácio real, sofreu reformas neoclássicas em meados do séc. XIX (foto 5.6 e aqui).

    Foto 5.2: Arquivo Nacional, antiga Casa de Moeda do Brasil, fotografado do Campo de Santana (Praça da República.). Um dos maiores edifícios do neoclassicismo carioca, construído em 1858. Para um foto mais de perto clique aqui e para uma bonita foto dos fundos clique aqui.

    Foto 5.3: Antigo Museu Real, depois Imperial, que deu origem ao Museu Nacional. Quando este foi transferido para a Quinta da Boa Vista, virou sede da Intendência de Guerra, do fórum do Rio e depois do Arquivo Nacional. Tombado pelo IPHAN em 2016. Após seis anos de obras reabriu em 8/3/2018 como Museu da Casa da Moeda do Brasil, com acervo de moedas, cédulas, medalhas, além de documentos e fotos que guardam a memória da instituição. "As atuais feições neoclássicas do edifício resultam de sucessivas reformas e ampliações posteriores a 1818, efetuadas em uma residência, cujas características originais são desconhecidas. Trata-se de uma obra pioneira do estilo neoclássico." Guia da arquitetura colonial neoclássica e romântica no Rio de Janeiro

    Foto 5.4: Santa Casa da Misericórdia

    Foto 5.5: Beneficência Portuguesa (Glória)

    Foto 5.6: Museu Nacional, antigo Paço de São Cristóvão, residência da família real e depois imperial

    Mas o estilo não foi adotado somente em grandes prédios públicos. No Centro e nos bairros tradicionais do Rio o estilo neoclássico é representado por:

    • solares, como o Solar de Grandjean de Montigny (aqui), Solar do Barão do Rio Seco (aqui) e Solar dos Abacaxis (aqui)
    • casarões,  como a casa de Rui Barbosa (aqui), a casa do General Osório (aqui) e a casa da Marquesa de Santos (aqui) e o casarão da foto 5.7
    • casarões geminados, como os da Rua Teresina, em Santa Teresa (aqui)
    • carreiras de sobrados, como a do lado ímpar da Rua da Carioca (aqui),  bem como aqui e aqui 
    • casas, como as três com fachadas de azulejos tombadas pela Prefeitura no Morro do Pinto (aqui)
    • casas de chácara, como a antiga Chácara do Viegas com fachada azulejada de 1860 em Santa Teresa (aqui)
    • palácios e palacetes: foto 5.8, bem como o Palácio do Itamarati, antiga residência do conde de Itamaraty, que com a República virou sede do Poder Executivo e depois do Ministério das Relações Exteriores (aqui), e o palacete deste mesmo conde no Alto da Boa Vista que, embora tombado, está abandonado (aqui)
    • prédios de diversos usos, como uma sede maçônica (aqui), o antigo Conservatório de Música, atual Centro Hélio Oiticica (aqui), o antigo Cassino Fluminense, depois Automóvel Club, na Rua do Passeio (foto 5.9), o antigo Educandário Santa Teresa, depois Casa Daros, a partir de 2019 Escola Eleva em Botafogo (aqui), a Real e Benemérita Sociedade Portuguesa Caixa de Socorros D. Pedro V (aqui), o antigo empório de café de meados do séc. XIX na Rua da Gamboa (foto 5.10), o Instituto João Alves Afonso, onde funcionou o Colégio Abílio, que serviu de inspiração para o Ateneu de Raul Pompeia (aqui), o antigo Palácio dos Estados na Exposição Nacional do Centenário da Abertura dos Portos (foto 5.11), a antiga Academia de Belas Artes, projeto de Grandjean de Montigny de 1826, da qual só resta a fachada, levada para o Jardim Botânico (foto 5.12) e o Templo Positivista na Glória (foto 5.12)

    Foto 5.7: Casarão neoclássico de 1874 com fachada de azulejos na Rua do Lavradio (Centro) em foto de 2011. O casarão foi depois restaurado e abriga agora a Galeria Scenarium.

    Foto 5.8: Palacete da Babilônia no Colégio Militar (Tijuca). Antiga propriedade do Conde de Bonfim, Barão de Mesquita e Barão de Itacuruçá e atual sede do comando do Colégio Militar do Rio de Janeiro (Casa de Thomaz Coelho), em belíssimo estilo neoclássico. 

    Foto 5.9: Antigo Cassino Fluminense, depois Automóvel Clube, nesta foto de agosto de 2013 recém-restaurado e pintado, único remanescente da obra arquitetônica de Araújo Porto-Alegre, em estilo neoclássico, projeto de 1855.

    Foto 5.10: Antigo empório de café de meados do séc. XIX na Rua da Gamboa, neoclássico na simetria e frontões, belas vergas em arco pleno e ombreiras de cantaria. "Esse prédio é um tesouro, deve ter sido um empório de café, pelo estilo e pelo local. Parece-me um prédio bem da metade do XIX, 1850, um pouco mais para trás, um pouco mais para a frente. O mar ainda estava rente dele quando foi construído." (Alexei Bueno)

    Foto 5.11: Companhia de Pesquisa de Recursos Minerais. Av. Pasteur, 404 (Urca). 1908. Estilo neoclássico tardio. Inicialmente concebido em 1880 para ser a Faculdade de Medicina, suas obras foram retomadas em 1908 para abrigar o Palácio dos Estados na Exposição Nacional do Centenário da Abertura dos Portos naquele ano. Principal pavilhão da exposição, foi considerado um dos maiores edifícios públicos do país. O Instituto de Mineralogia instalou-se ali na década de 1970. Tombado pelo Município.

    Foto 5.12: Portal da antiga Academia de Belas Artes. Projeto de Grandjean de Montigny em estilo neoclássico, a Academia foi inaugurada em 5 de novembro de 1826 por D.Pedro I. Demolida no final da década de 1930, seu portal foi levado para o Jardim Botânico na década de 1940.

    Foto 5.13: Templo Positivista na Rua Benjamin Constant (Glória), construído em 1891-97. Fachada inspirada no Panthéon de Paris.  

    A fachada original da Igreja Matriz de Nossa Senhora da Glória no Largo do Machado, em forma de templo romano (a torre sineira atrás foi acrescentada posteriormente), é um belo exemplo de arquitetura religiosa neoclássica (foto 5.14). Outros exemplos são a Igreja de Nossa do Remédios, na colônia Juliano Moreira em Jacarepaguá (aqui), Igreja de Santo Inácio no colégio de mesmo nome em Botafogo (aqui), a Igreja Matriz de São João Batista em Botafogo (aqui), a Igreja de N.S. Mãe dos Homens (Rua da Alfândega), cuja fachada foi refeita em 1856 em estilo neoclássico (aqui) e a Igreja de Santa Luzia, cuja fachada apresenta elementos do neoclássico (aqui). Digna de nota também é a portada neoclássica da Igreja de São Francisco de Paula (aqui).

    Foto 5.14: Igreja Matriz de N. S. da Glória - Largo do Machado - inaugurada em 1872. A fachada com colunas, frontão e larga escadaria representa um dos exemplos mais típicos e raros da arquitetura neoclássica religiosa. Único projeto carioca do alemão Julius Friedrich Köller, autor do plano de Petrópolis, e o francês Rivière. Em forma de templo romano, inspirou-se em La Madeleine de Vignon, em Paris. A monumental torre sineira com terraço e arremate agulhado foram acrescentados no final do séc. XIX.

    6) Romântico
    Além dos jardins românticos de inspiração inglesa muito difundidos na cidade graças ao trabalho do paisagista Glaziou (Quinta da Boa Vista (aqui), Campo de Santana, reforma do Passeio Público), na virada do século XIX para o XX surgiu no Rio toda uma geração de chalés românticos, dos quais vários ainda sobrevivem em diferentes bairros. Ao contrário do chalé europeu, de madeira, a versão carioca é de alvenaria, com telhado de duas águas, beiral acentuado, lambrequins (=ornatos de madeira recortada) na borda do beiral e óculo (=respiradouro circular ou oval) no tímpano do frontão. O pesquisador Raul Félix o considera o primeiro estilo arquitetônico genuinamente carioca, sem imitar nenhum estilo estrangeiro, e por ter surgido na época do Império prefere a designação chalé imperial”. 

    A foto 6.1 mostra um chalezinho de um conjunto de três, cada um com uma cor diferente, no alto da Ladeira de Santa Teresa, todos em perfeito estado de conservação (para ver o conjunto dos três chalés clique aqui). Já o chalé do Alto da Boa Vista de 1879 (foto 6.2) com bonita decoração de estuque no tímpano, embora perdesse os lambrequins do beiral, conserva-os na bandeira semicircular superior das quatro janelas. A foto 6.3 mostra o Chalé de Arthur de Sá Earp Neto em Petrópolis. Um exemplo de construção monumental que mescla a simetria neoclássica com telhados de chalé são as Casas Casadas de Laranjeiras mostradas na foto 6.4.  A foto 6.5 mostra dois chalés geminados em Laranjeiras.


    Foto 6.1: Chalé em Santa Teresa. Observe o bonito trabalho de madeira rendilhada (lambrequins) sob o beiral, no formato triangular do tímpano da casa, típico dos chalés da época.

    Foto 6.2: Chalé romântico de 1879 na Estrada Velha da Tijuca (Alto da Boa Vista) . "Um dos primeiros chalés construídos no Rio de Janeiro, nesta obra estão presentes vários dos estilemas que caracterizam esse tipo arquitetônico: o telhado em duas águas arrematado por lambrequins de madeira recortada, a varanda lateral sustentada por delgados pilaretes de ferro, as janelas envidraçadas, de abrir, e o tímpano decorado com estuques. Neste caso, um terraço lateral elevado confere originalidade à composição." Guia de Arquitetura Colonial, Neoclássica e Romântica no Rio de Janeiro.

    Foto 6.3: Chalé de Arthur de Sá Earp Neto em Petrópolis 

    Foto 6.4: Casas Casadas. Rua Leite Leal, 45 (Laranjeiras). 1874. "Solução residencial inovadora que combina o sentido de individualidade das seis casas seriadas com a vontade de conferir unidade ao conjunto. [...] Os telhados com beiral de grande projeção conferem ao conjunto um aspecto de chalé." Guia de Arquitetura Colonial, Neoclássica e Romântica no Rio de Janeiro 

    Foto 6.5: Chalés geminados na Rua Ribeiro de Almeida, Laranjeiras

    Outros chalés em diferentes bairros e variados estados de conservação você pode ver no álbum ESTILO ROMÂNTICO – clique nas fotos para ler as legendas. Aproveite que passei anos rodando pelo Rio à cata destas e de outras preciosidades arquitetônicas. Talvez o mais bonito dos chalés cariocas seja Chalé Olinda (foto 6.6), de três andares, antiga residência do Marquês de Olinda, depois Casa de Saúde Dr. Eiras, que hoje faz parte de um condomínio sofisticado. Não adianta pedir ao porteiro para entrar e contemplar essa maravilha que ele ameaça chamar a polícia; as fotos abaixo consegui tirar me equilibrando no alto de uma carcaça de computador junto ao muro, na rua que sobe o morro, e só dão um vislumbre do chalé em meio à folhagem. 



    Foto 6.6: Chalé Olinda (frontão). Antiga residência do Marquês de Olinda, depois Casa de Saúde Dr. Eiras, primoroso chalé de três andares, hoje faz parte de um condomínio sofisticado, Les Palais.

    A partir da década de 1910 os chalés perdem essas características românticas e dão origem às singelas casinhas de subúrbio”, como esta que fotografei na Vila dos Marítimos em Tomás Coelho.


    Foto 6.7: Casinha de subúrbio

    7) Industrial
    O estilo industrial, que coexistiu com a arquitetura eclética, foi desenvolvido por engenheiros, e não por arquitetos. Caracterizou-se pelo uso de estruturas metálicas aparentes ou ocultadas. Para entender a essência do estilo industrial pense na Torre Eiffel de Paris. No Rio, a maior construção em estrutura metálica foi o antigo Mercado Municipal (foto 7.1), inaugurado em 1907, perto da Praça XV, infelizmente demolido no final da década de 1950 com a construção da Perimetral, com exceção de um dos cinco torreões ocupado pelo Restaurante Albamar, que existe até hoje (foto 7.2). Também o Quartel Central do Corpo de Bombeiros, na Praça da República, é uma das mais interessantes aplicações de estrutura metálica da cidade, mas ocultada de quem passa em frente por uma espécie de castelinho eclético fronteiro (foto 7.3). Para ver a estrutura metálica você tem que entrar no pátio central  (foto 7.4). Diga que vai visitar o museu nos fundos, embora em dias de grande movimentação de viaturas no pátio,  o museu fique inacessível. A antiga sede da Light and Power Company, onde fica o Centro Cultural da Light, também foi construída em estrutura metálica, mas revestida por alvenaria, com fachada inspirada no maneirismo italiano (ver a fachada aqui e a estrutura metálica aqui e aqui). O Palácio Monroe (aqui), já demolido, foi outro exemplo de construção em estrutura metálica para ser o pavilhão brasileiro na Exposição Internacional de Saint-Louis (EUA), em 1904. Premiado na exposição, foi desmontado e depois reconstruído na avenida Central, como informa o livro Rio de Janeiro na época da Avenida Central, que pode ser acessado gratuitamente aqui

    Foto 7.1: Antigo Mercado Municipal, em estrutura metálica, inaugurado em 1907, demolido no final da década de 1950, com exceção de um dos cinco torreões, onde funciona o Restaurante Albamar. Detalhe de foto de S.H. Holland da década de 1930.

    Foto 7.2: Restaurante Albamar, no único torreão sobrevivente do antigo Mercado Municipal

    Foto 7.3: Quartel Central do Corpo de Bombeiros, "uma das mais interessantes aplicações de estrutura metálica do Rio de Janeiro". Inaugurado em 1908. Fachada eclética. 

    Foto 7.4: Detalhe da estrutura metálica do Quartel Central do Corpo de Bombeiros

    8) Ecletismo
    Na virada do século XIX para o XX a arquitetura vivencia uma explosão de criatividade e originalidade e passa a beber das mais variadas fontes: Idade Média, França, Itália, Inglaterra, Portugal, arquitetura mourisca. Caracteriza-se pela ornamentação profusa. É forte a influência do estilo Beaux Arts francês, que é a arquitetura acadêmica pós-neoclássica, caracterizada por projetos historicistas e ecléticos, em escala monumental, como aqueles ensinados na École des Beux-Arts de Paris” (Dicionário Ilustrado de Arquitetura)O exemplo arquetípico de construção em estilo Beaux Arts em Paris é o Teatro da Ópera de Paris, do arquiteto Charles Garnier (a chamada “Ópera Garnier”), que serviu de inspiração para o nosso Teatro Municipal carioca (foto 8.1). Aliás, podemos dizer que toda a primeira geração de prédios da então recém-aberta Avenida Central, cujas fachadas saíram vencedoras de um concurso com prêmios em dinheiro, incluindo o Palácio Monroe (aqui), Biblioteca Nacional (aqui), Museu de Belas Artes (aqui), são, em maior ou menos grau, representantes do Beaux Arts.

    Foto 8.1: Teatro Municipal. "Se o conjunto da Cinelândia representa o ecletismo carioca, o Teatro Municipal é uma espécie de síntese e melhor exemplo do projeto republicano para a capital do Brasil. Nada no conjunto do ecletismo carioca é mais dramático do que o jogo das três cúpulas arrematadas com globos iluminados de vidro e a grande águia de asas abertas. Nada é mais cheio de fausto que a escadaria monumental com suas diversas qualidades de mármores multicoloridos, cariátides douradas, tapetes, brilhos, luzes e cores. Há nos interiores bronzes de Bernardelli, uma alegoria da Verdade em carrara esculpida por Injalbert, interessantes painéis de azulejos e mosaicos e , sobretudo, a pintura no teto de Eliseo Visconti." Guia da Arquitetura Eclética no Rio de Janeiro. Para uma foto noturna clique aqui.

    Em alguns casos, o ecletismo utiliza elementos clássicos, mas não de forma tão uniforme e ordenada como no neoclassicismo – ou seja, mais exuberante, menos contida, sem se ater aos cânones do neoclássico puro. Temos então um estilo eclético classicizante ilustrado pelas fotos 8.2-6 e pelo álbum ESTILO ECLÉTICO CLASSICIZANTE


    Foto 8.2: Hotel Vila Galé. Imóvel eclético classicizante restaurado em 2014, na Rua Riachuelo, 126 (Lapa). "Uma das restaurações mais brilhantes a que já assisti, dez, nota dez. Esse casarão era um hotel de luxo, se não me engano Magnífico Hotel, erguido por volta de 1918. Durante anos abrigou um colégio, MABE, foi comprado recentemente pelo grupo hoteleiro português Vila Galé, e acaba de voltar à sua função original. Há algum tempo encontrei um anúncio dele, recém-inaugurado, em revista da época. As duas cúpulas laterais de ardósia não existiam mais, mas foram refeitas na restauração, o que dá a medida de sua qualidade, e de como houve uma pesquisa histórico-arquitetônica antes dela. " (Alexei Bueno) Veja mais sobre o retrofit do Hotel Vila Galé aqui.  

    Foto 8.3: Fundação Romão de Matos Duarte da Santa Casa de Misericórdia. Antiga Chácara das Mangueiras, maior terreno da rua Marquês de Abrantes no século XIX, depois (segundo Brasil Gerson em História das ruas do Rio, p. 289) embaixada da França, Inglaterra e Rússia Imperial, sede de colégios e residência de nobres famílias, o Grande Hotel de Aurélio Vidal e, a partir da primeira década do século XX, sede definitiva da Roda dos Expostos da Santa Casa. "Visitei quando criança a Romão Duarte, com outros alunos do Santo Inácio, um passeio para levar presentes aos órfãos, ou algo no gênero. Lembro-me que me impressionei bastante com o prédio, com a sua enorme escadaria, etc., mas nunca voltei lá. Esse prédio, como lhe disse, é a antiga Chácara das Mangueiras, severamente descaracterizada até virar um eclético meio classicizante. Em suma, a construção inicial é do século XVIII, a primeira em toda aquela região, e foi desenhada e pintada por diversos viajantes [como você pode ver aqui]." Alexei Bueno. Endereço atual: Rua Paulo VI, 60 (Flamengo). 

    Foto 8.4: Antigo Palácio da Saúde do Ministério da Guerra construído entre 1902 e 1905 pelo major J. Bevilacqua. Eclético classicizante: frontões, colunas, simetria, mas sem se ater aos cânones do neoclássico puro. Praça da República, 123.  

    Foto 8.5: Museu Naval.e Serviço de Documentação da Marinha. O prédio de autoria do engenheiro naval Francisco Correia Câmara, foi inaugurado em 1900 para sediar diversos órgãos da Marinha. Os três pavimentos, distribuídos ao redor de um pátio com estrutura de ferro à vista, abrigam, desde 1927, o Museu Naval e Oceanográfico. Destacam-se o embasamento de cantaria e, internamente, a escada nobre com corrimão e guarda-corpo de madeira e uma outra helicoidal em ferro fundido. 

    Foto 8.6: Palacete Modesto Leal. "Considerada uma das últimas chácaras urbanas da cidade, a mansão foi comprada em 1892 pelo Conde João Leopoldo Modesto Leal e é mantida por seus descendentes até hoje. A pedido do conde, de quem era amigo pessoal, o arquiteto italiano Antonio Januzzi reformou a casa imprimindo ao espaço um estilo neoclássico. Na época, um dos mais importantes projetistas e construtores do país, Januzzi (que assinou o projeto de reforma da Casa de Rui Barbosa e de tantos outros palacetes da cidade) deixou na bela mansão de Laranjeiras a sua marca como construtor, principalmente, na fachada, com seus três vãos em arco pleno ao centro e dois planos laterais." O Globo, 18/9/2010. 

    Comum ao ecletismo é a releitura e adaptação ao presente de estilos de épocas do passado histórico, gerando os estilos historicistas, de revivescência (os “neos”). No Rio de Janeiro encontramos exemplares dos seguintes estilos de revivescência:

    1) Neogótico: O gótico se consolidou como o estilo das grandes catedrais nos derradeiros séculos da Idade Média, com seus arcos ogivais, abóbadas em cruzaria, vitrais e rosáceas, arcobotantes e contrafortes como suportes externos, gárgulas, etc. (tudo isto você encontra explicadinho na Wikipedia), e no Rio várias igrejas e capelas cariocas adotam o neogótico, como mostram as fotos 8.1.1-5, bem como o álbum ESTILO NEOGÓTICO – você nem imaginava que tem tantos templos neogóticos no Rio! Na arquitetura civil temos o Castelinho da Ilha Fiscal (foto 8.1.6) e o Educandário Gonçalves de Araújo em São Cristóvão (aqui). 


    Foto 8.1.1: Igreja neogótica de N.S. da Salete, no Catumbi, de 1914. "Possui aspecto imponente, em parte por estar ainda cercada de edifícios baixos, o que lhe dá grande relevo." (Mauro Matos, Catumbi, um bairro do tempo do Império

    Foto 8.1.2: Igreja do Sagrado Coração de Jesus de 1890 (Rua Benjamin Constant, 42 - Glória). Em estilo neogótico, tem como característica uma monumental verticalidade. 

    Foto 8.1.3: Igreja Metodista do Catete, neogótica. Projetada e executada por Antônio Januzzi em 1886. 

    Foto 8.1.4: Igreja de N.S. da Conceição e São José, neogótica, concluída em 1940 (Engenho de Dentro). 

    Foto 8.1.5: Igreja Imaculada Conceição, um dos mais belos templos em estilo neogótico da cidade. Nas fotos antigas destacava-se na paisagem da Praia de Botafogo (como você pode ver aqui), mas os prédios modernos e o elevado em frente a esconderam. Inaugurada em 1892. Abriga 32 vitrais franceses e uma rosácea na fachada. Praia de Botafogo, 266. 

    Foto 8.1.6: Castelinho da Ilha Fiscal

    2) Neomedieval: construções inspiradas em castelos medievais (fotos 8.2.1-3).

    Foto 8.2.1: Casa eclética de inspiração militar medieval anterior a 1886 na Rua Triunfo, 38 (Santa Teresa).

    Foto 8.2.2: Castelo Valentim, prédio de apartamentos em Santa Teresa. "De forte inspiração medieval, a fantasia romântica na arquitetura carioca atinge aqui um de seus pontos culminantes." (Guia da Arquitetura Eclética do Rio de Janeiro).

    Foto 8.2.3: Velha estação de trem em forma de castelo de Vila Militar.

    3) Neorrenascentista francês: O Palácio do Louvre em Paris (aqui) dá uma ideia perfeita do que seja uma construção renascentista francesa. O Museu de Belas Artes tem sua fachada principal (foto 8.3.1) inspirada na fachada ocidental do Palácio do Louvre (aqui). Outros representantes do neorrenascentismo francês no Rio: 
    • Palacete Lineu de Paula Machado, na esquina da Rua São Clemente com Dona Mariana, restaurado pelo INEPAC, desde agosto de 2018 abrigando a Casa Firjan (foto 8.3.2).
    • Instituto Nacional de Educação de Surdos em Laranjeiras (foto 8.3.3 e aqui).
    • Sindicato dos Trabalhadores na Indústria do Fumo do Município do Rio de Janeiro (foto 8.3.4).
    • o Edifício Milton, na Rua do Russel, 710 (Glória) com sua portada de mármore, hall social luxuoso, fachada elegante e telhado de mansarda (foto 8.3.5).
    • Antiga residência Eduardo Otto Theiler (foto 8.3.6).

      Foto 8.3.1: Museu de Belas Artes. Museu Nacional de Belas Artes, remanescente da primeira geração de prédios da então recém-inaugurada Avenida Central. Projeto original de Adolfo Morales de los Rios. Inaugurado em 1908. "O projeto original foi modificado possivelmente pelo escultor Rodolfo Bernardelli que dirigia a Escola Nacional de Belas Artes. A fachada principal é uma interpretação da fachada ocidental do palácio do Louvre, em Paris, incluída a cúpula do Pavilhão do Relógio. As fachadas laterais lembram o Renascimento italiano." Guia da Arquitetura Eclética no Rio de Janeiro.

      Foto 8.3.2: Palacete Lineu de Paula Machado (detalhe), projeto do arquiteto Armando Carlos da Silva Telles, datado de 1910. Atual Casa Firjan.

      Foto 8.3.3: Instituto Nacional de Educação de Surdos. Rua das Laranjeiras, 230 "Esta construção palaciana apresenta um corpo central excepcionalmente bem-composto de estilo renascimento francês com imponente cobertura abobadada em escamas metálicas. Em cada lado do bloco central há duas alas de fachada com um ritmo classicizante arrematadas por corpos laterais levemente mais altos. No térreo intercalam-se avarandados nas alas laterais. A planta francesa se desenvolve em torno de pátios internos." Guia da Arquitetura Eclética do Rio de Janeiro 

      Foto 8.3.4: Sindicato dos Trabalhadores na Indústria do Fumo do Município do Rio de Janeiro (detalhe). Rua Haddock Lobo, 239. "O sindicato ocupa uma antiga residência que, como era típico na classe média, reveste com uma composição decorativa em estuque uma casa convencional." Guia da Arquitetura Eclética do Rio de Janeiro 

      Foto 8.3.5: Edifício Milton, na Rua do Russel, 710. Últimos andares e telhado de mansarda. 

      Foto 8.3.6: Antiga residência de Eduardo Otto Theiler, na Av. Oswaldo Cruz, 4, um dos três últimos remanescentes (junto com o "Castelinho" e o Palacete Seabra) dos palacetes da primeira ocupação da Avenida Beira-Mar, aberta em 1905. Palacete (atual edifício de apartamentos) de 1913 em estilo influenciado pelo renascimento francês projetado por Heitor de Melo. Destaque para os estuques de gárgulas e dragões. 

      4) Neorrenascentista italiano:  Assim como o Louvre constitui o exemplo paradigmático do palácio renascentista francês, o Palácio Pitti de Florença (aqui) seria seu correspondente italiano. São características do neorenascentismo italiano (segundo The Free Dictionary): fachadas simétricas; dois ou três pavimentos, cada um com um tratamento arquitetônico diferente e tipos de janelas diferentes; molduras horizontais entre os pavimentos; cornijas trabalhadas sob o telhado; pilastras; detalhes decorativos rusticados. No Rio temos como representantes do estilo o Palácio do Catete (foto 8.4.1), o Centro Cultural da Justiça Federal (foto 8.4.2) e a fachada lateral do Museu de Belas Artes (foto 8.4.3).

      Foto 8.4.1: Palácio do Catete (Museu da República), antigo Palácio Nova Friburgo. Originalmente em estilo neorrenascentista italiano, foi projetado pelo arquiteto alemão Carl Friedrich Gustav Waehneldt para o barão e baronesa de Nova Friburgo, ricos cafeicultores. 

      Foto 8.4.2: Centro Cultural da Justiça Federal, antigo Supremo Tribunal Federal. Projeto de Adolpho Morales de Los Ríos Filho inspirado nas edificações pontifícias da Renascença. Clube Naval (Av. Rio Branco, 180), inaugurado em 1909, remanescente da primeira geração de prédios da antiga Avenida Central.

      Foto 8.4.3: Fachada lateral do Museu de Belas Artes

      5) Neomourisco: Inspira-se nas construções desenvolvidas pelos árabes na Península Ibérica. Na arquitetura religiosa o exemplar mais notável é a Basílica do Imaculado Coração de Maria do Meier (foto 8.5.1) e na civil o mais exuberante é o Instituto Oswaldo Cruz (foto 8.5.2). Um exemplo de construção menos monumental nesse estilo é o antigo Cine Palácio, que após recente restauração virou o Teatro Riachuelo (aqui). E um exemplo ainda menos monumental é o sobrado que passou a abrigar a Casa do Choro, na Rua da Carioca (aqui).

      Foto 8.5.1: Basílica do Imaculado Coração de Maria (Meier). "A basílica é inspirada na arquitetura mozárabe, manifestação cristã vigente na Península Ibérica do século XVI ainda muito marcada pela tradição artística islâmica. A referência está relacionada à origem espanhola dos padres claretianos e do arquiteto Morales de los Rios. O acesso se faz pelo pórtico sob a torre de 60m de altura. O motivo do arco estrutural em ferradura - de origem visigótica - repete-se na separação entre as três naves no interior do templo." Guia da Arquitetura Eclética no Rio de Janeiro. Ano: 1929.  

      Foto 8.5.2: Castelo Mourisco do Instituto Oswaldo Cruz. Construído entre 1905 e 1918 segundo projeto de Luís de Moraes Júnior, arquiteto responsável pela remodelação da Igreja da Penha, que Oswaldo Cruz conheceu no trem da Leopoldina. Principal edifício eclético de inspiração mourisca do Rio de Janeiro, inspira-se no Palácio de Alhambra, de Granada, ao sul da Espanha. 

      6) Neoegípcio: Um exemplar raro de arquitetura de inspiração egípcia é a casa na Rua Pedro Alves, 40, Santo Cristo (foto 8.6.1).  O prédio do final do século XIX que abrigou a loja O Rei dos Mágicos, na esquina da Rua Ouvidor com Miguel Couto (mas na prática é como se estivesse na Avenida Rio Branco) e conseguiu escapar das demolições para a abertura da então Avenida Central tem sua fachada ornamentada com símbolos da mitologia egípcia (foto 8.6.2).

      Foto 8.6.1: Sobrado neoegípcio na Rua Pedro Alves, 40, no Santo Cristo. Informa o pesquisador Renato Menezes Ramos em seu estudo A Arquitetura Eclética Egipcizante no Rio de Janeiro: "A fachada principal é composta por uma grande quantidade de elementos egípcios, entre eles, o escaravelho (colocado sobre o portão central e ao centro da platibanda), sobre o qual já foi falado. Há a deusa Maat (acima e entre as janelas), que constitui o princípio da verdade, harmonia e da ordem universal. É representada por uma mulher alada. Podem-se observar as pilastras com capitéis palmiformes (as prolongadas, nas extremidades laterais) e lotiformes (nas portas laterais e nas janelas). O deus Rá (sobre as janelas e portas laterais), que constitui o princípio criador. É também a representação do disco solar. E no centro, como eixo de simetria, uma estátua que traz algumas características de Ísis: a deusa mãe do Egito."

      Foto 8.6.2: Detalhe da fachada da antiga loja Ao Rei dos Mágicos, depois Perfumaria Carneiro. Segundo o livro O Rio Que o Rio Não Vê, "A fachada está ornamentada com símbolos da vida e da mitologia egípcias. No gradil encontram-se fundidas diversas materializações atribuídas ao deus solar egípcio Rá: corpo de escaravelho e asas do falcão e serpente. Na sacada estão ainda as esculturas de ferro fundido de duas deidades da mitologia egípcia, uma masculina e outra feminina." 

      7) Neorromânico: O românico foi um estilo medieval pré-gótico, sobretudo de igrejas, ainda com forte influência da arquitetura romana antiga. Você consegue reconhecer uma igreja neorromânica (ainda que não entenda de arquitetura) pelo uso abundante de arcos plenos (semicirculares) funcionalmente (coroando portas e janelas) ou decorativamente. Outra característica dessas igrejas são uma ou duas torres laterais altas. Um templo carioca que reúne esses traços é a Igreja Matriz da Paróquia dos Sagrados Corações, construída em 1936 (foto 8.7.1). Observe que a fachada está cheia de arcos, coroando as portas, encimando as janelas, além da carreira de arcos decorativos sob a cornija do segundo piso. É arco que não acaba mais! Além disso, a igreja tem uma torre lateral.

      Foto 8.7.1: Igreja Matriz da Paróquia dos Sagrados Corações, em estilo neorromânico. Rua Conde de Bonfim, 474 - Tijuca. 

      Outro bonito templo neorromânico é a Igreja de Nossa Senhora da Paz em Ipanema (foto 8.7.2) onde você também observa essa abundância de arcos. Existe um tipo de igreja neorromânica de proporções monumentais e usando tijolos aparentes, como era comum na Roma Antiga.  Um exemplar notável no nível nacional é o Santuário Nacional de Nossa Senhora Aparecida que visitei recentemente, numa viagem que incluiu Taubaté sobre a qual escrevi aqui. No Rio de Janeiro uma igreja neorromânica desse tipo é o Santuário da Medalha Milagrosa na Tijuca (foto 8.7.3). Para ainda mais exemplos de igrejas neorromânicas cariocas veja o álbum ESTILO NEORROMÂNICO (clique em cada uma das fotos para ler as legendas).

      Foto 8.7.2: Igreja Nossa Senhora da Paz. A Praça Nossa Senhora da Paz chamava-se originalmente Coronel Valadares e recebeu seu nome atual quando, encerrada a Primeira Guerra Mundial, ergueu-se em frente a igreja neorromânica de Nossa Senhora da Paz. Com projeto do arquiteto Gastão Baiana, vale a pena ver os vitrais de procedência alemã lá dentro. 

      Foto 8.7.3: Santuário da Medalha Milagrosa (1955), em estilo neorromânico, ao lado do Hospital São Vicente de Paulo, na Tijuca.  

      8) Neomanuelino: Estilo de revivescência do estilo manuelino, que é o gótico português, do século XVI. O exemplo mais perfeito de construção manuelina é o Mosteiro dos Jerónimos lisboeta. No Rio o melhor exemplo é o Real Gabinete Português de Leitura. Na foto abaixo eu justapus detalhes das fachadas do Mosteiro dos Jerónimos (esquerda) e do Real Gabinete (direita), para você ver as semelhanças entre o original e a cópia, digo, revivescência.

      Foto 8.8.1: Detalhes das fachadas do Mosteiro dos Jerónimos em Lisboa (esquerda) e Real Gabinete Português de Leitura no Rio (direita)

      O Liceu Literário Português, no Largo da Carioca, também ostenta uma fachada neomanuelina (foto 8.8.2), embora bem mais discreta que a do Real Gabinete (foto 8.8.3).

      Foto 8.8.2: Liceu Literário Português 

      Foto 8.8.3: Real Gabinete Português de Leitura. Rua Luís de Camões, 30. A maior biblioteca de autores portugueses fora de Portugal, em prédio no estilo manuelino (gótico português) que lembra o Mosteiro dos Jerônimos de Lisboa, existe desde os tempos de Machado de Assis. Aliás, Machado a frequentou, e algumas das primeiras reuniões da Academia (ainda sem sede própria) realizaram-se ali. É inacreditável, é ver pra crer. Parece uma daquelas bibliotecas saídas da imaginação de um Borges. O exterior é revestido em pedra de lioz (pedra calcária branca e dura) portuguesa. O salão de leitura tem pé-direito monumental (23,5m) e deixa aparente a estrutura metálica do prédio, a mais antiga do Brasil. As paredes são recobertas por estantes de ferro e madeira cheias de livros, e o ambiente recebe luz natural pela claraboia de vidro colorido no teto. 

      9) Neobizantino: O epítome do estilo bizantino é a Catedral de Santa Sofia, em Istambul, que um dia pretendo visitar. Este estilo caracteriza-se pelo uso de arcadas (conjuntos de arcos), abóbadas de berço (semicirculares), cúpulas em profusão e decoração de mosaico. O Santuário Basílica de São Sebastião, mais conhecido como Igreja dos Capuchinhos (foto 8.9.1), reúne essas características. Foi construída de 1928 a 1931 para abrigar a imagem do padroeiro da cidade, os restos mortais de seu fundador e o marco de fundação da cidade, antes conservados na Antiga Sé, no morro do Castelo, demolida no início dos anos 1920 (mais sobre essas e outras relíquias cariocas aqui).  

      Foto 8.9.1:  Igreja dos Capuchinhos, na Rua Haddock Lobo, 266 - Tijuca.

      A Igreja Nossa Senhora do Perpétuo Socorro, no Grajaú, reúne características dos estilos românico e bizantino (aqui). neocolonial ocupa uma classificação à parte, fora do eclético, porque surge numa época histórica um pouco posterior, com uma proposta nova. O neoclássico idem, porque vigorou numa época anterior. Outra fonte de inspiração do ecletismo são as diferentes fases da arquitetura francesa. Assim o Renascimento francês inspirou o estilo de revivescência neorrenascentista francês visto acima. Outro estilo com forte presença na arquitetura carioca é o denominado Luís XVI, que é o neoclassicismo francês, que sucedeu ao barroco (Luís XIV) e rococó (Luís XV) e na verdade já emerge ao final do reinado de Luís XV, quando se construiu o Pétit Trianon (aqui).  Um representante perfeito desse estilo é a sede velha da Academia Brasileira de Letras (foto 8.7), inspirada no Petit Trianon construído em 1763 nos parques  de Versalhes. Outros exemplares: 

      • Antiga Polícia Central (foto 8.8). 
      • Casa de Cultura Julieta de Serpa (foto 8.9). 
      • Clube Naval (Av. Rio Branco, 180), de 1908, remanescente da primeira geração de prédios da antiga Avenida Central (aqui). 
      • Copacabana Palace (foto 8.10, bem como aqui e aqui).
      • Edifício da Seguradora Sul América, na Rua da Quitanda, 86 (aqui). 
      • Edifício Octávio Gouvêa de Bulhões da Fundação Getúlio Vargas (foto 8.11). 
      • Edifícios Paraopeba (aquiSão João Marcos (aqui), na Praia de Botafogo, 142 e 148 (colados), que nos anos 1940 eram um dos endereços mais elegantes da cidade.
      • Edifício Praia do Flamengo (no 116 - foto 8.12), bem como mais dois prédios nessa mesma "praia", Edifício Bela Vista (no 314 - aqui e aqui) e Edifício Guauthemoc (no 378 - aqui). 
      • Edifício Santa Helena, na Rua Ronald de Carvalho, 28 (Copacabana - aqui e aqui), cuja portaria tem paredes revestidas de mármore de carrara e piso de mármore de carrara e belga (aqui).
      • Estação Marítima da Praça Mauá (aqui). 
      • Hospital Central do Exército em Benfica (foto 3.13). 
      • Jockey Club Brasileiro, também conhecido como Hipódromo da Gávea (aqui).
        Museu da Imagem e do Som (o antigo, no Centro, que foi um dos pavilhões da Exposição de 1922 - aqui). 
      • Sede do Fluminense em Laranjeiras (aqui). 
      • Serviço de Saúde dos Portos (foto 8.14).
      • Silo n. 2 do Moinho Fluminense, construído em 1927 com elementos do estilo Luís XVI, destoando do resto da fábrica (aqui)

      Foto 8.7: Sede velha da Academia Brasileira de Letras, inspirada no Petit Trianon de Versalhes (mas não uma réplica exata). Originalmente o pavilhão da França na Exposição de 1922, foi doado pelo governo francês à Academia. 

      Foto 8.8: Antiga Polícia Central, futuro Museu da Polícia Civil. Projeto e construção: Heitor de Mello, 1909-1910. Rua da Relação, 40. Estilo Luís XVI. "A construção de prédios bonitos e modernos visava à melhoria da abalada imagem da polícia de então. A esquina é valorizada pela cúpula e pelo tratamento monumental da entrada." (Guia da Arquitetura Eclética do Rio de Janeiro) 

      Foto 8.9: Edifício Octávio Gouvêa de Bulhões da Fundação Getúlio Vargas, antigo Banco Francês e Italiano em estilo Luís XVI (1924).

      Foto 8.10: Casa de Arte e Cultura Julieta de Serpa, antigo Palacete Seabra. "Projeto de 1920 de Luís de Moraes Júnior, mesmo arquiteto do Instituto Oswaldo Cruz e da reforma da Igreja da Penha, o corpo arredondado com cúpula articula-se com o prisma recuado, conforme uma tipologia comum na França do século XVIII". (Guia da Arquitetura Eclética no Rio de Janeiro) Uma matéria de como o colecionador Carlos Alberto Serpa, filho de Julieta de Serpa, salvou o imóvel da demolição pode ser lida aqui

      Foto 8.11: Hotel Copacabana Palace ao anoitecer. Projeto de 1921 do arquiteto francês Joseph Gire, projetista também do Hotel Glória e co-projetista do Edifício A Noite e Palácio Laranjeiras. "Com projeto calcado no Hotel Negresco, de Nice, na Riviera Francesa, o Copacabana Palace, em estilo Luís XVI, é um dos primeiros grandes hotéis construídos à beira-mar." (Guia da Arquitetura Eclética no Rio de Janeiro) Inaugurado em 1923. Tombado nos níveis federal, estadual e municipal. Mais informações aqui

      Foto 8.12: Edifício Praia do Flamengo, também conhecido como Guinle, na Praia do Flamengo, 116, de linhas parisienses. Projeto de 1923 de Joseph Gire. Na mansarda originalmente moravam os empregados domésticos. 

      Foto 8.13: Hospital Central do Exército. Mais informações aqui.

      Foto 8.14: Centro Cultural da Saúde, antigo Serviço de Saúde dos Portos, antes Pavilhão da Estatística na Exposição Internacional de 1922. Estilo Luís XVI, projeto de Gastão Bahiana, 1922. Tinha uma cúpula no centro. 

      E finalmente temos um estilo eclético afrancesado mais genérico, que mistura elementos de diferentes fases & "luíses", como é o caso do Palácio Laranjeiras (foto 8.15), construído de 1909 a 1914, com projeto de Armando da Silva Telles, para a família Guinle, cujas fachadas, segundo Gustavo Reinaldo Alves do Carmo, no estudo O Palácio das Laranjeiras e a Belle Époque no Rio de Janeiro (1909-1914 (acesse aqui), "seguem o rigor formal do Classicismo francês. Existe uma franca inspiração na Renascença francesa e nos chamados estilos Luíses, uma alusão aos desdobramentos do Rococó nas cortes de Luís XIV, Luís XV e Luís XVI. A citação de formas que evocassem os ambientes aristocráticos da França do Antigo Regime foi comum no Ecletismo."  Outro belo exemplo do ecletismo de inspiração francesa é o Palácio Pedro Ernesto (Câmara Municipal - foto 8.16), na Cinelândia. Segundo o Guia da Arquitetura Eclética no Rio de Janeiro, "a fachada voltada para a praça é estilisticamente referenciada na arquitetura francesa da época de Luís XIV a XVI e marcada pela exaltação da simetria com os dois corpos laterais mais altos, a varanda central elevada com colunas duplas e a grande escadaria frontal." Mas não foram só palácios que adotaram o ecletismo afrancesado. Vemos também o estilo em palacetes e casas (por exemplo, foto 8.17). Mais fotos do Palácio Laranjeiras e de outras construções em moldes franceses você encontra no álbum ESTILO ECLÉTICO AFRANCESADO.

      Foto 8.15: Palácio Laranjeiras, construído de 1909 a 1914, com projeto de Armando da Silva Telles, de inspiração francesa, para a família Guinle.

      Foto 8.16: Palácio Pedro Ernesto (Câmara Municipal). "O projeto do Escritório Técnico Heitor de Mello foi desenvolvido por Francisque Cuchet após a morte do titular do escritório. A fachada voltada para a praça é estilisticamente referenciada na arquitetura francesa da época de Luís XIV a XVI e marcada pela exaltação da simetria com os dois corpos laterais mais altos, a varanda central elevada com colunas duplas e a grande escadaria frontal. Internamente o palácio apresenta grande interesse em seu mobiliário, esculturas de Corrêa Lima, pinturas de Visconti e outros. Visitar também os saguões e o plenário coberto por grande vitral desenhado por Rodolpho Chamberlland." Guia da Arquitetura Eclética no Rio de Janeiro

      Foto 8.17: Antigo palacete residencial de 1926 eclético, com ornamentação Luís XVI e elementos classicizantes (frontão e colunas) na esquina das ruas São Clemente com Dezenove de Fevereiro (Botafogo).

      Da Inglaterra temos como influência, além do paisagismo romântico (Campo de Santana, Quinta da Boa Vista, Parque Lage):
      • Palladianismo inglês: estilo arquitetônico derivado da obra do arquiteto renascentista italiano Andrea Palladio e levado para a Inglaterra por Inigo Jones, veio a se tornar muito popular neste país e em suas colônias no século XVIII e continuou evoluindo nos séculos seguintes. No Rio, representam esse estilo a Estação Leopoldina (foto 8.18) e o Palácio da Cidade (foto 8.19), ambos projetados pelo mesmo arquiteto, o escocês Robert Prentice.
      • Arquitetura utilitária inglesa: construções de fachada rústica em alvenaria (ou misto de alvenaria e tijolos), servindo como galpões, trapiches ou prestação de serviços públicos (esgotos, água, etc.). Um exemplo é o antigo trapiche Modesto Leal no Santo Cristo (foto 8.20). Outros exemplos você encontra no álbum ESTILO UTILITÁRIO INGLÊS.
      • Estilo fabril inglês: estilo adotado em fábricas, usando alvenaria ou tijolos aparentes, inspirado na arquitetura fabril inglesa: antiga Fábrica Bangu (foto 8.21), antiga Fábrica Confiança em Vila Isabel (foto 8.22), antiga fábrica da Brahma na Tijuca (aqui), Moinho Fluminense na Zona Portuária (foto 8.23).
      • Estilo eclético anglicizado: Construções em moldes ingleses que não se enquadram em nenhum dos três casos acima. Por exemplo, no governo Pereira Passos foram construídas oito escolas com arquitetura de inspiração inglesa, entre elas a antiga Escola República da Colômbia onde hoje funciona a Superintendência de Direitos da Mulher (foto 8.24). Outros exemplares da arquitetura eclética de linhas inglesas você encontra no álbum ESTILO ECLÉTICO ANGLICIZADO.

      Foto 8.18: Estação Leopoldina, na Avenida Francisco Bicalho, projeto de Robert Prentice, inaugurada em 1926. Observe que o projeto original não foi concluído e que ficou faltando a ala esquerda. A ampla gare interna é coberta por uma estrutura metálica nos moldes da arquitetura ferroviária inglesa (aqui). Desativada em 2002.

      Foto 8.19: Palácio da Cidade, projeto de Robert Prentice de 1937.  Construído para sediar a Embaixada da Inglaterra, na década de 1970 o prédio foi adquirido pela Prefeitura. "Sua imponência e solenidade se adequam aos exuberantes jardins que o emolduram e à paisagem natural ao fundo." Guia da Arquitetura Eclética do Rio de Janeiro 

      Foto 8.20: Antigo Trapiche Modesto Leal (Santo Cristo), armazém de mercadorias exportadas e importadas. 

      Foto 8.21: Antiga Fábrica de Tecidos Bangu, atual Bangu Shopping. "A fábrica foi construída pela Companhia Progresso Industrial do Brasil no terreno do antigo engenho Bangu. Em 1895 foi inaugurada a vila operária com 95 “casas higiênicas” que constitui a origem do bairro atual. Os mais antigos equipamentos urbanos do bairro foram criados em função da fábrica e seus operários. A unidade arquitetônica do conjunto é conferida pelo tijolo aparente que harmoniza a convivência de diferentes referências estilísticas. Sob esse aspecto, Bangu repete outras fábricas brasileiras de tecidos inspiradas na arquitetura fabril inglesa. Parte da ornamentação arquitetônica — arcos, pilares com seus capitéis, dentículos etc. — é constituída por relevos da própria alvenaria. No corpo da fábrica os diferentes blocos e alas convergem para a torre do relógio de quatro mostradores." (Guia da Arquitetura Eclética do Rio de Janeiro) 

      Foto 8.22: Supermercado Extra na antiga fábrica de tecidos. A fábrica de tecidos da canção de Noel Rosa ("Quando o apito da fábrica de tecidos...") era a Companhia de Fiação e Tecidos Confiança Industrial, construída em 1884 e fechada na década de 1960. Tombada em nível federal e municipal, abriga agora o Supermercado Extra. A fábrica seguiu a tipologia industrial inglesa. 

      Foto 8.23: Moinho Fluminense. "O prédio principal tem uma bela fachada industrial de feição inglesa ritmada pelos seis níveis de janelas em arco abatido abertas na alvenaria aparente. No centro, sob o frontão, uma grande vão com arco pleno da altura de seis andares contracena com delicadas passarelas e gradil de ferro fundido." Guia da Arquitetura Eclética do Rio de Janeiro 

      Foto 8.24: Superintendência de Direitos da Mulher na antiga Escola República da Colômbia em um estilo de inspiração inglesa compartilhado por uma série de escolas construídas na administração Pereira Passos, entre elas a Deodoro, Tiradentes, Prudente de Morais e Alberto Barth, e que se contrapõe à arquitetura Beaux Arts de inspiração francesa. 

      De inspiração italiana temos (além do estilo de revivescência neorrenascentista já citado): 
      • Antiga Società Italiana di Beneficenza e Mutuo Soccorso (foto 8.25).
      • Antigo Banco Ítalo-Belga, na Rua da Quitanda, 129, esquina com Presidente Vargas (aqui).
      • Batalhão de Polícia de Choque, na Cidade Nova, onde, segundo o Guia da Arquitetura Eclética no Rio de Janeiro, o estilo italiano dominante se conjuga com as ameias, torre e torreões de vigia que anunciam a função militar do edifício"  (aqui).
      • Edifício Lage na Rua do Russel (foto 8.26, bem como aqui e aqui).
      • Edifício Seabra na Praia do Flamengo (foto 8.27).
      • Escola de Música (foto 8.28).
      • Igreja de Santo Inácio do colégio de mesmo nome (foto 8.29).
      • Palacete do Parque Lage (aqui).

        Foto 8.25: Antiga Societa Italiana di Beneficenza e Mutuo Soccorso (Sociedade Italiana de Beneficência e Socorro Mútuo), casa projetada e construída pela Antônio Januzzi, Irmão Cia em 1906. Praça da República, 17.  

        Foto 8.26: Edifício Lage. Rua do Russel, 300. Fachada de inspiração italiana. "Sua composição é marcada por frisos verticais e janelas que alternam peitoril fechado e guarda-corpo de ferro trabalhado." Guia da Arquitetura do Rio de Janeiro 

        Foto 8.27: Edifício Seabra, na Praia do Flamengo, 88. "A utilização de elementos da linguagem toscana em edifício com grande número de pavimentos é rara no ambiente carioca." Guia da Arquitetura Eclética do Rio de Janeiro 

        Foto 8.28: Escola de Música da UFRJ na Rua do Passeio com fachada de 1919. "O estilo italiano faz referência ao país cuja música mais intensamente influenciou a brasileira no século XIX e início do século XX." Guia da Arquitetura Eclética do Rio de Janeiro

        Foto 8.29: Igreja de Santo Inácio, do colégio de mesmo nome. A Igreja Santo Inácio começou a ser erguida em 1909, em 1913 começou a receber moradores da região e alunos em suas missas, mas as obras só acabaram em 1935. Fachada inspirada na basílica San Giorgio Maggiore (aqui), projetada por Andrea Palladio, em Veneza, na qual um frontão triangular apoiado sobre dois pares de colunas, à maneira de um templo clássico, foi conjugado à fachada de um prédio dividido em três naves, segundo o estudo "Arquitetura, iconografia e devoção: a igreja de Santo Inácio e Nossa Senhora das Vitórias da cidade do Rio de Janeiro" de Cesar Augusto Tovar Silva que pode ser acessado aqui. "Conferem monumentalidade: frontão, colunas coríntias, a simetria entre os elementos da fachada e a cúpula." Guia da Arquitetura do Rio de Janeiro  

        De inspiração holandesa temos, segundo informações do site O RIO QUE O RIO NÃO VÊ (aqui):
        • prédio na Av. Rio Branco, esquina com Rua do Rosário, onde até 1990 ficava o Café e Bar Simpatia, com ornamentação de cerâmica de vivo colorido (aqui)
        • sobrado da Avenida Henrique Valadares, 149, antiga sede da União dos Proprietários de Marcenarias  (aqui - prédio do meio)
        • Studio do Cais, na Rua Equador, 476, pertinho da Rodoviária (foto 8.30).

        Foto 8.30: Studio do Cais, na Rua Equador, 476, pertinho da Rodoviária.

        De inspiração alemã temos o prédio de planta triangular do Largo do Curvelo, Santa Teresa (foto 8.31) e o Espaço Cultural dos Correios, no Centro (foto 8.32), ambos com "pseudo-torres" encimadas por cúpulas.

        Foto 8.31: Prédio de planta triangular com cúpula em estilo alemão no Largo do Curvelo (Santa Teresa).

        Foto 8.32: Centro Cultural Correios

        De inspiração portuguesa temos, além das construções neomanuelinas citadas, a Casa da Vila da Feira e Terras de Santa Maria (foto 8.33), na Rua Haddock Lobo, 195 (Tijuca), "clube com extravagante decoração carregada que 'fala' a origem portuguesa de seus sócios", segundo o Guia da Arquitetura Eclética do Rio de Janeiro, e o Palácio São Clemente, na rua de mesmo nome, palacete construído para ser a embaixada portuguesa e que, embora de meados do século XX, "tem a fidalguia de uma residência lusitana do século XVIII", segundo o guia citado (foto 8.34). Mais fotos no álbum ESTILO ECLÉTICO LUSITANIZADO

        Foto 8.33: Casa da Vila da Feira e Terras de Santa Maria na Rua Haddock Lobo, 195 (Tijuca). Tombada pelo Município. "Clube com extravagante decoração carregada que 'fala' a origem portuguesa de seus sócios." (Guia da Arquitetura Eclética do Rio de Janeiro) "na sua janela de baixo a serralheria das grades representava um imenso pavão fazendo roda, cauda toda de ferro e corpo e cabeça e bico e crista de metal amarelo e polido." Pedro Nava, Balão Cativo, Capítulo III: Engenho Velho.

        Foto 8.34: Palácio São Clemente (Consulado de Portugal). "O palacete da Rua São Clemente tem a fidalguia de uma residência lusitana do século XVIII. Chama a atenção de quem passa e parece um patrimônio secular. Porém, a residência do cônsul de Portugal no Rio é mais recente do que se supõe. Erguida com o apoio da comunidade portuguesa no país para servir de embaixada, a mansão foi concluída apenas em 1961." Arquitetos: Irmãos Rebello de Andrade. Construído para ser a embaixada de Portugal, com a transferência da capital para Brasília tornou-se a residência do cônsul português no Rio e às vezes abriga eventos, exposições.

        Temos ainda as construções ecléticas no sentido estrito, que mesclam elementos de diferentes fontes, por exemplo, a capela do Quartel-General da Polícia Militar na Rua Evaristo da Veiga que mistura elementos góticos com clássicos (foto 8.35), a casa roxa na Rua General Dionísio, Botafogo, com elementos clássicos (colunas), um pouco da ondulação do art nouveau e algo do estilo Luís XVI (foto 8.36), o "castelinho" da Rua Fonseca Guimarães, Santa Teresa (foto 8.37), a Villa Alice, na Rua Joaquim Murtinho, 552, Santa Teresa,  que mescla art nouveau com neogótico (foto 8.38 e aqui), o Grande Templo Israelita (aqui), que mescla elementos da arquitetura de origem hebraica e das ordenações clássicas (colunas) e o Museu Histórico da Cidade, no Parque da Cidade, atualmente em restauração, que embora originalmente fosse uma casa de campo colonial (1809), recebeu no final do século XIX um segundo andar e, no início do século XX, varandas sustentadas por estruturas metálicas (foto 8.39).

        Foto 8.35: Capela da Arquiepiscopal Irmandade Imperial Nossa Senhora das Dores, padroeira da Polícia Militar, de 1871, em estilo que mescla elementos góticos com clássicos. Situada no Quartel-General da Polícia Militar. No local ficava originalmente o convento dos barbadinhos italianos, que com a vinda da Família Real tiveram de ceder suas instalações aos carmelitas desalojados do Largo do Paço (Praça XV), que por sua vez acabaram se transferindo para a Lapa onde estão até hoje.  Em 1809 instalou-se ali a Guarda Real de Polícia, substituída em 1831 pelo Corpo de Permanentes Municipais, que em 1858 ficou sendo o Corpo Policial da Corte até a Proclamação da República. Três dias antes de ser deposto, D. Pedro II lançou a pedra fundamental do prédio novo, o atual, concluído no começo da República. Informações de Brasil Gerson, História das Ruas do Rio.

        Foto 8.36: Casa roxa eclética, com elementos clássicos (colunas), um pouco da ondulação do art nouveau e algo do estilo Luís XVI (Botafogo).

        Foto 8.37: Castelinho de 1888 na Rua Fonseca Guimarães, 55 (Santa Teresa). As estátuas dos pajens ao lado da porta, das Fundições Val d'Osne, são tombadas pelo Município. Embora os guias de arquitetura o considerem de estilo neogótico, não vejo traços de gótico, ao contrário, vejo um total ecletismo, com mistura de elementos díspares.

        Foto 8.38: Villa Alice - Rua Joaquim Murtinho, 552 (Santa Teresa). Observe o prisma octogonal com cúpula, formando um pórtico de acesso à casa, os elementos decorativos art nouveau e a referência ao gótico nos arcos ogivais do pórtico e das janelas.

        Foto 8.39: Museu da Cidade, antigo solar da chácara de verão do Marquês de São Vicente (1809), ampliado pelo Conde de Santa Marinha que adquiriu o imóvel em 1889, recebendo o acréscimo do segundo pavimento e, no início do século XX, a varanda em estrutura metálica. Pertenceu ainda à família Guinle que em 1939 vende a propriedade à Prefeitura. Em processo de restauração.

        Existem construções ecléticas onde o toque pessoal do arquiteto é tão forte que não se enquadram em nenhum outro subestilo, por exemplo, a Igreja de Nossa Senhora de Lourdes, projetada por Virzi, em Vila Isabel (foto 8.40) ou a antiga residência de Frederico Figner, pioneiro da indústria fonográfica, atual ARTE SESC (aqui). Há também construções ecléticas que, embora apresentem certa homogeneidade estilística, não se enquadram em nenhum dos subestilos predominantes (fotos 8.41-44), ou ainda aquelas sem estilo definido (geralmente casas e sobrados, como aqui, aqui, aqui, aqui, aqui, aqui, aqui, aqui, aqui, aqui, aqui, aqui), com destaque para o chamado "ecletismo popular" de casas e sobrados residenciais ou comerciais – ver álbum ESTILO ECLÉTICO POPULAR).  E finalmente temos, no final dos anos 1910 e na primeira metade dos anos 1920, uma geração pré-onda art déco de edifícios relativamente altos (o maior, Hotel Itajubá, tinha 12 pavimentos, além do térreo), ainda com fachadas decoradas, continuando a tendência dos sobrados ecléticos da virada do século – ver álbum ESTILO ECLÉTICO (PRÉDIOS) e postagem QUAL FOI O PRIMEIRO ARRANHA-CÉU DO RIO?

        Foto 8.40: Igreja Nossa Senhora de Lourdes. Av. 28 de Setembro, 200 (Vila Isabel). "É na solução decorativa inovadora, não-historicista e antiacadêmica que reside seu maior interesse." Guia da Arquitetura Eclética do Rio de Janeiro. Projeto de Antônio Virzi de 1928.

        Foto 8.41: Casa dos Poveiros - Rua do Bispo, 302 (Rio Comprido). Antigo palacete do seu Almendra que "faturava fortunas com um pêndulo de cristal", como narra Pedro Nava em Chão de Ferro. Comentário do arquiteto Hélio Brasil: "A colagem de elementos na fachada, acho eu, é que matou o ecletismo. Um certo excesso. Deu no "Bolo de Noiva", p ex. Curioso, mas horroroso. Bem articulado como esquina, pero... Esse "verdinho" que nos mandou é até gozado. Vale uma análise mais acurada, sobretudo o trabalho nas vergas das janelas. Devo esta..." 

        Foto 8.42: Estação das Barcas, em estilo eclético misto que lembra os grandes palácios de exposições.

        Foto 8.43: Castelinho da Praia do Flamengo (1916) , atual Centro Cultural Oduvaldo Vianna Filho, um dos últimos remanescentes da primeira geração de casarões da antiga Praia do Flamengo. "Uma composição simétrica em relação a um eixo oblíquo. Dois corpos quase iguais e ortogonais se articulam pelo torreão fortemente vertical coberto por telhado agudo.” Guia da Arquitetura Eclética do Rio de Janeiro

        Foto 8.44: Palácio Guanabara. Construído em 1853, como resistência familiar, foi vendido para a família imperial em 1864. A residência foi reformada para abrigar a Princesa Isabel e o Conde D’Eu, passando a ser conhecida como Paço Isabel. Durante a reforma, o casal plantou inúmeras espécies vegetais exóticas, além de uma fileira dupla de palmeiras imperiais na Rua Paissandu, que marcava o caminho do Paço até a praia do Flamengo. Em 1890, o Paço Isabel foi incorporado ao Patrimônio da União e rebatizado como Palácio Guanabara. Em 1908 passou por uma reforma radical que lhe deu o aspecto (eclético) atual. Foi repartição militar, morada de Presidentes da República, abrigou o gabinete do Prefeito do Rio e, em 1960, passou a ser sede do Governo do Estado.

        9) Art Nouveau
        Art nouveau foi um estilo de design e arquitetura muito popular na belle époque que explorou materiais novos como o ferro e o vidro e avanços nas artes gráficas. Seu maior expoente foi o espanhol Antoni Gaudí. Procurou referências nas tradições barroca, gótica e mourisca, mas sem fixar regras. Caracteriza-se por formas sinuosas e fluidas. Segundo Marcio Roiter, do Instituto Art Déco Brasil, é um estilo assimétrico, com  fluidez de linhas e forte inspiração da natureza. Segundo o arquiteto Hélio Brasil, é “como se você construísse um emaranhado geométrico e, depois, sobre ele, usasse as caprichosas curvas da natureza, lembrando as tramas da vegetação, com folhas e flores estilizadas”.  No Rio o exemplar mais notável do art nouveau foi a Fábrica do Elixir de Nogueira, projeto de Antonio Virzi, construído em 1916, tombado em 1968, destombado (!) e demolido em 1970 (ver aqui). Para o proprietário do elixir, Gervásio Renault da Silveira, esse mesmo arquiteto construiu o Villino Silveira (Rua do Russel, 734, Glória, ao lado do prédio da Manchete - foto 9.1, bem como aqui e aqui), esse tombado pra valer, um "um dos raríssimos exemplares cariocas em que o art nouveau não foi apenas um estilo decorativo superficial aplicado sobre paredes e mobiliário, mas efetivamente um princípio arquitetônico", segundo o Guia da Arquitetura Eclética no Rio de Janeiro. Outro desses raríssimos exemplares é o anexo da Casa de Artes Paquetá, inspirado no art nouveau de Gaudí (foto 9.2, bem como no álbum ESTILO ART NOUVEAU).  Algumas casas em Santa Teresa apresentam ornamentação art nouveau, como as de números 598 (aqui) e 616 (aqui) na Rua Joaquim Murtinho e a Villa Alice, já abordada sob o ecletismo por mesclar art nouveau com neogótico.  A "cauda de pavão" formada pelas janelas de vitrais da fachada da Casa Franklin (Avenida Passos, 36 - foto 9.3) também tem inspiração art nouveau. Recentemente descobri uma casa na Rua General Dionísio, 53, Humaitá, que embora semiencoberta pela folhagem do jardim dianteiro, revela seu espírito art nouveau na grade do muro (aqui), vitrais (aqui) e portal da varanda (foto 9.4).  Até nos "confins" de Santa Cruz achei uma casinha com elegantes linhas art nouveau, a Vila Joanna (foto 9.5).  O Cinema Íris (cinema centenário na Rua da Carioca, 49 que atualmente exibe filmes pornô - ver postagem CINEMA ÍRIS neste blog) e a Confeitaria Colombo exibem elementos art nouveau na decoração interna: o cinema, nos azulejos (foto 9.6), grades (aqui) e painéis de madeira (aqui) e a confeitaria, especialmente nos vitrais da claraboia (foto 9.7). A cúpula do Restaurante Albamar, já visto na seção Estilo Industrial, também apresenta um traçado art nouveau, como mostra a foto 9.8. Finalmente, embora especialistas afirmem que a influência do art nouveau na arquitetura carioca foi discreta, que "pouco houve no Brasil de art nouveau" (Marcio Roiter), discordo com base na minha observação, em andanças pela cidade, de que muitas casas rotuladas como ecléticas exibem elementos art nouveau, de forma mais diluída, menos ostensiva que nas exuberantes construções art nouveau europeias, mas mesmo assim a influência da estética art nouveau transparece. Por exemplo, o clássico formato de portas e janelas em três seções formando um todo arredondado, do qual um exemplo paradigmático pode ser visto nesta foto tirada em Praga, foi muito utilizado, em versões mais ou menos simplificadas, em diversas casas Rio afora, como você pode ver na foto 9.9, de uma singela casinha numa ladeira que sobe para Santa Teresa, na foto 9.10, de uma fachada no Largo do Machado, na casa da Rua Joaquim Murtinho, 616, já mencionada, bem como aqui, aqui, aqui, aqui (sacada), aqui, aqui, aquiTambém nestas janelas geminadas julgamos ver certa influência art nouveau, embora diluída (mas se você discorda por favor contacte o editor do blog no Facebook): foto 9.11, foto 9.12 e aquiaquiaquiaquiaquiaquiaquiaquiaquiaqui (falsa janela), aquiaquiaqui. E se ainda não se cansaram do tema, convido-os para uma olhada no álbum ESTILO ART NOUVEAU onde verão estes e ainda outros exemplos da influência art nouveau na arquitetura carioca.       

        Foto 9.1: Villino Silveira, projeto de Antônio Virzi de 1915. "Um dos raríssimos exemplares cariocas em que o art nouveau não foi apenas um estilo decorativo superficial aplicado sobre paredes e mobiliário, mas efetivamente um princípio arquitetônico." (Guia da Arquitetura Eclética no Rio de Janeiro)

        Foto 9.2: Casa de Arte Paquetá: anexo inspirado no art nouveau de Gaudí. 

        Foto 9.3: Casas Franklin (1911). "As janelas com vitrais formam uma grande cauda de pavão de onde alça voo uma águia de bronze que, originalmente, levava uma luminária no bico." Guia da Arquitetura Eclética no Rio de Janeiro. Para uma foto da fachada inteira clique aqui

        Foto 9.4: Varanda art nouveau de casa do Humaitá 

        Foto 9.5: Villa Joana em Santa Cruz, com elegantes linhas art nouveau. 

        Foto 9.6: Azulejos art nouveau no Cinema Íris

        Foto 9.7: Claraboia art nouveau da Confeitaria Colombo

        Foto 9.8: Traçado art nouveau na cúpula do Restaurante Albamar.

        Foto 9.9: Art nouveau na Ladeira Frei Orlando que sobe para Santa Teresa.

        Foto 9.10: Janela art nouveau no Largo do Machado.

        Foto 9.11: Casa com linhas art nouveau em Ramos. 

        Foto 9.12: Vila Aymorés, conjunto de dez casas ecléticas (com toques art nouveau) construídas na primeira década do século XX que sofreram um forte processo de degradação mas foram restauradas para abrigar escritórios comerciais. 

        10) Neocolonial
        A arquitetura neocolonial foi um estilo ligado ao movimento nacionalista dos anos 20 que reinterpretou o estilo colonial brasileiro à luz da modernidade, numa reação à arquitetura importada da Europa. Segundo Carlos Kessel, em "Estilo, Discurso, Poder: Arquitetura Neocolonial no Brasil", "caracteriza-se por uma estilização do velho estilo colonial. Nascido da reação contra o ecletismo dominante nos primeiros anos deste século, o neocolonial encontrou sua justificativa na ânsia de buscar, nas formas construtivas tradicionais do Brasil, uma arquitetura que pudesse ser definida como genuinamente autóctone."  As principais características nas fachadas neocoloniais são o uso de azulejos (letra A na foto abaixo, da capela do Hospital Gaffrée e Guinle, na Tijuca), pináculos ou coruchéus (B), beirais e frontões ondulados (C), telhas como elementos da ornamentação (na foto abaixo, no coroamento da torre sineira, letra D), volutas ocasionais (E), sacadas (por exemplo, na foto 10.2) e pátios internos.

        Foto 10.1: Capela de N. S. da Conceição do Hospital Gaffrée e Guinle, na Tijuca ilustrando as características do estilo neocolonial

        O Museu Histórico Nacional, embora preserve partes da antiga Casa do Trem e Arsenal de Guerra coloniais, possui acréscimos neocoloniais (foto 10.2). Outros prédios neocoloniais notáveis são o Instituto de Educação , a mais importante obra do neocolonial carioca, com projeto escolhido por um concurso, cujo edital especificava essa opção estilística, como informa o Guia da Arquitetura Eclética no Rio de Janeiro (Rua Mariz e Barros, 273, Tijuca - aqui), o Hospital Gaffrée e Guinle (foto 10.3) e a sede do clube futebolístico Vasco da Gama (foto 10.4). 

        Foto 10.2: Pátio de Santiago, Museu Histórico Nacional. O conjunto composto da Casa do Trem (1762) e Arsenal de Guerra (1764) foi reformado e "aformoseado" para abrigar o Palácio das Indústrias na Exposição de 1922, dando depois origem ao Museu Histórico Nacional.

        Foto 10.3: Hospital Universitário Gaffrée e Guinle, à Rua Mariz e Barros, 775 (Tijuca). A fachada dos fundos do hospital pode ser vista aqui

        Foto 10.4: Fachada do Estádio Vasco da Gama (mas conhecido como Estádio São Januário). "Fundado no dia 21 de abril de 1927, o Estádio Vasco da Gama acabou ficando mais famoso como São Januário, que é o nome de umas das principais ruas que levam ao estádio. O estádio é a principal sede do Vasco. Construída numa área de 56 mil metros quadrados e situada à Rua General Almério de Moura, 131, no bairro Vasco da Gama, o complexo conta com estádio, ginásio, parque aquático e setor administrativo." Mais informações aqui

        Além do já citado instituto que agora se chama Instituto Superior de Educação do Rio de Janeiro, várias escolas municipais adotaram o estilo: Escola Uruguai, na Rua Ana Néri, 192 (Benfica, 1930 - aqui), Escola Estados Unidos, na Rua Itapiru, 453 (Catumbi, 1930), Escola Sarmiento, na Rua 24 de Maio, 931 (Engenho Novo, 1929 - foto 10.5), Escola Henrique Dodsworth, na Av, Epitácio Pessoa, esquina com Rua Redentor (Ipanema, 1943), Escola Soares Ferreira (Av. Maracanã, 450 (Tijuca, 1927 - aqui). Também o antigo Colégio Arte e Instrução, em Cascadura, que encerrou suas atividades no final de 2013 e foi uma das escolas mais importantes na formação de inúmeras gerações na região, adotou esse estilo (foto 10.6).

        Foto 10.5: Escola Municipal Sarmiento em estilo neocolonial, construído em 1929. Observe a sacada com gradil e o mapa do Brasil em painel de azulejos à direita.

        Foto 10.6: Antigo Colégio Arte e Instrução em estilo neocolonial (Cascadura). Segundo Washington Fajardo, "o edifício é um belo exemplar da arquitetura neocolonial. Na época do Estado Novo, as escolas precisavam, por meio da arquitetura, passar uma mensagem nacionalista forte. O edifício do Colégio Arte e Instrução é um exemplo disso. O imóvel é uma referência no bairro de Cascadura e na região de Madureira". Tombado em 2015 (ver aqui). 

        No Largo do Boticário (Cosme Velho - foto 10.7) temos um conjunto de casas que, nos anos 1920-40, foram construídas ou reformadas dentro de uma estética neocolonial então em voga, empregando materiais de casas demolidas no Centro, inclusive para a abertura da Avenida Presidente Vargas. Depois de um longo período de abandono, passou por obras de revitalização que preservaram as fachadas do casario, e desde julho de 2022 abriga um hotel. Mais informações sobre o largo e sua história você encontra aqui.

        Foto 10.7: Largo do Boticário. "O Largo do Boticário é lindo, mas... é recente. Foi construído por ideia e mando de D. Sylvinha de Bittencourt, mulher do então dono do Correio da Manhã, Paulo Bittencourt, na década de 40, usando material de demolição das casas centenárias postas abaixo pelo prefeito Henrique Dodsworth. O Largo original, onde o atual foi construído, era um lugar pobre que ganhou o nome por causa de um farmacêutico de então, que lá viveu. Dele, sobrevivem as belas árvores da entrada." (Francisco Daudt)  

        Outras casas residenciais, além daquelas do famoso largo, adotaram o neocolonial, algumas delas na Urca, bairro cuja ocupação, possibilitada por um aterro, deu-se na década de 1920, em plena vigência do neocolonial. Por exemplo, os casarões das fotos 10.8-9. 

        Foto 10.8: Casarão neocolonial na Rua Ramon Franco, 87 (Urca), com frontão ondulado, treliças nas sacadas e num trecho do muro,  azulejos, pináculos, telhas compondo a ornamentação, ou seja, os elementos definidores do estilo. 


        Foto 10.9: Casarão neocolonial na Av. Portugal, 716 (Urca), com portada neobarroca com uma estilização dos oratórios coloniais no frontão e emprego abundante de telhas. 

        Um elemento da arquitetura colonial retomado em umas poucas construções do neocolonial é o muxarabi ou rótula. de origem mourisca, trazido de Portugal pelos colonizadores, foi proibido por motivos estéticos em 1808 pelo Intendente-Geral da Polícia Paulo Fernandes, já que "além de serem incômodas, prejudiciais à saúde publica, interceptando a livre circulação do ar, estão mostrando a falta de civilização dos seus moradores" (Padre Perereca). No Largo do Boticário temos talvez o único exemplar autêntico, colonial, de muxarabi sobrevivente, que você pode ver aqui. As alas neocoloniais do Museu Histórico Nacional (pois existe a parte autenticamente colonial também) utilizam muxarabis estilizados (aqui).  Mas a reprodução moderna mais perfeita de um muxarabi encontrei na bonita casa neocolonial da Rua Domício da Gama (Tijuca) mostrada na foto 10.10.

        Foto 10.10: Bonita casa neocolonial com muxarabis estilizados sob os dois frontões e elegante pórtico, na Rua Domício da Gama (Tijuca). Mais detalhes sobre esta maravilha no blog do meu amigo Fabio Carvalho clicando aqui. 

         Na arquitetura religiosa temos:
        • Igreja de Santa Maria Margarida (Rua Frei Solano, 23, Lagoa - foto 10.11 e aqui).
        • Igreja de Nossa Senhora do Brasil (Av. Portugal, 772, Urca - foto 10.12).
        • Igreja de Nossa Senhora da Lampadosa (Av. Passos, 15, Centro - foto 10.13).
        • Capela de Santa Teresinha no jardim do Palácio Guanabara (Laranjeiras - foto 10.14).

        Foto 10.11: Igreja Matriz Santa Margarida Maria (Lagoa). A Igreja foi construída em 1939, por uma congregação holandesa do Sagrado Coração de Jesus. Tem estilo neocolonial tardio, com as paredes internas pintadas em azul e rosa, e adornadas por oito colunas altíssimas ao longo da nave. 

        Foto 10.12: Igreja de Nossa Senhora do Brasil na Urca, interpretação original, que não segue estritamente o "modelo", do estilo neocolonial. A ondulação, normalmente no frontão ou beiral, aqui se encontra na parte inferior do prédio, onde estão as escadas de duplo acesso e o pátio diante da portada elevada. Projeto de Frederico Faro Filho de 1932, construída em 1934. "A colocação do salão paroquial no térreo eleva a pequena igreja em relação à rua e oferece boa solução de distribuição para o terreno exíguo. No interior há nave única com ornamentação copiada do vocabulário barroco ibero-americano. A construção desta igreja dedicada a uma invocação marcadamente nacionalista da Virgem Maria corresponde ao momento inicial de ocupação da Urca e ao apogeu do neocolonial." (Guia da Arquitetura Eclética no Rio de Janeiro) 

        Foto 10.13: Igreja de Nossa Senhora da Lampadosa. A construção setecentista (aqui) foi demolida em 1929 para dar lugar a uma igreja em estilo neocolonial, com influência da arquitetura mexicana. 


        Foto 10.14: Capela Santa Teresinha, do Palácio Guanabara,  em estilo neocolonial, construída em 1946 a pedido de Carmela Dutra, a esposa do então Presidente. 

        Estas e outras fotos representativas do neocolonial você pode ver no álbum ESTILO NEOCOLONIAL
        Além do estilo neocolonial luso-brasileiro a que nos referimos (e quando a gente fala "neocolonial" puramente, subentende-se o luso-brasileiro), esteve também em voga nos anos 20 e 30 um estilo neocolonial hispano-americano, conhecido como estilo Missões ou Mexicano, cujo principal exemplar no Rio é a sede do clube Botafogo (foto 10.15). 

        Foto 10.15: Sede do Botafogo (1928). Projetado pelos arquitetos Archimedes Memória e Francisque Cuchet em estilo Missões (neocolonial hispano-americano). Tombado pelo Município. "Na sede do Botafogo, os arquitetos adotam o estilo missões, inspirado na arquitetura colonial da América espanhola tal como fora interpretada nos Estados Unidos, com pequenas referências à arquitetura colonial portuguesa." (Enciclopédia Itaú Cultural) 

        O estilo Missões também foi muito empregado em casas e prédios em diferentes bairros do Rio. São características do estilo Missões:

        torre circular com telhado de beiral

        parede com superfície irregular, texturizada

        alpendre com entrada em arco

        muro coberto de telhas

        frontão arqueado recoberto de telhas e ornado com um pequeno painel de azulejos, geralmente de temática religiosa

        colunas, muitas vezes torsas ou salomônicas (espiraladas)

        Dificilmente uma casa reunirá todos esses elementos, por exemplo, se tiver uma torre circular, não terá o frontão arqueado, e vice-versa, como você pode ver nas fotos 10.16-17 abaixo, mas a parede texturizada é um elemento universal, obrigatório no estilo Missões (conquanto mais tarde a casa possa ter sido descaracterizada e recebido uma nova pintura sem esse traço), e o frontão arqueado é a característica mais comum, sobretudo nas casinhas de subúrbio. Tudo isso você pode conferir no álbum ESTILO MISSÕES.

        Foto 10.16: Casinha no Grajaú em estilo Missões.

        Foto 10.17: Casa em Ipanema em estilo Missões.

        11) Normando
        Estilo muito empregado na construção de casas nas décadas de 1930-40 (e também no Quitandinha de Petrópolis - ver aqui) que evoca as construções da região da Normanda, na França. Sua característica mais evidente é o enxaimel, que é uma estrutura de madeira aparente na fachada, também muito típica das construções alemãs. Só que o “enxaimel” das casas cariocas não é realmente de madeira, e sim estilizado, simulado (em argamassa), como neste prédio do Alto da Boa Vista (foto 11.1), neste da Urca (foto 12.2) e neste casarão que ainda sobrevive em Copacabana (foto 12.3). Outras construções cariocas neste estilo você encontra no álbum ESTILO NORMANDO.

        Foto 11.1: Prédio com uma parte saliente em estilo enxaimel alemão tradicional na Rua Boa Vista.

        Foto 11.2: Castelinho" normando na Urca. 

        Foto 11.3: Casarão em estilo normando, no início da Rua Santa Clara que pertenceu a Pedro Calmon.

        12) Art Déco
        São famosos em Nova York o Empire State Building e Chrysler Building em estilo art déco, um estilo moderno, futurista. O que pouca gente sabe é que o Rio é a capital do art déco da América Latina, com centenas de construções neste estilo – segundo Marcio Roiter, seriam mil (ver aqui)! O art déco é um estilo decorativo e arquitetônico lançado na Exposition Internationalle des Arts Décoratives et Industrielles Modernes, em Paris, em 1925. Trata-se de um estilo moderno, embora anterior ao movimento modernista em arquitetura. Caracteriza-se pelas linhas geométricas e contornos aerodinâmicos. Segundo o arquiteto Hélio Brasil, a geometria “cubista” — isto é, o arranjo de volumes sugerindo uma superposição de prismas em contraste com vazados das varandas — é recorrente no art déco, além das formas mais puras (losangos, quadrados, etc) em desenho aplicado nas superfícies.  Esse geometrismo do art déco é bem acentuado nas duas construções mostradas nas fotos seguintes, bem como aqui, aqui, aqui

        Foto 12.1: Prédio art-déco de linhas bem geométricas na Rua Áurea, esquina com Rua Tenente Maurício de Medeiros (Santa Teresa). Atrás a Igreja de Santa Teresa.

        Foto 12.2: Residência Horácio Mendes de Oliveira Castro Filho, na Avenida Epitácio Pessoa, 2500 (Lagoa) de 1933. "Exemplar art déco de franca inspiração racionalista, esta edificação caracteriza-se pela justaposição e interpenetração de formas cilíndricas e cúbicas" (Guia da Arquitetura Art Déco no Rio de Janeiro). À direita a Casa Eva Klabin, que nada tem a ver com art déco, mas que pegou uma carona na foto. 

        A terceira geração de edifícios do Rio de Janeiro – a primeira são as construções afrancesadas da recém-aberta Avenida Central e a segunda, os prédios com fachadas decoradas, no espírito dos sobrados ecléticos, do final dos anos 1910 e anos 1920, do Centro e bairros da Zona Sul carioca  (aqui seguiu o estilo art déco. Entre eles, o primeiro arranha-céu da Avenida Rio Branco, o Edifício Guinle (aqui) e o primeiro a ultrapassar a barreira dos vinte pavimentos, de proporções monumentais para a época, o Edifício A Noite (foto 12.3). Uma história das três primeiras gerações de arranha-céus cariocas você encontra na postagem QUAL FOI O PRIMEIRO ARRANHA-CÉU DO RIO?  
        Foto 12.3: Edifício A Noite & Barão de Mauá. Segundo o Guia da Arquitetura Art Déco no Rio de Janeiro, "primeiro verdadeiro arranha-céu da cidade, o edifício se destaca pela imensa massa vertical de vinte e dois pavimentos". 

        Copacabana, sobretudo a área em torno do Lido, abriga um conjunto significativo de prédios art déco, já que na época do adensamento de sua população o estilo vivia seu apogeu. Entre eles, o Edifício Guahy, de fachada angulosa (foto 12.4), Edifício Itahy, com imponente pórtico de entrada (foto 12.4) e o Edifício Itaoca, também com bonito pórtico (o prédio, foto 12.4  e o pórtico aqui). 

        Foto 12.4: Edifício Guahy na Rua Ronald de Carvalho, 181 (1932).

        Foto 12.5: Edifício Itahy: portão de acesso em ferro batido com desenhos de algas estilizadas, emoldurado por sofisticados painéis corrugados de majólica (cerâmica esmaltada) verde.

        Foto 12.6: Edifício Itaoca, na Rua Duvivier, 43.

        Outras construções art déco de destaque são o Palácio Duque de Caxias e, ao seu lado, o prédio da Central do Brasil (foto 12.7), o edifício da antiga Mesbla (foto 12.8), a sede do Clube dos Democráticos (aqui), o Edifício Biarritz, de influência francesa, com seus balcões curvos, na Praia do Flamengo (aqui e foto 12.9), o Edifício Ipu, de inspiração náutica, na Glória (aqui).


        Foto 12.7: Central do Brasil e Palácio Duque de Caxias


        Foto 12.8: Torre do prédio da antiga Mesbla, ícone da arquitetura art déco, de 1934 (Centro). "A torre do relógio [que você vê na foto de baixo para cima] [...] é o elemento mais destacado da composição, dominando ainda hoje a paisagem ao redor." (Guia da Arquitetura Art Déco no Rio de Janeiro) O símbolo sobre a entrada é o caduceu, o emblema de Mercúrio e símbolo do comércio: um bastão com duas serpentes entrelaçadas e asas no alto. Não confundir com o símbolo da medicina, o bastão de Esculápio, que é um bastão envolvido por uma serpente.


        Foto 12.9: Edifício Biarritz- Praia do Flamengo, 268: "Sua fachada é marcada por balcões curvos separados por pilastras que se estendem de forma contínua por dez pavimentos. Entre os balcões e as pilastras há uma contracurva responsável pelo impacto visual da sua composição juntamente com a serralheria artística, de grande expressão". Guia da Arquitetura do Rio de Janeiro. 

        O Cristo no alto do Corcovado é a maior estátua art déco do mundo (foto 12.10). A fase de disseminação dos cinemas de rua também coincidiu com a vigência do art déco. Assim temos: antigo Cinema Pathé na Cinelândia (foto 12.11), Cinema Roxy em Copacabana (aqui) e uma série de cinemas de bairro mais tarde desativados, alguns transformados em templos evangélicos, outros abandonados, ainda que eventualmente tombados pelo Patrimônio: Cine Theatro Realengo, atual Igreja Internacional da Graça de Deus (aqui), Antigo Cine Vaz Lobo (aqui), antigo Cine Rosário em Ramos (aqui), antigo Cine Ramos, atual Igreja Universal, também em Ramos (aqui). O Teatro Carlos Gomes, na Praça Tiradentes, também representa o estilo (aqui).

        Foto 12.10: Cristo Redentor, maior estátua art déco do mundo 

        Foto 12.11: A Comédia, na fachada do antigo Cinema Pathé, na Cinelândia. 

        A onda art déco alcançou também as igrejas: Igreja da Santíssima Trindade na Rua Senador Vergueiro (aqui), Igreja de Santa Teresinha do Menino Jesus em estilo art déco, com influência gótica, na boca do Túnel Novo (aqui) e a Matriz de São Geraldo em Olaria (foto 12.2). Finalmente, o estilo não foi aplicado apenas em grandes construções, mas também em pequenos prédios comerciais (aqui), mistos (aqui) ou de apartamentos (aqui), muitos deles nos subúrbios, e até casas residenciais (aqui). Estas e outras fotos você encontra no álbum ESTILO ART DÉCO.

        Foto 12.12: Matriz de São Geraldo (1932 - Olaria) cujas linhas geométricas refletem o estilo art déco predominante na época. Mais informações aqui

        13) Modernismo
        A onda modernista na arquitetura teve seu estopim com a visita de Le Corbusier ao Rio de Janeiro em 1929. Com a ascensão de Vargas ao poder em 1930, Lúcio Costa foi nomeado diretor da Escola Nacional de Belas-Artes, transformando radicalmente o ensino de arquitetura na instituição. No final da década de 1930 os grandes edifícios erguidos no Centro deixaram de seguir o cânone art déco e adotaram os princípios “racionalistas” do modernismo. Um marco e obra-prima da arquitetura moderna no Rio é o Palácio Gustavo Capanema, projeto de 1936, construído em 1937-43. Os cinco princípios da “nova arquitetura” enunciados por Le Corbusier são:  1) planta livre, independente da estrutura do prédio, permitindo a livre alocação das paredes  2) fachada livre, igualmente independente da estrutura do prédio, proporcionando abertura máxima (e permitindo as janelas em fita do quinto princípio)
            3) pilotis, sistema de pilares que sustentam o prédio, permitindo a circulação no térreo
        4) terraço jardim e as  5) janelas em fita, um corolário do princípio 2: uma fita de janelas contíguas cobrindo toda a fachada de um edifício, permitindo maior entrada de luz, princípio este retomado pela arquitetura pós-moderna

        Todos os cinco princípios são fielmente seguidos pelo Palácio Gustavo Capanema (foto 13.1).

        Foto 13.1: Palácio Gustavo Capanema. "Diferente de tudo o que se via até então no que diz respeito a um edifício de sua magnitude, catorze andares, ele não toca o solo: a base repousa sobre pilastras [pilotis]. Além disso, comporta uma grande área no térreo destinada ao paisagismo. Seu projeto misturou os talentos de brasileiros como Lúcio Costa e Oscar Niemeyer, e teve também a mão do suíço Charles-Édouard Jeanneret-Gris, ou Le Corbusier, que, segundo a versão de Cavalcanti, foi decisivo na questão de que as janelas ficassem todas elas voltadas para o mar." Veja Rio, 7/2/15

        Entre o sem-número de construções modernistas no Rio de Janeiro podemos destacar:
        • Sede da Associação Brasileira de Imprensa (ABI), na Rua Araújo Porto Alegre, 71, pioneira na arquitetura moderna no Rio de Janeiro, projetada em 1935 por Marcelo e Milton Roberto (foto 13.2).
        • Palácio Gustavo Capanema, na Rua da Imprensa, 16, projetado por grandes arquitetos, entre eles Lúcio Costa, Oscar Niemeyer e Affonso Eduardo Reidy, em 1936 (foto 13.1 acima).
        • Sede nova da Academia Brasileira de Letras, na Av. Presidente Wilson, 147, projetado em 1972 por Maurício e Marcelo Roberto (aqui).
        • Catedral Metropolitana, em forma de cone truncado, projetada em 1964, com 96 metros de altura, na Av. República do Chile (foto 13.3).
        • Sede da Petrobrás, na Av. República do Chile, 65, projetada em 1968, cujo desenho evoca uma plataforma de petróleo (foto 13.4).
        • Sede da Caixa Econômica Federal, na Av. Rio Branco, 174, projeto de 1965 vencedor de um concurso nacional (foto 13.5 e aqui).
        • Edifício Avenida Central, na Av. Rio Branco, 156, local do antigo Hotel Avenida e Galeria Cruzeiro, que abriga um imenso shopping de Informática (foto 13.5 e aqui).
        • Aeroporto Santos Dumont, projetado em 1937 por Marcelo e Milton Roberto, caracterizado por um longo e alto hall com grandes pilotis no térreo e quebra-sóis nos pavimentos superiores (aqui).
        • Museu de Arte Moderna, projetado por Affonso Eduardo Reidy em 1953, foi a primeira construção no Aterro do Flamengo (foto 13.6).
        • Monumento aos Pracinhas, no Aterro do Flamengo, idealizado pelo Marechal Mascarenhas de Moraes, comandante da FEB, projetado pelos arquitetos Hélio Ribas Marinho e Marcos Konder Netto e construído de 1957 a 1960 (foto 13.7).
        • Conjunto Residencial "Pedregulho", projetado em 1946 por Affonso Eduardo Reidy,  de linhas sinuosas acompanhando a curva da encosta (aqui).
        • Rio Sul Shopping Center. Sua torre é o edifício mais alto do Rio (foto 13.8). 

          Foto 13.2: ABI, "prédio 'sem janelas' caracteriza-se pelo volume maciço e pelas fachadas com quebra-sóis em venezianas verticais de concreto pré-moldado, instalados para coibir a insolação desfavorável do local." Guia da Arquitetura Moderna no Rio de Janeiro

          Foto 13.3: Catedral refletida. Se o Rio já contava com um tesouro de igrejas barrocas e neoclássicas, com a Catedral Metropolitana ganhou uma obra-prima da arquitetura religiosa moderna que impressiona pela dimensão e monumentalidade (cabem lá dentro 20.000 pessoas de pé), pela concepção arrojada e pelo efeito da luz solar incidindo sobre os vitrais situados nos quatro pontos cardeais.

          Foto 13.4: Sede da Petrobrás: desenho arrojado que leva às últimas consequências o princípio dos terraços jardins de Le Corbusier

          Foto 13.5: À esquerda o Edifício Avenida Central, primeiro prédio do Rio com elevador automático, com uma voz gravada anunciando os andares; no centro, Caixa Econômica Federal, edifício de dimensões incomuns ocupando uma quadra inteira

          Foto 13.6: Museu de Arte Moderna. O bloco de exposições, maior e principal, "flutua" sobre enormes pilares em V, com um teto pairando acima, uma estrutura incomum 

          Foto 13.7: Monumento aos Pracinhas: grupo escultórico de autoria de Alfredo Ceschiatti, executado em granito de Petrópolis, homenageando as três Forças Armadas, representadas por um marinheiro, um soldado e um aviador.

          Foto 13.8: Rio Sul Tower, prédio mais alto do Rio com 163 metros e 48 andares

          Com o tempo o estilo acabou abandonando seus "princípios" e degenerando num sem-número de prédios tipo "caixote", sem grandes atrativos estéticos, visando apenas compactar o maior número de pessoas no menor espaço possível, o que só foi revertido com a volta do esteticismo arquitetônico preconizado pelo pós-modernismo.  Segundo o Guia da Arquitetura Moderna no Rio de Janeiro, "a produção da morada coletiva no Rio de Janeiro entra em declínio qualitativo nas décadas seguintes, em decorrência da pressão especulativa, da necessidade de aproveitamento máximo dos terrenos e da definição de estereótipos para fachadas e plantas de edifícios que compunham a rua-corredor". Segundo o Guia da Arquitetura no Rio de Janeiro, "tudo vai ficando mais escuro, pesado e rígido, menos luminoso. Não há mais espaço para as sutilezas, e as linhas básicas tendem a se tornar em muitos casos os únicos elementos marcantes da forma arquitetônica." Estas e ainda outras fotos podem ser vistas no álbum ESTILO MODERNO.

          Foto 13.9: Mar de prédios em Copacabana 

          Foto 13.10: Prédios modernos na Avenida Presidente Vargas 

          14) Pós-modernismo
          Reação contra o "racionalismo" excessivo da arquitetura moderna, voltando a introduzir motivos ornamentais e decorativos no projeto de edificações. A Cidade das Artes, obra-prima do arquiteto francês Christian de Portzamparc (foto 14.1), e o edifício inteligente Rio Branco 1 (foto 14.2) são pioneiros cariocas nessa tendência contemporânea. Nos últimos anos, com a expectativa dos grandes eventos internacionais como a Copa e a Olimpíada, o Rio ganhou novas construções nesse estilo, com destaque para o Museu do Amanhã (foto 14.3), o Museu da Imagem e do Som (ainda em obras) e o Aqwa Corporate (ver postagem AQWA CORPORATE neste blog).

          Foto 14.1: Cidade das Artes. Projeto monumental do arquiteto francês Christian de Portzamparc que, embora "inaugurada" no final do mandato do ex-prefeito César Maia de 2008, só entrou em operação no primeiro semestre de 2013. Digno representante da arquitetura pós-moderna, uma reação contra o "racionalismo" excessivo da arquitetura moderna, voltando a introduzir motivos ornamentais e decorativos no projeto de edificações. Christian de Portzamparc é um arquiteto e urbanista nascido em 1944 em Casablanca, que estudou na École Nationale des Beaux Arts de Paris e se notabilizou pelos projetos arrojados e toque artístico.

          Foto 14.2: Praça Mauá: Edifício Rio Branco 1 (esquerda) e A Noite (direita, com estátua do Barão de Mauá na frente)

          Foto 14.3: Museu do Amanhã visto do terraço do MAR. Projeto pós-moderno do arquiteto espanhol Santiago Calatrava, inaugurado em dezembro de 2015.

          Estas e mais fotos você encontra no álbum ESTILO PÓS-MODERNO. 15) Estilo Favela Antes que algum maluco-beleza venha inventar a tese esdrúxula de que as casas nas favelas constituem um estilo arquitetônico próprio, eu me adianto... Definição do estilo favela: construção informal, popular, erguida em terreno invadidosem cálculos de engenharia, sem planta arquitetônica, despojada (embora no interior os "barracos" contenham os requintes da vida moderna), paredes de tijolos aparentes, o correspondente urbano moderno à antiga casa de pau-a-pique rural. 

          Foto 15.1: "Favela, oi Favela / Favela que trago no meu coração..."