ENSEADA DE BOTAFOGO

ENSEADA DE BOTAFOGO
"Andar pelo Rio, seja com chuva ou sol abrasador, é sempre um prazer. Observar os recantos quase que escondidos é uma experiência indescritível, principalmente se tratando de uma grande cidade. Conheço várias do Brasil, mas nenhuma tem tanta beleza e tantos segredos a se revelarem a cada esquina com tanta história pra contar através da poesia das ruas!" (Charles Stone)

VISTA DO TERRAÇO ITÁLIA

VISTA DO TERRAÇO ITÁLIA
São Paulo, até 1910 era uma província tocada a burros. Os barões do café tinham seus casarões e o resto era pouco mais que uma grande vila. Em pouco mais de 100 anos passou a ser a maior cidade da América Latina e uma das maiores do mundo. É pouco tempo. O século XX, para São Paulo, foi o mais veloz e o mais audaz.” (Jane Darckê Avelar)

27.9.06

VOCÊ TEM MEDO DO CATUMBI?

JUAREZ BECOZA

Praça da Apoteose

Casario na Rua do Catumbi

Idem

Volta e meia ouço alguém dizer que o Catumbi é um bairro violento e perigoso. Que injustiça, caro leitor. Não que os morros que cercam a área tenham parado de cuspir fogo de quando em vez. Mas, em geral, o centrinho do Catumbi, aquele que começa no cemitério e termina na Apoteose, ainda mantém a aura de tranqüilidade típica dos subúrbios. No caso, um subúrbio a cinco minutos do Centro, onde ainda sobram os sobrados, as casas geminadas, as cadeiras na calçada e os botecos. Muitos botecos.

E não poderia ser mesmo diferente, em se tratando de um bairro que viu Pixinguinha nascer, criou Jorge Ben e abrigou Moreira da Silva, o último dos malandros, que nunca bebeu mas teve a vida marcada pela boemia. No Catumbi, portanto, botequins fazem parte do cenário e da cultura. E o melhor deles é o cinqüentenário Bar do Bacalhau.

No fim de uma rua sem saída, este espartano e familiar boteco português serve um bacalhau honesto e generoso. Por décadas, seu José, o dono, fazia o peixe na brasa. Desde a sua morte, há cinco anos, dona Maria, a viúva, e Lola, a filha, oferecem o bacalhau à portuguesa — assado ou frito — caprichado no pimentão e na azeitona preta (R$ 45, para três). Aos 81 anos, Dona Maria anda pensando em fechar a casa. Só não o fez ainda por insistência dos fregueses, fiéis ao ótimo bacalhau. Eu entre eles.

Lola

Uma cervejinha que ninguém é de ferro

Igreja de N.S. das Dores da Salette

Acesso ao túnel Santa Bárbara e encosta de Santa Teresa

Acesso ao Santa Bárbara e favela do Morro da Coroa

Chalé (*)

Rua Pedro Mascarenhas (*)

Idem

Encosta de Santa Teresa vista do cemitério

Após a chuva...

Vila Idalina (detalhe)

Uma cervejinha que ninguém é de ferro II

O bacalhau do Bar do Bacalhau

Dona Maria e alegres fregueses do Bar (*)

Endereço do Bar do Bacalhau: Rua Valença, 25, Catumbi — tel. 2293.9190.
Crônica publicada em 2006 na coluna "Pé-Sujo" de O Globo e reproduzida aqui com autorização do autor. Visite o blog do Juarez
Fotos do editor do blog, exceto as marcadas com (*), de Raul Antônio Félix de Souza.

20.9.06

BASTOU UM VENTO PARA A DESFOLHAR

IVO BARROSO



Numa semana cheia de denúncias, desastres, inundações e acidentes aéreos, fechando o mês de agosto (em que a “bruxa” andou solta), melhor será esquecer severinos e malufes e, para arejar as idéias, caminhar no calçadão. Mal porém chego à esquina (Igarapava/Visconde de Albuquerque), dou com a estonteante beleza citrina de uma árvore em trabalho de parto florescente. Milhares de flores campanulares circundando a copa espraiada e altaneira, que se sobrepõe aos negros fios elétricos e às redes de chumbo das comunicações. Um dossel amarelo-âmbar, como uma bela cabeleira loura, uma cabeça de anjo no alto daquele tronco que, esguio, sem galhos adjacentes, parecia ufanar-se de seu garbo e sua altura. Nem uma só folha, só flores. A floração, em toda a sua plenitude, devia ter arrebentado durante a noite, pois o chão não estava ainda salpicado com as gotas de âmbar das pétalas caídas; só uma ou outra flor pontilhava aqui e ali, como um grito de alerta na calçada em redor. Atravessei a rua, para melhor observar a visão que me transportara num segundo de um pesadelo de infâmias para a esperança de uma visão futura. Há tanto tempo não contemplava a Beleza, que já me havia esquecido de que ela existe e mora ao lado. Refeito do primeiro alumbramento, corri ao prédio em frente, ao feliz vizinho daquele portento floral, e perguntei ao porteiro se sabia o nome da árvore.


“Sei, não senhor; é a terceira pessoa que me pergunta, mas o jardineiro só vem na segunda. Vou saber com ele, pois também ando curioso”.


Foi melhor assim, melhor que o prodígio botânico permanecesse para mim no anonimato da espécie, assim como uma bela mulher que passa inidentificável pela rua. Já o bardo dizia What´s in a name? Seria desfazer o milagre se a resposta fosse, por exemplo: “Trata-se de uma Tabebuia tecoma, da família das bignoniáceas, de flores caducas sazonais, em formato ovóide, de florescência anual, cujo lenho é muito resistente à putrefação”. Não, aquela árvore não precisa ter nome nem função utilitária. É apenas um milagre de presença, para nos revelar o esplendor do efêmero. Um acidente visual, que nos permite considerar a transitoriedade do belo e a renovação indefectível da vida. Amanhã ou depois, quando passar de novo por ali, o chão estará coberto de flores amarelas, esmagadas pelas pessoas que as pisaram, enxovalhadas pela chuva da noite, espalhadas pelo vento que soprou do mar. Os galhos, no alto, estarão nus, voltados para cima como dedos votivos, suplicando por novas florações. O tronco esguio me parecerá velho e recurvo, de coloração exausta, como esses astros-deuses do cinema de ontem que hoje nos assustam com suas nostálgicas figuras enrugadas e disformes. É a vida que passa. Não creio que haja um momento, como no Fausto, que se possa dizer ao Tempo: “Pára! Porque és tão belo!” A vida está na renovação, na alternância, enfim no movimento que nos permite sonhar, esperar, contemplar e esquecer. Creio que voltei dali sem prosseguir na caminhada. Já havia feito um longo percurso dentro de mim mesmo com a simples contemplação de um momento inesperado. Era forçoso registrar em seguida o corolário da visão: a crise política que estamos vivendo tem um lado positivo, e tolo seria se nos entregássemos totalmente à descrença. Se um bando de oportunistas cretinos implodiram o sonho de um governo voltado para as conquistas sociais que por tanto tempo acalentamos, devemos esperar é que esse bando se auto-destrua em vez de abdicarmos de vez desse sonho que ainda temos. As folhas caídas são o prenúncio de novas florações.


Texto publicado no Jornal do Brasil em 10.09.05 e gentilmente enviado pelo autor para publicação neste blog. Foto do autor do texto. A árvore é um ipê-amarelo.

13.9.06

VELHOS BECOS

DO CENTRO DO RIO

Beco dos Barbeiros

O Beco dos Barbeiros nasceu no século da Inconfidência, quando nele se instalaram os oficiais da tesoura de porta e cortina e dos Barbeiros, por isso mesmo, ficou a chamar-se.

Esses barbeiros antigos eram homens de sete instrumentos, na verdadeira acepção da palavra, porque, além da tesoura e da navalha, outros mais ainda manejavam no campo da odontologia e da mais rústica medicina. Com seus grossos boticões arrancavam dentes a frio, num tempo em que a anestesia longe estava de ser descoberta, e substituíam os poucos médicos existentes, na arte de sangrar os doentes (abusava-se então das sangrias como hoje das injeções) ou de aplicar-lhes sanguessugas, expostas nas próprias barbearias em redomas de vidro, vivas e famintas...

Os melhores possuíam lojas no beco e os demais trabalhavam em barracas ou perambulavam pelas ruas ou se concentravam, de preferência, no Largo do Paço [atual Praça Quinze] ou no do Rosário... [pág. 41]





Beco das Cancelas

Em 1808, ao desembarcar D. João VI no beco, não existiam senão três casas. Um dos mais estreitos da cidade, dava passagem de dia aos pedestres entre as ruas que cortava. À noite suas cancelas se fechavam. [...] Foram-se os séculos, as suas cancelas, mas gravado ficou na tradição carioca o nome tão pitoresco nelas inspirado. [pág. 74]




Beco de Bragança

Nesses casarões já demolidos [...] se acomodou o Regimento de Bragança, de um grupo de três chegados em 1767 de Portugal para reforçar as guarnições do Brasil. [...] Até aí os soldados portugueses não viviam aquartelados, quando mandados para as cidades brasileiras. Era costume distribuí-los pelas casas de família, como seus hóspedes obrigatórios, o que nem sempre, como é fácil de imaginar-se, dava resultados satisfatórios... Regurgitante de soldados, a rua dos Quartéis e com ela o beco passou depois a ser conhecida como do Bragança. O beco ainda hoje assim se chama. [pág. 70]



Texto do livro História das Ruas do Rio de Brasil Gerson, quinta edição remodelada e definitiva, organizada por Alexei Bueno. Na livraria Folha Seca, à Rua do Ouvidor, 37 - tel. (0xx21) 2507.7175 - possivelmente você encontrará este clássico da historiografia carioca. O Beco dos Barbeiros fica entre a Rua do Carmo e Primeiro de Março. O Beco das Cancelas liga a Rua do Carmo à Rua da Candelária. O Beco de Bragança fica do outro lado da Av. Presidente Vargas, sendo paralela à Visconde de Inhaúma. Fotos do editor do blog.