Santa Teresa precisa dos bondes, da alegria dos bondes. Os passageiros gostam de sentar nos seus bancos, vivenciar a paisagem do bairro, o vento gostoso. Tempos e espaços se aliam nesse passeio. [...]
A cidade do Rio de Janeiro não utiliza mais o bonde. Os carros, os ônibus, a pressa o expulsaram. Em Santa Teresa, o bonde permaneceu, porque a curvas, as ruas estreitas o pedem. Os moradores precisam dele, do seu ruído. "É muito bom isto aqui. Eu fico com as minhas telas, ouvindo o passarinho cantando, lá longe um latido, e aí vem o barulho do bonde", disse-me Regina Toledo Piza, que tem seu ateliê em Santa Teresa.
O barulho do bonde, a presença do bonde. O bonde é a maior referência de Santa Teresa. O tempo passa, as coisas se transformam, mas o bonde tem de permanecer. [...] Se tirarem o bonde, Santa Teresa sucumbe. Morre um pedaço do Rio de Janeiro. (Texto extraído do livro de Lilian Fontes, Santa Teresa - um livro maravilhoso para se familiarizar com o clima desse aprazível bairro carioca.)
O bonde na estação |
Os Arcos da Lapa |
Trilho do bonde sobre os Arcos |
Bondinho sobre os Arcos |
Dentro do bondinho |
A vista de cima dos Arcos |
Bondinho em Santa Teresa |
Idem |
Uma das várias casas em estilo eclético que você vê do bondinho na Rua Joaquim Murtinho |
De volta à estação; ao fundo, a Catedral |
Inauguraram-se os bonds [bondes, palavra originária do inglês bond] de Santa Teresa, — um sistema de alcatruzes ou de escada de Jacó [escada bíblica que levava ao céu], — uma imagem das coisas deste mundo. Quando um bond sobe, outro desce, não há tempo em caminho para uma pitada de rapé, quando muito, podem dois sujeitos fazer uma barretada [saudação que consiste em tirar da cabeça o barrete].
O pior é se um dia, naquele subir e descer, descer e subir, subirem uns para o céu e outros descerem ao purgatório, ou quando menos ao necrotério.
Escusado é dizer que as diligências viram esta inauguração com um olhar extremamente melancólico.
Alguns burros, afeitos à subida e descida do outeiro, estavam ontem lastimando este novo passo do progresso. Um deles, filósofo, humanitário e ambicioso, murmurava:
O pior é se um dia, naquele subir e descer, descer e subir, subirem uns para o céu e outros descerem ao purgatório, ou quando menos ao necrotério.
Escusado é dizer que as diligências viram esta inauguração com um olhar extremamente melancólico.
Alguns burros, afeitos à subida e descida do outeiro, estavam ontem lastimando este novo passo do progresso. Um deles, filósofo, humanitário e ambicioso, murmurava:
— Dizem: les dieux s'en vont [os deuses vão-se embora]. Que ironia! Não; não são os deuses somos nós. Les ânes s'en vont [os asnos vão-se embora], meus colegas, les ânes s'en vont.
E esse interessante quadrúpede olhava para o bond com um olhar cheio de saudade e humilhação. Talvez rememorava a queda lenta do burro, expelido de toda a parte pelo vapor, como o vapor o há de ser pelo balão, e o balão pela eletricidade, a eletricidade por uma força nova, que levará de vez este grande trem do mundo ate à estação terminal.
O que assim não seja... por ora.
Mas inauguraram-se os bonds. Agora é que Santa Teresa vai ficar à moda. O que havia pior, enfadonho a mais não ser, eram as viagens de diligência, nome irônico de todos os veículos desse gênero. A diligência é um meio-termo entre a tartaruga e o boi.
Uma das vantagens dos bonds de Santa Teresa sobre os seus congêneresda cidade, é a impossibilidade da pescaria. A pescaria é a chaga dos outros bonds. Assim, entre o Largo do Machado e a Glória a pescaria é uma verdadeira amolação, cada bond desce a passo lento, a olhar para um e outro lado, a catar um passageiro ao longe. As vezes o passageiro aponta na Praia do Flamengo, o bond, polido e generoso, suspende passo, cochila, toma uma pitada, dá dois dedos de conversa, apanha o passageiro, e segue o fadário até a seguinte esquina onde repete a mesma lengalenga.
Nada disso em Santa Teresa: ali o bond é um verdadeiro leva-e-traz, não se detém a brincar no caminho, como um estudante vadio.
E se depois do que fica dito, não houver uma alma caridosa que diga que eu tenho em Santa Teresa uma casa para alugar — palavra de honra! o mundo está virado.
O que assim não seja... por ora.
Mas inauguraram-se os bonds. Agora é que Santa Teresa vai ficar à moda. O que havia pior, enfadonho a mais não ser, eram as viagens de diligência, nome irônico de todos os veículos desse gênero. A diligência é um meio-termo entre a tartaruga e o boi.
Uma das vantagens dos bonds de Santa Teresa sobre os seus congêneresda cidade, é a impossibilidade da pescaria. A pescaria é a chaga dos outros bonds. Assim, entre o Largo do Machado e a Glória a pescaria é uma verdadeira amolação, cada bond desce a passo lento, a olhar para um e outro lado, a catar um passageiro ao longe. As vezes o passageiro aponta na Praia do Flamengo, o bond, polido e generoso, suspende passo, cochila, toma uma pitada, dá dois dedos de conversa, apanha o passageiro, e segue o fadário até a seguinte esquina onde repete a mesma lengalenga.
Nada disso em Santa Teresa: ali o bond é um verdadeiro leva-e-traz, não se detém a brincar no caminho, como um estudante vadio.
E se depois do que fica dito, não houver uma alma caridosa que diga que eu tenho em Santa Teresa uma casa para alugar — palavra de honra! o mundo está virado.
Na estação, aguardando os passageiros |
Idem |
Fotos do editor do blog. A estação do bonde para Santa Teresa fica na Rua Lélio Gama, ruela que liga a Senador Dantas (perto da Cinelândia) ao Largo da Carioca. Mais informações sobre o bonde no site da Riotur. Clique no marcador "Santa Teresa" abaixo para ver outras postagens sobre esse aprazível bairro.
PS. Recente acidente (agosto de 2011) com várias vítimas, algumas fatais, o pior da história centenária do bondinho, supostamente devido à manutenção deficiente do sistema, tirou um pouco do encanto desse ícone de Santa Teresa. A circulação foi interrompida, o sistema vem sendo totalmente remodelado, e os bondinhos entraram em pré-operação num trecho inicial da Carioca ao Curvelo, em 27/7/2015, como mostra o vídeo abaixo e a postagem A Volta do Bondinho de Santa Teresa neste blog. O sistema integral, até o Silvestre, estará totalmente implantado em 2017.
PS. Recente acidente (agosto de 2011) com várias vítimas, algumas fatais, o pior da história centenária do bondinho, supostamente devido à manutenção deficiente do sistema, tirou um pouco do encanto desse ícone de Santa Teresa. A circulação foi interrompida, o sistema vem sendo totalmente remodelado, e os bondinhos entraram em pré-operação num trecho inicial da Carioca ao Curvelo, em 27/7/2015, como mostra o vídeo abaixo e a postagem A Volta do Bondinho de Santa Teresa neste blog. O sistema integral, até o Silvestre, estará totalmente implantado em 2017.
16 comentários:
É sempre de um prazer inenarrável cada visita a este maravilhoso espaço.
Estarei indicando nas minhas páginas.
Abração
www.luizalbertomachado.com.br
Obrigada pelo que escreveu em meu blog. Obrigada... Obrigada mesmo!
Adorei seu blog, vim atrás lá da Lia. :)
Sou 'carioca' vivi 30 anos em Ipa, meu coração está ai. Agora vivo emnatal.
Virei sempre,abs laura
Oi meu caro amigo escritor!
Sua nova profissão como guia turístico é dez. Como fotógrafo tb.
Sucesso sempre.
Fotos ótimas! Confirmam o acerto da inclusão desse blog na relação de sites legais do informaSANTA.
E o bonde é sempre uma grande pedida, todo mundo quer imagens dele.
Ivo, e sempre um enorme prazer olhar e admirar as tuas fotos! Sao uma festa para os olhos. Abrs. do amigo Jonas.
Saludos desde Costa Rica. Interesante.
Prezado Ivo,
Em 31 de outubro de 1902, nascia um brasileiro que se chamou Carlos Drummond de Andrade. Mineiro de Itabira, amou o Rio de Janeiro como poucos que têm o privilégio de ser cariocas. No dia em que lembramos os 104 anos de Drummond, a melhor homenagem que lhe podemos render é lembrar, silenciosa e comovidamente, os versos com que fez maior e mais respeitável a poesia brasileira.
Abraço fraterno do amigo e leitor
Edmílson Caminha
Prezado Ivo!Muito legal mesmo!!!Adorei!!!
Sucesso para o seu BLOG!
Siomara de Cássia Miranda
Muito legais as fotos e as informações sobre Santa Tereza !
Parabéns pelo seu blog!
Acabei de conhecer Santa Teresa e tenho certeza de querer morar por lá um dia na minha vida, por um período, ouvindo os bondes, vendo aquelas coisas que só existem lá, aquela energia que só se sente lá. O Bonde é maravilhoso é muito a real do texto. Valeu as fotos e o texto. Abraços
Ivo, parabéns pelo blog, não só a parte dedicada ao Rio antigo como outras postagens são de excelente qualidade e riquíssimas! Li, por exemplo, a postagem 'Bairro Santa Teresa' e achei interesantíssima, pois gosto muito desse bairro, pela sua atmosfera em tudo nostálgica.
O blog já está nos meus Favoritos! (postado no tópico Imagens do Rio Antigo da comunidade Rio Antigo do Orkut)
Ivo...
Santa Teresa faz parte da minha infância, eu tinha 4 anos, e lembro bem do Curvelo, e do Tabuleiro da baiana.
Beijos saudosos
Legal, muito bacana esse seu artigo sobre Santa Tereza e o o bondinho .. Abraços!
Prezado,
A Editora Ática S/A está trabalhando na edição do livro didático provisoriamente intitulado "Aprendendo Sempre – Ciências 3º ano", de autoria de Rogério G. Nigro, Maria Cristina da C.Campos.
Por esta razão, solicitamos autorização para utilização do texto abaixo na obra mencionada e também nos módulos didáticos Sistema de Ensino SER:
Título: Santa Teresa
Fonte: http://literaturaeriodejaneiro.blogspot.com/2006/10/bondinho-de-santa-teresa.html
Muito Obrigada
Karina
11-39901842
kmiquelini@abril.com.br
Esse fim de semana estive em Santa Tereza, no evento anual " Arte de portas abertas" e senti muita falta dos bondinhos. Inumeras manifestações dessa tristeza, estão nos postes, bares, fachadas e muros.
Que saudades!!!
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