ENSEADA DE BOTAFOGO

ENSEADA DE BOTAFOGO
"Andar pelo Rio, seja com chuva ou sol abrasador, é sempre um prazer. Observar os recantos quase que escondidos é uma experiência indescritível, principalmente se tratando de uma grande cidade. Conheço várias do Brasil, mas nenhuma tem tanta beleza e tantos segredos a se revelarem a cada esquina com tanta história pra contar através da poesia das ruas!" (Charles Stone)

VISTA DO TERRAÇO ITÁLIA

VISTA DO TERRAÇO ITÁLIA
São Paulo, até 1910 era uma província tocada a burros. Os barões do café tinham seus casarões e o resto era pouco mais que uma grande vila. Em pouco mais de 100 anos passou a ser a maior cidade da América Latina e uma das maiores do mundo. É pouco tempo. O século XX, para São Paulo, foi o mais veloz e o mais audaz.” (Jane Darckê Avelar)

19.5.06

POESIA JOVEM

(ILUSTRADA COM GRAFITES)


Existe uma poesia jovem, assim como existe uma música jovem, uma moda jovem? Se você pesquisar “poesia jovem” no Google, encontrará mais de quinhentos ocorrências. Mas em que a poesia jovem se distingue da poesia “não-jovem”? Quais as características da poesia jovem? O falecido (e querido) Antonio Carlos Villaça sintetiza bem o espírito da juvenilidade poética no belo prefácio que escreveu para o livro Visão “Burracha” de um mundo sóbrio dos poetas Bruno Chagas Barbosa, Daniel Luz, Gildázio Agra e Rian Gomes Corrêa. “São poemas juvenis” — diz Villaça — “verdadeiramente e felizmente. Poemas intensamente juvenis. Esta juvenilidade nos cativa. Há sempre a busca do outro. A procura do Amor. [...] Superar a solidão, encontrar o amor, eis o que esses poemas nos trazem comovidamente, emotivamente, tão reveladores de um desejo ardente de viver. Os poetas querem viver. Querem construir o futuro. [...] Eles querem construir a própria vida, a felicidade de cada dia, a vitória sobre o tempo e a solidão. Os jovens poetas querem criar o seu próprio destino.” Vejamos o que os jovens poetas cariocas têm a dizer.



Vivendo em mundo sóbrio

Vida corrida, mundo sufocante,
Adrenalina do dia-a-dia instigante.
De olhos abertos não consigo enxergar,
E a minha mente perece sem trabalhar.

O homem sóbrio não sabe viver,
Somente assimila o sofrer.
O mundo sóbrio apenas concebeu
O pensamento do somente eu.

Quando começo a me entorpecer
A realidade consigo ver.
Enxergo sem os olhos usar,
E minha mente começa a trabalhar.

O mundo sóbrio quer me rotular
Pois a mim não podem manipular.
Prefiro ser o sonhador de Cervantes
Do que ser um sóbrio ignorante.

Julgam-me por saber
Como neste mundo viver.
Hoje ser lúcido é "maluquez",
E a minha loucura é a verdadeira lucidez.

Bruno Chagas Barbosa (do livro Visão "burracha" de um mundo sóbrio)



mergulho

Não leve nada à minha boca
que não seja mar
navio em ressaca
peixe desbravando meus vazios
Só traga à minha boca
o que tem sal
desenhe em mim o salto de um golfinho
quem sabe gaivotas sobre a língua
dela farão
nosso ninho
Só leve à minha boca o que me mude
que seja a farpa de um ouriço
mas me invada
flauta sobre a pedra a ostrar conchas
me guarde nelas
me faça pérola
mas não guarde nada em mim
que tenha chaves
não quero trancas maçanetas
é o mar aberto
que beija minhas baías
Não leve nada à minha boca
sem paixão
para que vejamos
de longe
perto
o que atrás do horizonte
ainda é pôr/nascer-de-sol
no coração

Igor Fagundes. Carioca, 24 anos. É poeta, contista, ensaísta, dramaturgo, jornalista e ator. Autor dos livros de poemas Transversais (2000), sete mil tijolos e uma parede inacabada (2004) e por uma gênese do horizonte (2005, no prelo). Poema obtido no site Panorama da Palavra.



Cortinas

Fechando cortinas
Eu inventei minhas noites
Calei meus olhos
Não esperei mais nada

Dormi no meio do sonho
De um dia insone
Tomei a voz de um cicerone

Na meia-luz do raio que entra pela fresta
Faço um alarde nestas folhas sem pauta
É mais que o choro, é mais que a flauta
É mais que uma festa

Da minha língua latina
Faço palavra bailarina
Ressuscito flores que morreram

Persianas fechadas
Mas aqui dentro é dia claro
Sei começar e terminar jornadas

Thiago Oliveira (do folheto Teague, o bardo, que o autor me vendeu na porta do Centro Cultural Banco do Brasil)



Silêncio

Escute o vão
o silêncio
O calar do som
Um contra-anseio peralta
O branco na pauta
Em suas infindas pausas
insuflação divina à arte
o vazio em alarde
que se parte
no ranger dos dentes
no pulsar dos corpos
no querer de um povo
no erigir da vida
ou no esvair da tez
Insistes em não se exibir, silêncio
Pois há de existir
no não ouvir da surdez

Marcelo Felippe (do livreto Duas artes: palavras rabiscos de poesias faladas caladas que o autor me vendeu na entrada do Centro Cultural Telemar). Carioca, 25 anos, embora esteja se graduando em música pela UNIRIO, revela que "me vejo a cada dia tomado de poesia, não apenas subjetivamente; o que a literatura me concede chega até a sufocar minhas intenções musicais".


Liquidificando pensamentos

Meu Melhor Medo é Misturado com Música.
Encenando Enredos, Envolvo Exaustivamente Erros Éticos.

Unicamente Unido aos Urros, Ultrajo o Ultimato.
Finalizando as Feias Formas Físicas.

Anulam-se os Alicerces Alados do Amor.
Digo que Depois Disso Derramar-se-ão Débeis Desejos.

Poesia Pouca e Porca, Priva-me do Puritanismo.
Sem Sentido, Sentindo a Sensibilidade Sôfrega.
Faço Fantasias Falsas, Forçadas e Faltosas.

Alto no Abismo, Atrapalho-em Atento às Aberturas.
Choro Chamando Cada Cabeça Chapada, e
Drogadas Desistem de Determinar os Dias Dantescos.

Novamente, Nocivo ao Nostálgico e Narciso ao Novo,
Corro, Caçando o Caráter Céptico dos Capachos.

Todo Trêmulo, Tiro as Transitoriedades,
Sendo Sereno, Sigo Semeando Sensatez e
Tentando Terminar a Trajetória com Três.

Daniel Luz (do livro Visão "burracha" de um mundo sóbrio)


Idealismo

Quem destruirá nossas idéias?
De um mundo melhor os ideais?
Quem sabe, a ditadura opressora?
Não! São impotentes os cassetetes.
Quem destruirá nossas idéias?
Será a opressão de nossos pais?
Não! Pensamentos idealistas
Encontram à frente um só rival:

O tempo, corrosivo, é o inimigo terrível!
Um dia, burgueses, os nossos ideais mortos.
E, em protesto pelas ruas, os nossos filhos:

– Abaixo a ditadura dos pais

(Do editor deste blog na época em que era adolescente)


Fotos de grafites tiradas por Ivo & Mi na margem da Lagoa Rodrigo de Freitas e acesso ao túnel Rebouças, no Rio de Janeiro. Se gostou dos grafites, clique no marcador "arte nas ruas" abaixo para ver mais.

15 comentários:

Anônimo disse...

Oi, Ivo!
Boa surpresa p/a este domingo meio baço e de interrogações. Ao menos esses jovens trazem alento... "O Mergulho", primoroso trabalho de Igor Fagunes, o Thiago em "Cortinas", da esperança necessária, e o seu desabafo adolescente, mas que nos acena e salva com a Resistência.
Gostei muito, muito!
E os grafites, tão lindos!
Bjcs, Léa

Anônimo disse...

Olá Ivo,
Adorei saber que a poesia ainda vive nas preocupações desses jovens poetas e no ato altruísta de teu compartilhar conosco suas palavras.

Abraços
Jean-Pierre

Anônimo disse...

Fala Ivo,
Obrigado por ter dado está força aos Los Burrachos. Nós jovens poetas e ainda não conhecidos do grande público precisamos de todo o espaço possível.
Se você quiser algum outro poema que não esteja no livro é só me falar.
Abrax. Inté.

Anônimo disse...

Oi, Ivo!

Quero agradecer muitíssimo pela oportunidade de divulgar meu trabalho e, claro, pela alegria de estar ao lado de outros companheiros que também querem e merecem ser levados a público.

Gostei muito das ilustrações também.

Apesar de não gostar muito dessas classificações (poesia jovem, poesia gay,poesia feminina) por vários motivos (para mim, o que é a poesia) e não me enquadrar na perspectiva do confessional, achei primorosa sua iniciativa de dar visibilidade a jovens talentos.

Abraço forte
Igor Fagundes

Anônimo disse...

rsss


errata: para mim, o que há é a poesia. (corrigindo)eheheh

abraços
Igor

Anônimo disse...

Oi, Ivo!

Reiterando...
Gostei! Gostei muito, inclusive dos grafites! Mas fiquei meio em dúvida se foram tomados daqui, de nossas ruas, ou de Nova York ou outra cidade americana. Por que a garotada não se assume, em Português mesmo ? ? ? Precisamos recuperar o que é nosso, inclusive nossa Língua, principalmente quando o que está em jogo é a criatividade!
Mas, no mais, é parabenizá-lo pela persistente busca do que vai em nossa cultura, pelas ruas da cidade, e no vigor Literatura.
Bjcs, Léa

Anônimo disse...

Oi, Ivo!

Percebendo melhor, vejo os nomes nos grafites como criação de palavras ou, algumas vezes, mistura de inglês/português. É isso, então ! ! !
Bjcs,Léa

Ivo Korytowski disse...

Pois é, Lea, brotamos do latim, recebemos contribuições do grego, do árabe, das línguas africanas e indígenas, tivemos o período em que a moda era imitar os franceses, temos pizza do italiano, kiwi do japonês, chope do alemão... e agora... chegou a vez do inglês!!!

Oi Igor, obrigado pelo comentário simpático. Claro que cada poeta é um poeta e toda tentativa de enquadramento é parcial mas existe um certo vigor e viço e ímpeto na juventude que vai se perdendo no confronto com a vida - e a poesia jovem reflete um pouco disso, o próprio Drummond jovem difere do Drummond mais "velho". Mas cada um tem seu jeito e seu estilo e sua estética pessoal. E viva a poesia!

Anônimo disse...

q lindooooo amei. ivo saudade. (enviado por e-mail de Sampa)

Anônimo disse...

Oi, Ivo!

Desculpe! Eu não pude evitar!
Importam bem mais a beleza e a força da expressão contidas nessas artes todas, de traços livres!
Se houve muitas influências históricas, contudo, mais forte (e não é de hoje!), vem o ranço da dominação. E do norte impera! Que me perdoem Hemingway de um lado e, de outro, Shakespeare, só pra falar de sangue bom.
A questão que sobrevive, há um bom tempo, é de hegemonia mesmo,fazendo inveja à Roma Antiga!
Mas vamos curtir nossas artes, conscientes do que estamos fazendo, pra poder respirar liberdade! Importante é apostar no lado bom. Mas apostar mesmo!
Isto que estou fazendo aqui agora: parabéns! Cultive sempre esse tão precioso espaço com a simpatia e competência que você possui e nos presenteia, a cada nova matéria!

Obrigada! Léa

Anônimo disse...

O jovem, mais do q ninguém, tem o direito de ser poeta. Sonha-se mais e todos os sentimentos são profundos...

Qdo se tem a alma fresca, sabe-se falar sobre a leveza da vida, e o sorriso fácil pode se encontrar nos versos mais melancólicos.

Gostei mto dos meninos, mas tb gostei dos anônimos poetas grafiteiros, do realismo do primeiro e do romantismo do último!

(enviado por e-mail do Canadá)

Anônimo disse...

Olá, Ivo! Como vc está? Correria, não?!

Amigo, este não é o tipo de poesia que aprecio, mas pelo menos é melhor do que um monte de rabiscos que vemos por aí. Acho um absurdo!

Você tb precisa aparecer, sinto tua falta!

Um forte abraço, querido :)

Anônimo disse...

Credo Ivo, com tantos grafites maravilhosos vc foi logo ilustrar com um tão mórbido, com caveiras...avvvvv......!!!!...Põe um mais "light"..."please".... (enviado por e-mail)

Anônimo disse...

Ivo

Tenho lido suas mensagens e sempre as aprecio. Você tem escrito muito sobre o Rio, daí percebi que ama esta cidade com toda a sua história e beleza. Agradeço pelos poemas e poesias que sempre me envia. Você tem o dom da palavra juntando-a com a magia, isso os torna muito lindos.

Beijos, Regina Simone.

thaina disse...

Olá!
Bem, estou adentrando mais profundamente no mundo da poesia, da literatura somente agora mesmo, e ver este blog aqui foi muito agradável visto que amo minha cidade, apesar dos pesares, a poesia em si e ainda vinculada ao Rio Maravilhoso é uma equação de resultado positivo, além de ser uma dízima...

Parabéns pela página virtual!

Thainá Cordovil.