Adonias Filho profere seu discurso de posse na ABL |
Adonias Filho (1915-1990) preferiu deixar as terras do Sul da Bahia, a cidade de Salvador e o mar como cenário privilegiado de suas criações, escolhendo o Rio de Janeiro como o espaço ideal onde irão acontecer as ações do drama na pequena novela Amor no catete e no romance Noite sem madrugada. A densidade dramática ligada à ambiência primitiva da Região Cacaueira Baiana, aos mares de Luanda e Beira, na África, de Ilhéus e Salvador, na Bahia, ou ainda ao logradouro do Largo da Palma e à casa mágica povoada de espíritos e histórias de um forte, na capital baiana, irá ser conduzida agora pelo ficcionista seguro e estilista fino por onde o frio e o vento de inverno fazem a sua morada. Gente nos ônibus, lojas, passeios, imprimem o ritmo da vida diária.
Amor no Catete conta uma história que se passa em um lugar do Rio
de Janeiro, dando-nos a sensação que aquele cenário carioca bem tocava a
sensibilidade de Adonias Filho. A Rua do Catete com sua gente nas esquinas,
discutindo futebol e política, as luzes dos postes iluminando os bondes que
passavam, a hora dos gatos que fugiam dos velhos casarões para correr nos
passeios desertos constituíram um cenário que permaneceu na memória sensitiva
do escritor e no coração que acordava com saudade do tempo em que ali morou, quando
então era um rapaz vindo do Sul da Bahia, cheio de esperança e sonho para
assumir o compromisso de se tornar escritor um dia.
Bonde na Rua do Catete, foto de Augusto Malta de cerca de 1920 obtida no site Brasiliana Fotográfica |
Em Amor no catete, o cenário de uma rua, com o vento trazido do mar pelas ruas do Flamengo, povoada de bares, lojas, estudantes que se recolhiam nas pensões, serve como o local de um encontro casual que culmina em amor, vivido entre um rapaz vindo do campo e uma mulher idosa, marcada pelo trauma da morte do filho.
Já em Noite
sem madrugada, em uma das primeiras passagens, a personagem Vilma e os
filhos encontram cedo a Rua do Catete com o movimento grande.
“Um povo afobado, andando com pressa, a subir nos ônibus, a
encher os cafés e as lojas, a entupir os passeios. O barulhão dos motores e das
buzinas, o fumaceiro dos ônibus, os sacos de lixo nas calçadas, as bancas de
jornais”. (p.14)
Outros
locais do Rio, como Jacarepaguá, Praça Quinze, Niterói, Icaraí, Leblon, servem
como referências por onde Vilma, um dos personagens centrais do romance, em seu
percurso permeado de esperança e aflição, transita na busca de provar a
inocência de Eduardo, o marido, um homem bom, manso como um cordeiro, que não
fazia mal a uma mosca, acusado de repente de ter participado de um assalto ao
banco e assassinado um homem e uma mulher.
Em Amor
no Catete, o local onde os personagens aparecem com suas ações fundamentais
que conduzem a trama, a Rua do Catete, é aproveitado como elemento da realidade
exterior com mais ênfase do que em Noite sem madrugada, mas em ambos os
casos está longe de ser o espaço frequente que se configura como
fundamental, marcado de simbolismo, por exemplo, no romance O forte e
nos contos de O Largo da Palma ou ainda nos mares trágicos de
Luanda, Beira Bahia, e em todas as histórias que acontecem no Sul da Bahia.
Adonias
Filho ocupou cargos importantes na administração pública brasileira e exerceu
significativas atividades culturais. Foi nomeado diretor da Editora A Noite
(1946-1950), do Serviço Nacional de Teatro (1954) e da Biblioteca Nacional
(1961-1971). Em 1966, foi vice-presidente da Associação Brasileira de Imprensa;
de 1969 a 1973, exerceu a função de membro do Conselho Federal de Cultura; em
1972, presidiu a Associação Brasileira de Imprensa; e de 1977 a 1990, o
Conselho Federal de Cultura.
Sua formação jornalística desenvolveu-se no Rio de Janeiro e em São
Paulo. Foi colaborador em jornais importantes, como Correio da Manhã e o Jornal do Comércio. Participou como crítico literário do jornal Hora
Presente, A Manhã, Jornal de Letras, Diário de Notícias, O Estado de
São Paulo e na Folha da Manhã. Exerceu a crônica na Última Hora. Tanta
atividade em suas trilhas de vida, dedicada à imprensa e à gestão cultural, que
poderia ter se afastado de sua vocação literária. Tal não ocorreu porque tinha
uma vocação legítima para ser escritor, um raro talento que não permitia que
fosse diferente o homem que escolheu a literatura como leitura da vida.
Jamais recorreu ao pai para sobreviver. Como tradutor e jornalista,
buscou os meios para subsistir com dignidade. Alcançou cargos importantes por
méritos. Nunca cobiçou, nem procurou confundi-los com a sua carreira de
escritor.
NOTA: A novela Amor no Catete faz parte da antologia Histórias dispersas de Adonias Filho, organizada por Cyro de Mattos, que você pode baixar gratuitamente clicando aqui.
NOTA: A novela Amor no Catete faz parte da antologia Histórias dispersas de Adonias Filho, organizada por Cyro de Mattos, que você pode baixar gratuitamente clicando aqui.
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