Nascido em 23 de janeiro de 1943, na Ilha de Itaparica, o escritor João Ubaldo Ribeiro faleceu na última sexta-feira (18), no seu apartamento, do bairro Leblon, Rio de Janeiro, vítima de embolia pulmonar. Jornalista, contista, romancista, cronista, tradutor e roteirista de cinema. Laureado com o Prêmio Jabuti duas vezes, Golfinho de Ouro (Rio), Prêmio Camões, para autores brasileiros e portugueses. Esse baiano de Itaparica deixa uma obra de altíssimo nível no corpo das letras brasileiras. Destacam-se na sua vasta produção os livros Sargento Getúlio (1971), Viva o povo brasileiro, (1984) O sorriso do lagarto (1989), romances, e Livro de histórias (1981). Formado pela Faculdade de Direito da Universidade Federal da Bahia, na turma de 1962, nunca exerceu a advocacia.
Começou a escrever muito cedo, publicando
os primeiros contos nas coletâneas Panorama
do conto baiano (1959), Reunião
(1961) e Histórias da Bahia (1963). O
romance Sargento Getúlio, que virou
filme e, há pouco tempo, foi adaptado ao teatro, colocou João Ubaldo Ribeiro
como um valor excepcional na moderna literatura brasileira. O livro foi
traduzido por ele mesmo para o inglês e publicado nos Estados Unidos. Foi
editado também na França. Com Livro de
histórias (1981), o modo debochado de narrar do autor baiano mais uma vez
retorna com incursões nas venturas e desventuras do povo de Itaparica e do
sertão da Bahia.
Com Viva
o povo brasileiro (1984), magnífico
romance, com seu prodígio técnico, conhecimento incomum de linguagem e fala
brasileira, vasto cabedal de informações sobre a vida e cultura do povo, João
Ubaldo Ribeiro passa a ser reconhecido como um dos escritores mais
significativos da América latina, ao lado de Jorge Amado, Gabriel Garcia
Márquez, Mario Vargas Llosa, Carlos Fuentes e outros.
É triste, muito triste, essa despedida
física de João Ubaldo Ribeiro. Ele foi meu amigo, companheiro de geração em
Salvador e colega na Faculdade de Direito da Universidade Federal da Bahia, no
período compreendido entre 1958 e 1962.
Quando estudante universitário, uma das
coisas que eu gostava era de ir à Rua Chile. Quase todos os dias, visitava a
Livraria Civilização como uma necessidade que o tempo me impunha, semelhante
àquela quando se tem sede ou fome. Era lá que eu me encontrava com os
companheiros de geração, à qual alguns deles pertenciam por afinidades
eletivas, enquanto outros em razão da idade. Ildásio Tavares, Alberto Silva,
Ricardo Cruz, Marcos Santarrita, Orlando Sena, Olnei São Paulo, Adelmo
Oliveira, Carlos Nelson Coutinho e, presença indispensável, João Ubaldo
Ribeiro. Lá estava o jovem de voz gutural, contador de casos como o primeiro
sem segundo, sorriso largo e franco, olhos por trás de óculos com lente forte e
armação grossa. De bom humor com tudo que viesse de graça e da graça da boa
terra baiana.
E não é que, neste instante, pregando
mais uma de suas travessuras e saindo da memória de repente, eis que risonho
vejo diante de mim o colega que deu as mãos à criação literária como meio de
leitura crítica da vida? João Ubaldo Ribeiro, com o seu jeito brincalhão de
circular naquela querida Faculdade de Direito. Ele era encontrado na cantina,
às vezes namorando com Belô, a moça mais bonita da faculdade. Comentava-se que
feio como ele só mesmo sua inteligência rara poderia levá-lo à conquista do
coração daquela moça, que, quando passava, arrancava suspiros dos estudantes
universitários, de tão bela. Lá mesmo na cantina contava alguma história de sua
gente de Itaparica aos colegas Davi Sales e Ildásio Tavares, o primeiro
mostrando que sua vocação era para crítico literário e o segundo para a poesia,
e não para a profissão de advogado.
Uma vez fez uma prova de Direito do
Trabalho em versos e ganhou do professor Elson Gottschalk a nota máxima. Outra
vez, quando soube que havia passado de ano, subiu numa cadeira da cantina e, em
transe, como se algum espírito de luz tivesse se apossado dele, começou a
recitar Shakespeare em inglês clássico. Com aquela cabeça grande de baiano em
que formigavam histórias, gozações repentinas, que pegavam os colegas sem
defesa, só podia João Ubaldo Ribeiro dá no que deu. Em vez de advogado
militante, dotado de vasto saber jurídico, fôlego de sete gatos para enfrentar
os litígios forenses, tornou-se em pouco tempo o romancista consagrado de Sargento Getúlio e Viva o povo brasileiro, entre outros livros soberbos.
Era membro da Academia Brasileira de
Letras. Seus livros foram traduzidos para oito idiomas.
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