Estação Bangu |
Tendo lido na imprensa sobre o novo sistema dos trens expressos da Supervia, que reduz os tempos de viagem nos ramais de Japeri e Santa Cruz, eu, o eterno explorador dos quatro cantos do Rio — e, confesso, tendo trabalhado treze anos na extinta Rede Ferroviária, trago ainda a ferrovia no sangue — resolvi dar minha conferida como “observador externo”.
Cheguei na estação Central do Brasil (oficialmente, Estação
Dom Pedro II) às 13:30 e o quadro de horários indicava que o próximo Santa Cruz
sairia em sete minutos. Embarquei. No horário marcado (suponho, estava sem
relógio), as portas fecham. Abrem de novo. Voltam a fechar e a abrir várias
vezes. Nos próximos vinte minutos, ninguém sabe se aquele trem vai sair ou não.
Não passa pela cabeça do maquinista orientar os passageiros pelo sistema de
alto-falantes dos vagões. Será que ele acha que está transportando carga?
Vinte minutos depois parte dos passageiros saem correndo até
o outro trem, em frente, na mesma plataforma. É o trem “seguinte” para Santa Cruz
que está em vias de partir.
A viagem é uma festa para os ambulantes. Vendem de tudo, de
barras de chocolate e de cereais (tudo mais barato que no comércio convencional)
até amolador de facas. É isso mesmo. Um vendedor simpaticíssimo munido de um
megafone fixa um amolador na parede do trem e põe-se a louvar suas virtudes,
com direito a demonstração com faca, tesoura. (Dizem que Silvio Santos começou
mais ou menos assim.) Um passageiro ao meu lado fala (comigo? brasileiro tem
essa virtude de falar com a pessoa ao lado): “Em casa tenho sete
facas cegas, será que isso amola mesmo?” Acaba comprando. Também a cinco reais...
A certa altura ouve-se um "batidão" em pleno trem.
É o vendedor de um CD de funks. Nada de proibidões, palavrões, adverte, são
funks clássicos. Um outro ambulante se anima e põe-se a dançar no
trem. Numa estação, sobe uma mãe com um bebê no colo. Logo alguém avisa: “Uma
mãe com um bebê, ninguém vai dar lugar?” E alguém cede o lugar (contrariado?)
Regras e disciplinas no país do Carnaval não são bem-vindas, mas informalmente dá-se um jeito.
Chego em Bangu após cerca de meia hora de viagem, uma marca
admirável. Vai tentar fazer esse trajeto de ônibus! O sistema de trens
expressos funciona mesmo! A refrigeração do trem não estava lá essas coisas,
mas aqui fora faz um calor de derreter catedrais, como diria Nelson Rodrigues.
O que vim fazer nessa lonjura? Vim fazer o que faço Rio afora: explorar. Meu
objetivo principal, a antiga Fábrica de Tecidos Bangu que deu início à
urbanização do bairro, antes zona rural. O complexo, no estilo da arquitetura industrial
inglesa da época com tijolos aparentes, depois que a fábrica fechou passou a
abrigar um shopping. Projeto mais do
que louvável que contribui para humanizar um bairro com poucos atrativos.
Bangu Atlético Clube, antigo Cassino da Vila Operária |
Uma última observação: na volta à Central, você mal consegue desembarcar do trem. As pessoas, na ânsia de pegarem um lugar sentado, entram feito estouro de boiada. Não posso criticá-las: deram duro o dia inteiro e ainda têm uma longa viagem pela frente.
4 comentários:
Olá Ivo. Quando fiz concurso para professora de História do que hoje é ensino médio, fui premiada com o Colégio Daltro Santos. Era muito longe, pegava ônibus na Santa Clara e depois o vermelhinho do Largo de São Francisco que ia para Campo Grande. Fui poucas vezes de trem, uma vez peguei um que era militar, carona que deram para os professores que desceriam. Normalmente voltava em pé, mas era jovem e a carga semanal era dividida em dois dias inteiros. Ruim ficou quando um filho adoeceu e naquela ocasião os telefones demoravam de dar linha. Parece pré histórico, não? Eu gostava muito da turma, fui homenageada mas assim que pude transferi-me para Copacabana. Ficou a saudade dos alunos que eram esforçados. Certo dia quase desmaiei por causa do calor.
Vejo pelo seu blog como mudou, Bangu evoluiu bastante, também lá se vai quase meio século.
Minha secretária reside lá e se queixa dos trens. Retiraram o que passava em Bangu, agora é como você descreve. Só que ela pega de madrugada e volta na hora do estouro da boiada. Muitas vezes pega os trens antigos, não os modernos chineses com ar condicionado.
Na Coréia e na China colocam funcionários com luvas para empurrar os passageiro que tentam adentrar os trens urbanos. (comentário enviado por e-mail e inserido aqui pelo editor do blog)
bom dia
Parabens. Posso comprar algumas fotos de vôce para um livro sobre o Rio ? Obrigado. Thomas Jonglez
thomasjonglez@hotmail.com
Acabei de ler seu texto Ivo, adorei. Achei divertido, bem leve e bastante enriquecedor. Parabéns pela iniciativa. Atenciosamente, Luiz da Pé de Moleque!
Acabei de ler seu texto Ivo, adorei. Achei divertido, bem leve e bastante enriquecedor. Parabéns pela iniciativa. Atenciosamente, Luiz da Pé de Moleque!
Postar um comentário