ENSEADA DE BOTAFOGO

ENSEADA DE BOTAFOGO
"Andar pelo Rio, seja com chuva ou sol abrasador, é sempre um prazer. Observar os recantos quase que escondidos é uma experiência indescritível, principalmente se tratando de uma grande cidade. Conheço várias do Brasil, mas nenhuma tem tanta beleza e tantos segredos a se revelarem a cada esquina com tanta história pra contar através da poesia das ruas!" (Charles Stone)

VISTA DO TERRAÇO ITÁLIA

VISTA DO TERRAÇO ITÁLIA
São Paulo, até 1910 era uma província tocada a burros. Os barões do café tinham seus casarões e o resto era pouco mais que uma grande vila. Em pouco mais de 100 anos passou a ser a maior cidade da América Latina e uma das maiores do mundo. É pouco tempo. O século XX, para São Paulo, foi o mais veloz e o mais audaz.” (Jane Darckê Avelar)

15.5.16

ARCO DO TELES

Largo do Paço, gravura de Louis Buvelot de 1845 obtida na Biblioteca Nacional Digital. O Arco do Teles está sob a seta.

O Arco do Teles era originalmente uma passagem por uma das três casas coloniais de uso misto (residencial e comercial) de meados do século XVIII de propriedade do juiz de órfãos Francisco Teles Barreto de Meneses ligando o Largo do Paço (atual Praça XV) ao Beco do Arco do Teles (atual Travessa do Comércio), como vemos na gravura acima, sob a seta. O Arco sobrevive até hoje, tombado pelo IPHAN em 1938, só que das três casas coloniais originais só restam as fachadas dianteira e traseira da casa central acopladas a prédios modernos, como você pode ver na primeira foto abaixo. 

No Capítulo II de O Rio de Janeiro no Tempo dos Vice-Reis, Luís Edmundo assim descreve as casas do Teles e seu Arco: “À direita, na linha do casario que avança para a praia, as casas do Teles, com os seus balcões verdoengos [=esverdeados] e os seus telhados íngremes e pardos. Na linha do rés-do-chão, vê-se a porta que dá entrada à bodega do francês Philippe, uma das mais populares figuras da cidade e que a profissão de bodegueiro liga à de intérprete, agente de câmbio e mais negócios. A sua tasca é uma das mais populares, sítio onde vão parar os viajantes vindos de Minas e de S. Paulo e onde, por vezes, dormem. Que os que estão em trânsito no porto podem descer, mas não podem dormir em terra. O Arco do Teles abre adiante a face escancarada e suja. É uma passagem curta, onde se amontoam e desaparecem mendigos, rascoas [=meretrizes], vadios e soldados." (Ver ilustração ao final da postagem.)

Arco do Teles visto da Praça XV. Observe que a fachada da casa colonial está encaixada entre os prédios modernos.

A casa colonial, abstraindo-se os prédios modernos

Chegando mais perto

Vamos entrar? Em outras eras a passagem não era tão segura assim, como lemos no texto do Coarary

O texto a seguir foi extraído da obra-prima de Vivaldo Coaracy Memórias da cidade do Rio de Janeiro:

O Arco do Teles está hoje tombado como monumento histórico. Policiado e relativamente asseado, serve quase exclusivamente para a passagem de caminhões que nele carregam ou descarregam mercadorias dos depósitos situados na travessa. Nem sempre, porém, assim foi. Passagem nobre e bem frequentada no tempo dos vice-reis, prestigiado pela vizinhança do Senado da Câmara e proximidade do Paço, decaiu e abastardou-se com o correr dos anos. Por proporcionar abrigo das intempéries, por ser sombrio, tornou-se o Arco do Teles uma espécie de Pátio dos Milagres, valhacouto de vagabundos, refúgio de delinquentes e palco de cenas vergonhosas, pouso de desacreditados tipos de rua como o Filósofo do Cais, a Bárbara Onça, e outros.

À entrada do arco existia primitivamente um dos pequenos oratórios abundantes na velha cidade: simples nicho abrigando uma imagem diante da qual geralmente ardia uma luz. Eram demonstrações da devoção do proprietário dos prédios e diante de muitos desses nichos se reuniam, em certos dias da semana, moradores da vizinhança para rezar ladainhas. No oratório do Arco do Teles venerava-se a imagem de Nossa Senhora dos Prazeres. Tão escandalosas, porém, eram as cenas que a imagem presenciava que, revoltado com semelhante profanação, um dos moradores da zona, Manuel Machado de Oliveira, tomou a iniciativa de remover a santa imagem para a Igreja de Santo Antônio dos Pobres, onde até hoje se encontra.

Em começos do corrente século [século XX], em ação conjunta, a Polícia e a Prefeitura promoveram o saneamento moral e material do Arco do Teles e desde então, removida das proximidades a Praça do Mercado, modificados os costumes, ele ficou sendo simples passagem para trânsito comercial.

Em 1750, como já ficou registrado, a Câmara cedeu a sua casa, sobre a Cadeia Velha, para sede do Tribunal da Relação que acabava de ser criado no Rio de Janeiro. Passou a Casa das Vereanças a funcionar então no lado oposto do Largo, nas casas de Teles de Meneses de que alugou uma parte dos sobrados onde instalou todos os seus serviços de secretaria. Estava aí alojada quando, em 1757, a provisão régia de 11 de março lhe concedeu o título de Senado da Câmara.

Nos baixos, ou pavimento térreo, das casas dos Teles funcionavam várias lojas de pequenos mercadores. Entre elas, havia a de um belchior ou adeleiro, Francisco Xavier, mais conhecido por alcunha popular que a decência não permite reproduzir, mas que consta de autos antigos. Na noite de 20 de julho de 1790, irrompeu violento incêndio nessa loja. No empenho de salvar as mercadorias que ali guardava e representavam todos os seus haveres, pereceu nas chamas o belchior e com ele um menino que lhe servia de caixeiro e criado. O fogo propagou-se aos sobrados e comunicou-se à casa da Câmara, destruindo não só os móveis, alfaias e pertences, como o precioso arquivo municipal, do qual apenas se salvaram uns poucos livros que se encontravam eventualmente em poder do escrivão do Senado da Câmara. [...]

A perda irremediável do arquivo municipal representou prejuízo de extensas consequências. Até hoje, muitos pontos obscuros da história da cidade e numerosas controvérsias sobre a origem de posses territoriais e seu caráter alodial ou enfitêutico, não podem ser esclarecidos com exatidão em resultado daquele incêndio. [...]

O juiz Francisco Teles Barreto de Menezes mandou reconstruir os prédios de sua propriedade que o incêndio destruíra em parte. Quanto ao Senado da Câmara, passou a funcionar em prédios alugados, sucessivamente na Rua do Ouvidor, na Rua Direita, no Consistório da Igreja do Rosário, sem sede própria, até instalar-se por fim, em 1825, em casa especialmente construída, no Campo da Aclamação [...]

Vivaldo Coaracy, Memórias da Cidade do Rio de Janeiro, Coleção Rio 4 Séculos, pp.42-43

Arco do Teles visto da Travessa do Comércio.

Aqui também se vê claramente que o Arco hoje fica sob um prédio moderno.

Arco do Teles em ilustração de Washt Rodrigues para O Rio de Janeiro no Tempo dos Vice-Reis de Luís Edmundo

2 comentários:

Geraldo Reis Poeta disse...

Ivo e suas preciocidades! Um talento raro a serviço da informação, da história, da cultura, enfim. Na verdade, seu trabalho, que se não é premiado, é fruto de uma sensibilidade ímpar a serviço da sensibilidade, projetando o passado no presente e o presente no coração das gerações futuras. (Geraldo Reis)

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posta a sera serviço da

Evandro disse...

Adoro o Arco. E não nos esqueçamos que ali situava-se, logo à direita de quem vem da Praça XV, o bar com a maior quantidade de Nilton Bravos da cidade: o Bar Arco Teles, atualmente fechado. Cheguei a fingir-me de comprador, eu e meu amigo Rixa, só para poder ver as pinturas.... Não logramos sucesso.