Publicado originalmente na revista literária holandesa DAS
MAGAZIN (no 6, verão de 2013) e traduzido para o
português pelo editor do blog.
INTRODUÇÃO
Em 2013, uma jornalista dos Países Baixos, que me localizou
através de meu blog, pediu que eu lhe mostrasse os locais do centro do Rio
associados à literatura. Fiz o possível: mostrei a Biblioteca Nacional, o Real
Gabinete Português de Leitura, a Confeitaria Colombo, ponto de reunião de
intelectuais na Belle Époque, etc. Algum tempo depois, ela me enviou o PDF da revista literária
onde saiu publicado seu texto, mas na época eu não entendia xongas do idioma
neerlandês (e o Google Tradutor naquele tempo ainda não estava tão desenvolvido
quanto hoje). Somente agora (2021), depois de ter estudado tal idioma no
Duolingo (valendo-me das semelhanças com o alemão), enfim consigo ler seu artigo e constato que ela observou as coisas com perspicácia. Na época ainda havia recitais regulares de poesia (no Teatro Gláucio Gil, em Copacabana, por exemplo) e novelas de televisão de alta qualidade (com excepcional dialogismo), por grandes autores como Manoel Carlos e Glória Perez. E, como aprendi nos seis anos em que frequentei a oficina literária do grande mestre Ivan Proença, o roteiro de um filme, série ou novela (ou mesmo uma letra da MPB) é uma obra literária, sim, tanto quanto uma peça de teatro ou uma cantiga medieval. Vamos ao texto!
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Machado de Assis no Morro do Livramento |
Ali, logo atrás do porto, onde está em construção a Vila
Olímpica, fica o Morro do Livramento, um dos muitos morros do Rio de Janeiro. Lá nasceu Machado de Assis, o escritor mais importante do Brasil no século XIX. Mais ao
sul, em Botafogo, bairro com a mais bela enseada da cidade, veio ao mundo
Paulo Coelho. Nenhum escritor
brasileiro vendeu mais livros do que ele.
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Morros verdes e rochosos (Morro do Urubu) |
Os morros verdes e rochosos não
são apenas uma festa para o olho, eles abrigam histórias de pequenos e grandes
escritores e constituem o cenário de diversos romances. Mesmo assim, esses
lugares são desconhecidos por muitos cariocas, como são chamados os moradores
do Rio. A literatura é algo como as notícias internacionais: pouco importante e enfadonha.
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Aguardando o metrô |
No metrô do Rio de Janeiro
ninguém lê. Nem nos ônibus. No máximo, brasileiros entediados folheiam o
jornal gratuito do metrô, em casos excepcionais alguém pega um livro. Já os
salões de cabeleireiro estão cheios de revistas reluzentes com informações
sobre quem os atores das famosas telenovelas estão namorando e que locais estão
frequentando. Almas românticas que saem ingenuamente em busca do coração literário
da cidade se decepcionam, ao menos à primeira vista, porque na superfície se
acha pouca coisa. Os brasileiros nem leem jornal, suspira desanimada uma
moça cosmopolita e com formação superior. “Música e filmes, eles adoram isso aqui. Nacionais, quero dizer. Mas onde fica Paris ninguém sabe.”
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Real Gabinete: livros até o teto |
A literatura no Rio de Janeiro é
como uma caça ao tesouro, mas quem seguir o caminho encontrará mais do que esperava. No centro da cidade, onde construções portuguesas antigas erguem-se
lado a lado com arranha-céus modernos, escondem-se as mais magníficas bibliotecas e
livrarias. Na biblioteca portuguesa [Real Gabinete Português
de Leitura], com dezenas de metros de altura, os livros vão até o teto. A
Academia Brasileira de Letras está abrigada em uma réplica do Petit Trianon de
Versalhes.
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Recantos escondidos da cidade: Camões diante do Real Gabinete Português de Leitura |
Acontece nos nichos, nos recantos escondidos da cidade: noites semanais de poesia, clubes de leitura e
discussões literárias. Segundo Ivo Korytowski, amante da literatura com um blog
onde associa locais históricos com obras literárias, a literatura está profundamente enraizada em cada brasileiro. “As populares telenovelas, que duram vários meses,
são como romances”, diz ele. “Esta é a moderna literatura.”
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