ENSEADA DE BOTAFOGO

ENSEADA DE BOTAFOGO
"Andar pelo Rio, seja com chuva ou sol abrasador, é sempre um prazer. Observar os recantos quase que escondidos é uma experiência indescritível, principalmente se tratando de uma grande cidade. Conheço várias do Brasil, mas nenhuma tem tanta beleza e tantos segredos a se revelarem a cada esquina com tanta história pra contar através da poesia das ruas!" (Charles Stone)

VISTA DO TERRAÇO ITÁLIA

VISTA DO TERRAÇO ITÁLIA
São Paulo, até 1910 era uma província tocada a burros. Os barões do café tinham seus casarões e o resto era pouco mais que uma grande vila. Em pouco mais de 100 anos passou a ser a maior cidade da América Latina e uma das maiores do mundo. É pouco tempo. O século XX, para São Paulo, foi o mais veloz e o mais audaz.” (Jane Darckê Avelar)

17.4.13

RECANTO DO TROVADOR, ANTIGO JARDIM ZOOLÓGICO (VILA ISABEL)

Portão do Recanto do Trovador, executado nas Fundições Val d'Osne na França, semelhante ao existente no Campo de Santana

Criado em 1888, o primeiro Jardim Zoológico do Rio de Janeiro [onde hoje se situa o Parque Recanto do Trovador] fez parte dos planos modernizadores do Barão José Batista de Vianna Drummond para a região. Após a proclamação da República e sem os recursos do imperador, o empreendimento tornou-se um dispendioso encargo financeiro. Assim, com a intenção de custear a manutenção do Jardim Zoológico o Barão de Drummond criou o jogo do bicho. No local encontra-se a primeira parte do gradil original do Campo de Santana e um portão executado nas Fundições Val d'Osne na França. (Guia do Patrimônio Cultural Carioca)

Da esquerda para a direita: Pico do Andaraí Maior, Pico da Tijuca, Pedra do Andaraí (bem no meio e mais à frente, também conhecida como Pedra do Grajaú) e Morro do Elefante. Logo mais à direita da árvore aparece um pedacinho da Serra dos Pretos Forros por onde passa a Estrada Grajaú-Jacarepaguá. 
Pista de skate

Crianças

Parte do antigo gradil do Campo de Santana (ver texto abaixo)

Na época da abertura da Avenida Presidente Vargas, o Campo de Santana perdeu 18 mil metros quadrados. Os imponentes portões, que estiveram na Exposição Universal de 1862, realizada em Londres, continuam a embelezar as entradas do parque, porém o gradil não está mais lá. Logo depois da Proclamação da República, os brasões do Império, fundidos segundo os caprichosos desenhos de Glaziou, foram substituídos pelas armas da República. Em 1938, o gradil foi retirado e espalhado por quatro locais diferentes da cidade, tão grande era sua extensão. Pode ser apreciado no prédio da UFRJ na Urca, na parte que confronta com a Avenida Wenceslau Brás; na saída da Floresta da Tijuca, no Portão do Açude; na Sociedade Hípica Brasileira, na Lagoa; e no Recanto do Trovador, em Vila Isabel, onde também existe um portão semelhante ao do Campo de Santana. (Eulalia Junqueira e Pedro Oswaldo Cruz, Arte Francesa do Ferro no Rio de Janeiro, Memória Brasil, pp. 118-121)


Comunidade do Morro dos Macacos. No tempo do domínio do tráfico, o parque passou a ser considerado área de risco e caiu no abandono. Com a pacificação, no final de 2011 a Prefeitura remodelou o parque, que agora está uma beleza.

TRECHO DO LIVRO GANHOU, LEVA! O JOGO DO BICHO NO RIO DE JANEIRO (1890-1960), DE FELIPE MAGALHÃES:


Cidade de São Sebastião do Rio de Janeiro, 3 de julho de 1892. Nesse domingo de inverno carioca foram inaugurados vários divertimentos na empresa do Jardim Zoológico, de propriedade do sr. João Baptista de Viana Drummond, o barão de Drummond. O parque estava localizado no “pitoresco bairro de Vila Isabel”, na encosta da serra do Engenho Novo. Por ser um dia especial, a Companhia Ferro Carril Vila Isabel dispôs carros especiais para levar o público e os convidados até as dependências do zoo.

Esbanjando a cordialidade de um nobre, associando-a aos interesses de um empresário, o barão recebeu seus ilustres convidados, entre os quais o vice-presidente da República, cuja presença foi saudada por todos com um brinde à mesa do jantar. No agradável passeio, tendo em vista o clima ameno e a satisfação de todos, o barão e seu gerente Manoel Zevada lhes apresentaram as dependências do Jardim. Além das jaulas, gaiolas e viveiros presentes em qualquer empreendimento desse porte, a empresa de Drummond contava com um hotel “nas melhores condições, um magnífico restaurante e tinha em construção um grande salão especial para concertos”.

Os visitantes ainda poderiam passar seu tempo divertindo-se em animados bailes públicos, no circo de cavalinhos, em variados espetáculos ou fazendo apostas em alguns jogos liberados para aquelas dependências. Havia bilhar, carteado, jogo da pelota, frontão e outros. No entanto, esse domingo era especial, um novo divertimento estava para ser inaugurado.

Ao comprar o ingresso de entrada para o Jardim Zoológico, o visitante passaria a receber um ticket. No bilhete estaria impressa a figura de um animal. Pendurada num poste a cerca de três metros de altura, próxima ao portão de entrada do parque, havia uma caixa de madeira. Dentro desta ficava escondida a gravura de um animal, escolhida pelo barão em uma lista de 25 bichos que ia de avestruz a vaca, passando por borboleta e jacaré. Nesse domingo, às cinco horas da tarde, a caixa seria aberta pela primeira vez, e o público presente poderia, afinal, descobrir o animal encaixotado e saber se teria direito ao prometido prêmio de 20$000, 20 vezes o valor gasto com a entrada para o zoo. Na hora marcada, o barão dirigiu-se até o poste, revelou a avestruz e fez a alegria de 23 sortudos visitantes. (pp. 19-20)

13.4.13

TAMOIOS NO ARPOADOR





Texto de Zuenir Ventura publicado originalmente no encarte "Aniversário do Rio" de O Globo de 1o de março de 2013 e reproduzido com a gentil permissão do autor.

Aconteceu neste verão. Convidado a escrever sobre um canto do Rio, escolhi o Arpoador, porque de lá se costuma desfrutar deslumbrantes entardeceres. Os termômetros marcavam quase 40º, com a sensação térmica beirando os 50º. Sentado nas pedras, apreciava o sol refletir com tal intensidade sobre o mar espelhado que devo ter experimentado aquela ilusão ótica que no deserto se chama miragem. A gente entra num clima onírico e acredita ver o que não existe. De repente, senti uma urgência febril de dividir aquele espetáculo mágico com alguns personagens que cantaram e encantaram o Rio. A primeira aparição foi de Millôr, que veio correndo pela areia, como sempre fazia. Passou pelo largo que agora leva o seu nome, subiu até onde eu estava e repetiu uma de suas geniais definições: “O pôr do sol é de quem olha”. Em seguida, foi a vez de Tom e Vinicius, que atravessaram o Parque Garota de Ipanema carregando o violão. Tinham acabado de acordar, após uma longa noite de boemia. Finalmente, vindo de Copacabana, chegou Oscar Niemeyer, trazendo nos olhos as curvas das mulheres e dos morros cariocas com que fez sua arquitetura.

Como não podia deixar de ser, a conversa girou em torno dessa cidade solar, sensual, exibida que nasceu para ser musa. Falou-se principalmente do narcisismo de quem desde pequena se habituou aos elogios. Era ainda uma criança quando um de seus adoradores, o primeiro governador-geral Tomé de Souza, se desmanchou: “Tudo é graça o que dela se pode dizer”. Alguém lembrou que até os religiosos lançaram sobre ela olhares profanos: “É a mais airosa e amena baía que há em todo o Brasil”, suspirou o padre Anchieta, inteiramente catequizado. Seu colega da Companhia de Jesus, o padre Fernão Cardim, sentiu o mesmo: “É coisa fermosíssima e a mais aprazível que há em todo o Brasil”.

Estimulado pela exuberância sensorial daquela tarde, resolvi corrigir Vinicius, que dizia que ser carioca é um estado de espírito. Acho que é mais. Não se trata apenas de alma, mas de corpo e alma. Ama-se a cidade com todos os sentidos, a começar pelos olhos. Olha que coisa mais linda uma garota de Ipanema a caminho do mar. Ela vai se molhar e se estender nas areias para dourar seu copo quase nu. Segundo Tom, que transformou em música tudo isso, esse rito hedonista, quase erótico, é uma herança de nossos antepassados tamoios, que nos ensinaram a curtir a água, o corpo, a música e a dança.

O sol já estava sendo rendido no seu plantão diário, e os banhistas noturnos começavam a estender suas cangas na areia para o mais novo modismo deste verão: o banho de lua. Foi quando chegou Cazuza para fazer parte do show. Antes de dar um mergulho, cantou: “Vago na lua deserta das pedras do Arpoador”.

Nunca me senti tão tamoio quanto nesse fim de tarde, início de noite nas pedras mágicas do Arpoador.

23.3.13

O IMPREVISTO E O INESPERADO, de Teresa Souza

Frescão é um meio de transporte muito confortável e que adoro.
Dá para colocar a agenda em dia, verificar extratos, acertar a sobrancelha, ler o jornal, cochilar no ar condicionado, etc. etc. etc.
Coisas  simples e que geralmente não conseguimos tempo para fazer ao longo do dia.
Quando eu chegava ao Centro da cidade, um telefonema anunciando um imprevisto cancelou o meu compromisso. 
E agora? Eram 10 horas da manhã e eu só precisava estar em Ipanema às 13. O que fazer?
Descer do ônibus e voltar para o Jardim Botânico? Nada disso.
Resolvi me divertir no Centro do Rio e fazer coisas que normalmente só fazemos em países distantes.

Desci na rua 1º de março e a Igreja do Carmo estava aberta!
Só entrei lá em criança em algum casamento de família.
Como é linda! Enorme!
Pouquíssimas pessoas em um silêncio sepulcral à meia-luz.
Um som bem baixinho onde Roberto Carlos, o rei, cantava uma canção religiosa.
Sentei e me pus a observar: as imagens, a construção, os vitrais, as cúpulas, o altar, o silêncio. O silêncio.
Fiz uma oração e saí feliz continuando o meu caminho.


Seguindo em frente lembrei, graças a Deus e à Igreja do Carmo, da exposição sobre Leonardo Da Vinci na Casa França Brasil a poucos metros dali.
Que homem genial! Que sensibilidade, que arte maravilhosa.
Descobri que Da Vinci é sépio. A exposição é toda cor sépia. 
As imagens, os papéis, os objetos, os códices.
Ele disse: “Quando o espírito não trabalha com a mão, não existe arte.” 

Saí de lá uma pessoa melhor, muito melhor. 
Saí de lá emocionada pela oportunidade de ter visto o que vi.


Quando me dirigia para o metrô percebi que a Igreja da Candelária também estava com as portas abertas. Seria um sinal divino?
Ia ter uma missa meio-dia e meia.  
Vi os desenhos pintados na calçada dos meninos mortos na chacina. 
Vi a cúpula mais bonita de todas.
Ouvi um órgão gregoriano.
Vi o tapete vermelho enrolado em um grande carretel. 
Vi o padre com seu manto branco arrumar o altar.

Me benzi e me retirei.
Abençoada por Deus e Da Vinci.


Texto do livro de crônicas Palavra Carioca reproduzido com autorização da autora. O livro está à venda na livraria da Casa de Cultura Laura Alvim. Visite o blog da autora O Rio Que Eu Piso.

6.3.13

MUSEU DE ARTE DO RIO (MAR)

Para ver um álbum de fotos do museu numa nova janela clique aqui.

O recém-inaugurado Museu de Arte do Rio compõe-se de dois prédios interligados, com uma bela cobertura ondulada no alto: 1) um prédio moderno à esquerda, antiga estação rodoviária, por onde se entra no museu, sediando a Escola do Olhar, com um mirante no alto, e 2) o prédio da direita, antigo Edifício Príncipe Dom João, em estilo eclético, construído em 1912, cujos quatro pavimentos abrigam as exposições do museu.
Quem curte o Rio de Janeiro não pode perder a Rio de imagens, com fotos, gravuras, quadros, mapas, filmagens etc. da cidade em diferentes épocas, uma das quatro exposições (todas ótimas) que ocupam o museu. O texto abaixo é dos curadores dessa exposição.

Para informações de endereço, horário, preço e como chegar lá (incluindo um mapa da área), consulte o Guia do Rio, o seu guia carioca simples, prático e grátis, neste mesmo blog. Basta clicar na guia MUSEU DE ARTE DO RIO (MAR) lá em cima, no cabeçalho do blog.


"Ao contrário do que reza o senso comum, a natureza não é constituída por paisagens. Ela contém montanhas, vales, rios, baías e muito mais; mas o que transforma essas formas naturais em "paisagem" é o olhar de quem enxerga, recortando-as em enquadramentos e agrupando-as em composições. É certo que a "vista" está tanto em quem vê quanto naquilo que é visto. No caso da cidade do Rio de Janeiro, no entanto, é possível duvidar dessa evidência. A disposição ímpar de rochas, praias e matas que compõem esse cantinho do planeta parece tão planejada, tão perfeita, que conspira contra a própria noção de “acidente geográfico”. Quem enxerga pela primeira vez a Baía de Guanabara tem bons motivos para ficar deslumbrado. Não é à toa que, ao longo dos séculos, incontáveis viajantes deixaram registrado seu encantamento, propagando a fama mundial da cidade como uma das mais belas do mundo.

O Rio de Janeiro é mesmo uma obra de arte, mas não da natureza. Afinal, quem produz arte são artistas. [...]" 

(Carlos Martins & Rafael Cardoso, curadores da exposição Rio de imagens: Uma paisagem em construção, uma das quatro exposições que inauguraram o museu.)

4.3.13

A CIDADE SUSPENSA

Texto de J. P. Cuenca publicado originalmente no encarte "Aniversário do Rio" de O Globo de 1o de março de 2013 e reproduzido com a gentil permissão do autor.
Fotos de ruínas e prédios dilapidados no Rio do editor do blog.


A primeira lembrança que tenho da vida e do Rio é a dos meus pés de criança se equilibrando sobre uma casa demolida. Vejo pedras e tijolos entre o emaranhado de canos inúteis, alcanço uma pia branca de cabeça pra baixo — seu apoio comprido de louça desponta entre as ruínas como uma garça que estica o pescoço num lamaçal.

Quando encontro no chão o adesivo colado na janela do meu quarto, finalmente reconheço a casa onde vivi. O plástico, meu rosebud, diz em letras garrafais: "FIORUCCI".

Isso foi em 82 ou 83. A Vila Palácio ficava na Rua Silveira Martins, no Catete. Da nossa casa, a única em que meus pais viveram juntos, só lembro das ruínas. Ela foi posta abaixo para dar lugar a um prédio cinza de dois blocos e onze andares. Em alguns anos, quando já estivermos todos mortos, a Vila Palácio do Catete não fará parte da memória de ninguém. Como tantas outras, ficará presa na fotografia.


Outro endereço simbólico da minha infância, um prédio de três andares sobre o Luna Bar, também foi demolido para dar espaço a um retângulo negro de vidro no Leblon. Nessa gangorra imobiliária, até hoje tive 13 diferentes endereços no Rio. Sou um privilegiado: ao contrário dos cariocas que encontraram na sua porta as marcas do Príncipe Regente em 1808 ou da Secretaria municipal de Habitação em 2012, nunca fui expulso de forma humilhante e minha propriedade nunca foi criminosamente confiscada pelo Estado.

Caminho pelo Catete e penso na palavra pentimento, que em italiano significa arrependimento, mas que tem outra acepção em artes plásticas. Em um quadro, o pentimento é formado por esboços e versões anteriores da obra, muitas vezes detectadas em exames de raio-x. É um registro da mudança de ideia do pintor, que resolve trocar um braço de posição, apagar um personagem, ou até mudar completamente a pintura.


O nosso pentimento, que infelizmente não surge das mãos de um artista, é esse conjunto de casas, prédios, bares e cinemas fantasmas que enxergo por toda a parte. Não estou só: o poeta Manuel Bandeira escreveu em 1942 sobre sua casa demolida no Beco do Rato: "Vão demolir esta casa./ Mas meu quarto vai ficar, / Não como forma imperfeita / Neste mundo de aparências: / Vai ficar na eternidade, / Com seus livros, com seus quadros, / Intacto, suspenso no ar!" 

A experiência dessa cidade, da fundação ao seu 448º aniversário, é baseada nesse desprendimento radical ao patrimônio e na nostalgia que ele nos causa. Aqui, o tempo é sempre hoje. No Rio, a história acaba e recomeça todos os dias — muitas vezes sobre o entulho de uma casa demolida.








ANEXO: Documentário de Francisco Daudt (editado por Tita Berredo) sobre as casas demolidas no Cosme Velho.

1.3.13

ANIVERSÁRIO DA CIDADE

No dia do aniversário da cidade, o Globo-Rio convidou 20 cariocas, da gema ou não, para falarem sobre seu amor pelo Rio. "Das curvas dos morros, do balanço do mar e do traçado do calçadão, a artista plástica Kakau Höfke retira a matéria-prima de um trabalho essencialmente carioca" como o logotipo acima. Para ler a matéria completa no Globo-Rio clique aqui.

13.2.13

CARNAVAL DE RUA RIO 2013




O carnaval carioca é a festa maior e mais democrática da face da terra: tem folia para todos os gostos e orçamentos, do requintado baile do Copacabana Palace na noite de sábado cujo ingresso mais barato custa R$ 1750 e os desfiles das escolas de samba dos grupos A e Especial aos blocos que desfilam (ou ficam concentrados, sem desfilar) por todos os cantos do Rio — você só gasta a condução e as eventuais latinhas de cerveja vendidas pelos ambulantes.



Gostei da iniciativa de desfilar no Aterro, parque belíssimo (com o paisagismo inconfundível do Burle Marx) e espaçoso. Lá estiveram o Bangalafumenga (bloco que teve como um dos fundadores o poeta Chacal) no domingo, o Sargento Pimenta (que canta Beatles com batida de maracatu e samba) na segunda e a Orquestra Voadora & Intrépida Trupe — orquestra só de metais e percussão — na ensolarada tarde de terça (esta eu assisti).



A Rio Branco no sábado é invadida pela horda do Bola Preta que abre os trabalhos carnavalescos cariocas e transforma aquela via normalmente sisuda em uma cloaca (dizem que são quase dois milhões, mas se você medir no Google Maps o comprimento e largura da avenida e fizer as contas vai ver que há um pouco de exagero nisto — ou não?), mas a partir do domingo vale a pena ver as turmas de fantasias e de bate-bolas (ou clóvis) que se concentram na área da Cinelândia (respectivamente na segunda e terça-feira à tarde), os blocos de embalo (entre eles o velho Cacique, patrimônio cultural carioca), blocos de enredo, afoxés, blocos afros, sem falar nos foliões fantasiadas que vemos nas fotos desta postagem, todas tiradas por lá.



O Carnaval carioca é democrático — literalmente: a partir deste ano a Prefeitura proibiu a delimitação e venda pelos blocos de áreas vip, alegando (com toda razão) que “cordões de isolamento vão contra o princípio livre e democrático típicos do carnaval carioca” (leia mais aqui).



Na Lapa pelo terceiro ano consecutivo a Fundição Progresso nos brindou com espetáculos gratuitos dos artistas, blocos e bandas que iniciaram sua vida artística naquele bairro: tivemos Casuarina no sábado, Orquestra Popular Céu na Terra e Orquestra Voadora no domingo, Moyseis Marques, Roberta Sá e Bangalafumenga na segunda e, encerrando com chave-de-ouro na terça, a Banda Fundição, Sargento Pimenta e Cordão do Boitatá (com canja do João Donato, vejam o alto nível da coisa). Um programaço nota mil. A Lapa lota, mas todos na maior paz.


Razão tem o produtor cultural Perfeito Fortuna ao pregar a utopia da pacificação universal via exportação do espírito carnavalesco brasileiro. Tudo a ver.









Fotos do editor do blog tiradas no Centro do Rio de Janeiro no domingo e segunda-feira do Carnaval de 2013. Outras fotos você encontra no álbum CARNAVAL DE RUA RIO 2013 do Picasa.

1.2.13

CAJU: NOSSO PRIMEIRO BALNEÁRIO

Desta janela de um velho casarão neoclássico de 1876 via-se outrora o mar.

O velho Caju já foi um balneário. Lá D. João VI tomava seus banhos medicinais. “Certa vez D. João teve uma das pernas picadas por um carrapato, quando dormia à sombra de copadas árvores. O insignificante ferimento, aparentemente sem importância, provocou-lhe depois uma incômoda inchação, e o remédio que lhe indicaram seus médicos foi banho periódico de água salgada. Estes, ele os tomava na praia da Ponta do Caju, numa quinta adquirida de José Gouveia Freire [foto abaixo], que mandou dotar de um cais e uma capela. E os tomava, por precaução, numa espécie de banheira perfurada, que os seus fâmulos metiam n'água e tiravam graças a um complicado mecanismo. Estava, assim lançada na cidade oitocentista a moda dos banhos de mar e convertido o Caju no primeiro dos nossos balneários, frequentado por todos os Bragança, desde o filho de D. Maria, a Louca, até Dom Pedro II.” (Brasil Gerson, História das ruas do Rio, p. 158) 



A Casa de Banho D. João VI (que você vê na foto acima tirada por Rejane Minato em 2007) foi objeto de uma postagem neste blog em 2010 que você pode ver aquiTrês praias banhavam o Caju




1) a de São Cristóvão, que começava no bairro do mesmo nome e avançava até o Cemitério S. Francisco Xavier (naquele tempo não existia uma Avenida Brasil separando os dois bairros)

2) a Praia do Caju, onde ficava a Ponta do Caju (o local da Casa de Banhos de D. João VI), e

3) a Praia do Retiro Saudoso, atrás dos cemitérios.

Da Praia de São Cristóvão não resta sequer o nome: corresponde à atual Rua Monsenhor Manuel Gomes. A Praia do Caju sobrevive ao menos como nome de rua, conforme você vê na placa da foto abaixo (à direita). 


"Praia do Caju"

Casinhas de madeira na antiga Praia do Caju.

Velhas casas na antiga Praia do Caju, a da direita um belo casarão neoclássico de 1876 com fachada de azulejos. Sem nenhuma proteção legal, corre o risco de ser um dia derrubado.

Da Praia do Retiro Saudoso os únicos remanescentes são a "pitoresca" colônia de pescadores no píer em frente à Praça do Mar  conhecida também como “Varal” devido às redes penduradas  e uma rua com menos de 300 metros, Rua do Retiro Saudoso, atrás do Cemitério de São Francisco Xavier.


Barco no píer em frente da Praça do Mar em foto de  2007  de Rejane Minato.

"Saco do Raposo, Retiro Saudoso", onde hoje fica a Praça do Mar, pintado por Gustavo Dall'Ara em 1911 (foto garimpada por Raul Félix na Internet).

Em suas recordações da Praça Onze, conta Samuel Malamud: “Nos meses de verão, quando o calor era demasiado, grande parte da população judaica da Praça Onze se dava ao luxo de tomar banho de mar, seguindo o exemplo de seus vizinhos não judeus. Nas madrugadas, principalmente aos sábados e domingos, famílias inteiras enchiam os bondes que levavam às margens da Baía da Guanabara, nas imediações da parte do porto denominada Ponta do Caju. [...] O movimento dos banhistas era grande e tinha-se a impressão de que se tratava de uma excursão coletiva de lazer. A algazarra era imensa. [...] Quando me lembro das águas na praia do Caju, gordurosas do óleo e sujas dos despejos dos navios cargueiros que por lá ficavam ancorados. [...] não consigo compreender como se entrava naquelas águas.” (Samuel Malamud, Recordando a Praça Onze, pág. 34) 


"Alugo pra pescaria".

O píer, os barcos e a comunidade Quinta do Caju atrás.

A garça sobre a rede de pesca e o estaleiro atrás.

Águas poluídas.

Em seu Balão Cativo, escreveu Pedro Nava: “"Do outro lado, junto ao preto poste cintado de branco, esperávamos o bonde Caju-Retiro, seguíamos por ruas coloridas, cheias de gradis prateados e beirais de louça: a de São Cristóvão, a Figueira de Melo, a Rua Bela, a Conde de Leopoldina, a praia... Nesse tempo, praia mesmo. Não tinham ainda empurrado o mar para tão longe e ainda não tinham mudado seu lindo nome para Rua Monsenhor Manuel Gomes. [...] O velho mar das velhas praias de São Cristóvão e Ponta do Caju, onde se banhavam Dom João e os nosso dois Pedros. Agora, cheio de saveiros de velas multicores." (Pedro Nava, Balão Cativo, pág. 40 na edição da José Olympio) 


Capela de São Pedro na Praça do Mar.

Praça do Mar. Observe o "balanço" improvisado com uma rede de pesca.

De bairro balneário “visceralmente ligado ao desenvolvimento do hábito do banho de mar em nossa cidade” como observa Raul Félix, o Caju tornou-se primeiro um bairro de cemitérios, depois um prolongamento da Zona Portuária e, com a abertura da Avenida Brasil, foi apartado do seu bairro irmão São Cristóvão — e a abertura posterior da Linha Vermelha e do acesso à Ponte Rio-Niterói acabou por ilhar, sitiar, isolar o Caju


Caju, bairro sitiado por elevados e vias expressas.

Além disso tudo o bairro foi degradado por um processo de favelização. Minha amiga Rejane, que é artista plástica e que já me havia conduzido por São Cristóvão, levou-me por lá. Eis o resultado. 


Praça principal do Caju.
Igreja Presbiteriana.

Casinhas na Rua Tavares Guerra. Fotos do editor do blog, exceto as duas da Rejane, marcadas.