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Fábrica Piraquê, do outro lado da via férrea, em Turiaçu, vista do Parque de Madureira: "o parque é um oásis de lazer e convivência numa região suburbana antes totalmente carente de áreas assim" |
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"quando passava pela passarela que conduz ao outro lado da via férrea, na altura da Fábrica Piraquê, ficava curioso em saber o que existe do lado de lá" |
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Painel de azulejos na fachada de uma casa em Turiaçu |
Não sei se Eduardo Paes será pego pela Lava Jato, mas sei
que deixou um legado para a cidade: a nova orla no Centro Histórico, o BRT, o
VLT e o Parque de Madureira. Quem não conhece o subúrbio não sabe, mas o parque
é um oásis de lazer e convivência numa região suburbana antes totalmente
carente de áreas assim. O parque atende a quatro subúrbios – Madureira,
Turiaçu, Rocha Miranda e Honório Gurgel – e desmente aquele preconceito da elite de
que o “povo” não “cuida” dos bens públicos, depreda, emporcalha, essas coisas. A galera
do subúrbio cuida do parque como se fosse sua própria casa. Mas não é exatamente este o
tema desta postagem.
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Primeira Igreja Batista de Turiaçu |
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"Nesses bairros mais remotos a ação do Estado ainda é tênue" |
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"Num botequim, um grupo de cidadãos joga um carteado em plena hora de expediente" |
A viagem até a estação Mercadão de Madureira (antiga
estação Magno) já é uma aventura. O trem para Belford Roxo sai da Central mais
ou menos de meia em meia hora (12:20, 12:51, 13:21, 13:51, está no site da
Supervia) e passa por lugares onde você jamais passaria normalmente, por
exemplo, dentro da favela do Jacarezinho, onde você chega a ver uma
minicracolândia, imunda, à margem da via férrea, gente misturada com lixo.
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Vivenda São Jorge (Turiaçu) |
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"Na Igreja de Santa Rita aprecio os belos painéis de azulejos da Paixão de Cristo pintados por Manoel Félix Igrejas" |
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Igreja Presbiteriana de Rocha Miranda |
Nas vezes em que fui ao Parque de Madureira, quando passava
pela passarela que conduz ao outro lado da via férrea, na altura da Fábrica
Piraquê, ficava curioso em saber o que existe do lado de lá. Pois hoje (depois
de um estudo prévio no Google Maps para não entrar em áreas de risco) fui até lá. O
bairro chama-se Turiaçu. Depois vem Rocha Miranda e Honório Gurgel.
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"nas calçadas, tão acidentadas quanto a superfície lunar" |
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Esquina em Honório Gurgel |
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"casinhas singelas, embora algumas com acabamento modernoso nem sempre de bom gosto" |
Nesses bairros mais remotos a ação do Estado
(especificamente, da Prefeitura) ainda é tênue: os carros estacionam impunes
nas calçadas, que não são de pedras portuguesas como nos bairros nobres, mas de
um cimento ou pedrinhas ou mesmo terra, tão acidentadas quanto a superfície
lunar. Existem bolsões de classe média, com casinhas singelas, embora algumas
com acabamento modernoso nem sempre de bom gosto. Mas tem muita casa mal-acabada, algumas
com tijolos aparentes, e nos morrinhos mais ao longe as indefectíveis favelas,
que dão o contraste tão típico do Rio. E pichações emporcalham tudo. Num botequim, um grupo de cidadãos (alguns com cara de aposentados, outros não) joga um carteado em plena hora de expediente. Desconfiados porque tirei uma foto (de longe), alertam que em certas áreas
(Chapadão e adjacências) fotógrafos são recepcionados a bala. Bala perdida?,
observo, irônico. Não, bala achada, respondem.
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Igreja Batista Central em Honório Gurgel |
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Verde e amarelo em Honório Gurgel |
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Estação Honório Gurgel |
Na Igreja de Santa Rita aprecio os belos painéis de azulejos da Paixão de Cristo pintados por Manoel Félix Igrejas, de que tomei conhecimento graças ao blog A Vida Numa Goa do meu amigo
Evandro von Sydow. Em Rocha Miranda fotografo a
graciosa igrejinha presbiteriana com elementos neogóticos. Em Honório Gurgel, a imponente Igreja Batista Central, que vista do
parque de Madureira parece um castelo, sobre discreta colina. No acesso à
Estação Honório Gurgel, um pessoal com fenótipo de traficante. O trem chega
cheio, mas sempre cabe mais um (como aprendemos há alguns anos na propaganda do
Rexona). Aí está o verdadeiro povo, miscigenado, desassistido, longe dos
barzinhos de Zona Sul onde outrora a “esquerda festiva” discutia, e hoje a
esquerda "raivosa" discute (imagino) as utopias que supostamente “salvarão” este
povo cujo cheiro sequer conhecem. Uma criança abre um berreiro. Um ambulante,
com um vozeirão, oferece empadas quentinhas por um real! Dentro de um trem!
Outros vendedores oferecem artigos variados a preços bem abaixo do comércio estabelecido
que (segundo reportagem investigativa recente do Extra) procederiam do sem-número de caminhões de entrega assaltados por
esse Rio de Janeiro afora. Na viagem alguém me conta que certa vez virou a noite trabalhando e, quando saiu da firma às seis da manhã, pego numa blitz da polícia, os guardas, vendo seus olhos vermelhos (de sono), acharam que fosse maconheiro. "Quem não tem colírio usa óculos escuros", observo, citando a genial frase do Maluco Beleza.
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Mas tem muita casa mal-acabada, algumas com tijolos aparentes |
Na minha andança suburbana consegui tirar algumas fotos aproveitáveis.
Curtam!
5 comentários:
De fato, ainda que caótico o subúrbio carioca tem seus encantos. A dicotomia uniformidade x diversidade está presente nas formas - para nós - exdrúxulas e que são representações (ou reinterpretações) das formas que tornamos clássicas. Curioso que a arquitetura moderna tornou-se mais difícil de "estilizar' do que a "clássica", a que nos habituamos em nossos estudos.
Os registros feitos pelo autor do blog, o inquieto e estudioso Ivo, no conjunto de seu trabalho, dá um painel daquela diversidade e sevirá para os estudiosos do presente sobre os acumulados do passado e o enigma do futuro.
Essa era uma região muito aprazível até uns 30 anos atrás. Uma pena que a prefeitura parece ter desistido de aplicar a lei e a ordem depois da década de 1960, a despeito de Madureira ser um dos bairros com maior arrecadação de ICMS do Rio.
Ali próximo à praça de Rocha Miranda ficava o Cine Guaraci, com fama de um dos mais bonitos da cidade.
Eu li, o autor parece um turista no subúrbio, o q é raro 😂😂.. bom texto para contemplar a 'alma do subúrbio'. (comentário postado no Facebook e inserido aqui pelo editor do blog)
O pesquisador e escritor Ivo Korytowski publica em seu blog mais um excelente artigo sobre o Rio de Janeiro, desta vez ele vai aos bairros de Turiaçu, Rocha Miranda e Honório Gurgel e disserta sobre as agruras e os encantos do subúrbio carioca. (comentário postado originalmente no Facebook)
Me criei em Turiaçu, faltou fotos da feira de Honório, das antigas pedreiras de Turiaçu, das chácaras de verduras plantadas por imigrantes portugueses e portuguesas que ficam sob a fiação da rede de transmissão elétrica, da antiga estação de trem de Turiaçu, que fica entre as de Magno e Rocha Miranda, ainda operantes, dos morros reflorestados em acordo entre a UFRRJ e a prefeitura do Rio de Janeiro na década de 1980-1990. Enfim, esta é somente uma parte do que temos por lá.
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