ENSEADA DE BOTAFOGO

ENSEADA DE BOTAFOGO
"Andar pelo Rio, seja com chuva ou sol abrasador, é sempre um prazer. Observar os recantos quase que escondidos é uma experiência indescritível, principalmente se tratando de uma grande cidade. Conheço várias do Brasil, mas nenhuma tem tanta beleza e tantos segredos a se revelarem a cada esquina com tanta história pra contar através da poesia das ruas!" (Charles Stone)

VISTA DO TERRAÇO ITÁLIA

VISTA DO TERRAÇO ITÁLIA
São Paulo, até 1910 era uma província tocada a burros. Os barões do café tinham seus casarões e o resto era pouco mais que uma grande vila. Em pouco mais de 100 anos passou a ser a maior cidade da América Latina e uma das maiores do mundo. É pouco tempo. O século XX, para São Paulo, foi o mais veloz e o mais audaz.” (Jane Darckê Avelar)

18.9.11

MODA DE PARIS


Rompera, enfim, a época da real e crescente celebridade Rua do Ouvidor pela dominação da Moda de Paris, essa rainha despótica que governa e floresce decretando, modificando, reformando e mudando suas leis em cada estação do ano, e sublimando seu governo pelo encanto da novidade, pela graça do capricho, pelas surpresas da inconstância, pelo delírio da extravagância, e até pelo absurdo, quando traz para o rígido verão do nosso Brasil as modas do inverno de Paris.

A Rua do Ouvidor tornou-se quase logo até além da Rua dos Latoeiros [atual Gonçalves Dias] comercial e principalmente francesa, e Sua Majestade a Moda de Paris, déspota de cetro de flores, sedas e fitas, fez mais do que o Marquês de Lavradio, que acabara com os peneiros [ou peneiras, visores de tabuinhas cruzadas nas portas], mais do que o Intendente Geral da Polícia Paulo Fernandes, que mandara destruir as rótulas [grades de ripas fechando as janelas, que o autor compara a "gaiolas onde os pais e maridos zelavam sonegadas à sociedade as filhas e as esposas"], porque, num abrir e fechar de olhos, alindou a rua com graciosas, atraentes e enfeitadas lojas e criou e multiplicou aquele chamariz e laços armados que se chamaram e ainda alguns chamam - as vidraças da Rua do Ouvidor - verdadeiro puff plástico.

A loja francesa de modista, de florista, de cabeleireiro e perfumarias, de charutaria (o cigarro era então banido como ínfimo plebeu) tinha, como ainda hoje se observa, uma única porta livre para a entrada das freguesas e fregueses, e outra porta ou duas portas cerradas de alto a baixo por grosso, mas transparente, anteparo de vidro, e atrás desse anteparo a loja expunha ao público os seus encantadores tesouros.

Tais eram, como continuam ser, as então chamadas vidraças [=vitrines] da Rua do Ouvidor.

Era e é ainda preciso ter muito cuidado com elas.

Explorando o concurso favorável do vidro, a variedade e a combinação das cores, e os efeitos da luz, os artistas sui generis arranjadores dos objetos expostos nas vidraças os dispõem e apresentam com habilidade magistral, de modo a produzir ilusões de ótica perigosas para a bolsa do respeitável, que, prevenido pelo que enlevara os olhos, muitas vezes compra gato por lebre.

Eu tenho para mim que foi na contemplação e no estudo físico e moral das vidraças da Rua do Ouvidor que os nossos estadistas organizadores de gabinetes ministeriais aprenderam a arte de expor programas de ministérios novos.

Em todo caso as vidraças de exposição mais ou menos ricas, fantásticas e deslumbrantes enfeitaram a Rua do Ouvidor, que logo foi tida em conta de a mais bonita da cidade e naturalmente mereceu a predileção e a concorrência mais graciosa e aditadora.

As senhoras fluminenses entusiasmaram-se pela Rua do Ouvidor, e foram intransigentes na exclusiva adoção da tesoura francesa. Nem uma desde 1822 se prestou mais a ir a saraus, a casamentos, a batizados, a festas e reuniões sem levar vestido cortado e feito por modista francesa da Rua do Ouvidor.

Houve revolução econômica: os pais e os maridos viram subir a cinquenta por cento mais a verba das despesas com os vestidos e os enfeites das filhas e das esposas.

A rainha Moda de Paris firmou seu trono na Rua do Ouvidor.

Trecho do Capítulo 10 de Memórias da Rua do Ouvidor de Joaquim Manuel de Macedo, autor de A Moreninha, o primeiro best-seller da literatura brasileira. Saiba mais sobre o autor e a coleção Carlos Mônaco Leu e Recomenda clicando aqui.

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